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A controvérsia sobre a base de cálculo do imposto sobre a transmissão de bens imóveis ITBI no município de São Paulo

quinta-feira, 28 de março de 2019

Atualizado às 08:34


Texto de autoria de Maria Eugênia Chiampi Cortez

Introdução

O presente artigo tem por escopo explorar, em termos jurídicos e operacionais, a base de cálculo do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) no município de São Paulo. Para tanto, utiliza-se como referência as normas estabelecidas pela lei municipal 11.154/1991. Particularmente, o propósito deste trabalho é examinar o aspecto quantitativo deste imposto, a partir da lei e da jurisprudência, objetivando-se, assim, estabelecer como se define, no caso concreto, qual montante deve o contribuinte recolher aos cofres públicos, no caso paulistano, a título de pagamento do ITBI.

A justificativa deste trabalho se explica porque, em termos práticos, o quantum debeatur do ITBI, em razão da controvérsia sobre sua definição e quantificação, tem sido objeto de questionamento judicial, opondo contribuintes e Fazenda Municipal. Ademais, importante considerar o significativo impacto econômico deste imposto, pois são inúmeros os negócios jurídicos de transmissão da propriedade imobiliárias sobre os quais incide. A existência de conflitos sobre sua base de cálculo, por fim, demonstra a relevância da questão nos âmbitos prático e teórico.

O problema é bastante crítico especialmente na cidade de São Paulo, em virtude de alterações legislativas que modificaram a base de cálculo do imposto. Se anteriormente o ITBI incidia sobre o valor venal dos bens ou direitos transmitidos, com expressa referência ao valor venal do imóvel conforme estabelecido para fins de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial e Urbana (IPTU), hoje o imposto incide sobre o valor da transação imobiliária ou sobre o valor venal de referência, o que for maior, sendo o último apurado e fornecido pela Prefeitura de São Paulo, de acordo com a lei municipal 11.154/1991 e o decreto municipal 51.627/2010.

Nos termos da legislação em vigor, o contribuinte do imposto deve consultar o site da Secretaria da Fazenda do Munícipio a fim de obter o valor venal do bem imóvel objeto da transmissão. Se o valor apontado pelo Município for inferior ao valor na transação (por exemplo, no contrato de compra e venda, inferior ao preço efetivamente praticado pelas partes), este último será considerado para fins de base de cálculo; caso contrário, o imposto incidirá sobre o valor indicado pelo Município. Nessa lógica, há uma base de cálculo mínima sobre a qual incide o tributo, denominada de "valor venal de referência". Na criação do valor venal de referência, a intenção do legislador teria sido aprovar o valor de mercado dos imóveis de uma forma individualizada e, consequentemente, mais próximo da real capacidade contributiva do adquirente.

Esta nova sistemática de aferição do cálculo do imposto, todavia, gerou um número elevado de demandas judiciais, especialmente por encarecer operações imobiliárias. Os valores venais de referência são maiores quando em comparação aos valores venais estabelecidos para base de cálculo do IPTU. Como o mercado imobiliário é dinâmico e os preços nos imóveis são oscilantes, o valor da transação acaba sendo frequentemente inferior àquele estipulado como sendo valor de referência para fins de pagamento de ITBI. Assim, tornou-se comum, numa compra e venda, por exemplo, que o comprador tenha que recolher o ITBI sobre uma base de cálculo que não corresponde ao preço efetivamente pago no negócio jurídico, tornando a operação mais onerosa. Soma-se a esse cenário o fato da jurisprudência no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) não ser uniforme sobre a base de cálculo do ITBI, o que causa incerteza jurídica dos contribuintes e com repercussões negativas no mercado imobiliário. Tal circunstância foi constatada pelo próprio TJSP que instaurou Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) buscando estabilizar a jurisprudência e trazer maior segurança jurídica para essa questão.

Outros desdobramentos jurídicos dessa questão devem ser ressaltados. Verifica-se, por exemplo, a multiplicidade de demandas judiciais questionando os valores que são exigidos a título de pagamento de Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD), uma vez que a lei estadual 10.705/2000, norma que trata do ITCMD, adotou como uma de suas possíveis bases de cálculo o valor venal de referência previsto para o ITBI. Ainda, importante mencionar que a lei Federal 9.514/1997 (Lei da Alienação Fiduciária em Garantia), com as respectivas alterações dadas pela lei Federal 13.465/2017, estabeleceu que o valor venal de referência poderá ser atribuído ao imóvel alienado fiduciariamente em caso de leilão. Por fim, outra decorrência significativa se dá sobre as taxas e emolumentos extrajudiciais devidos pelos serviços notariais, no caso de São Paulo, que adotam como uma de suas possíveis bases de cálculo aquela utilizada para o recolhimento do ITBI.

O ITBI paulistano, ainda, apresenta outros aspectos controversos, como, por exemplo, o momento em que o imposto deve ser recolhido. Nada obstante, o presente trabalho tratará exclusivamente da questão atinente à base de cálculo do imposto, identificada como o tema de relevância entre todos aqueles aspectos controvertidos do tributo. Em termos estruturais, o artigo está divido em duas partes: na primeira, são analisados brevemente os elementos que compõem a obrigação de pagar o ITBI, com ênfase na sua base de cálculo; na segunda, é examinada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do TJSP com análise das decisões proferidas e suas consequências.

Confira a íntegra da coluna.

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Maria Eugênia Chiampi Cortez é advogada no José Roberto Cortez Advogados. Bacharel e mestre em Direito pela USP. Cursa especialização em Direito Imobiliário na FGVlaw.