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Sistema de eleição de presidentes de clubes de futebol

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Atualizado às 08:32

O futebol brasileiro produziu algumas figuras folclóricas e outras daninhas, que se ocuparam da administração das relações internas dos clubes e das atividades futebolísticas. Suas atuações, na maioria das vezes, se notabilizaram sobretudo pela relação de quase apropriação da coisa social e pela dominação política.

O processo de manutenção dessas posições decorria - e decorre - da politização do sistema eletivo, inerente às associações sem fins lucrativos, de cunho social. A candidatura e a eventual eleição de um associado, como regra, requer o estabelecimento de um complexo ambiente relacional, a fim de suportar composições de pessoas invariavelmente oriundas de distintas organizações políticas internas.

Atualmente se fala e se tenta introduzir, no ambiente do clube, conceitos e técnicas que se praticam no manejo e na governação de sociedades empresárias, de modo a, em alguns casos, oferecer-se um verniz de modernidade e, em outros, apesar das idiossincrasias próprias de cada organização, tentar-se impor uma nova lógica formadora do poder.

Passa-se a verificar, nesse sentido, os mecanismos adotados por certos clubes brasileiros, sobretudo em relação à forma de indicação de seus representantes máximos. Apontam-se, a seguir, os casos de: Santos Futebol Clube ("Santos"), Clube de Regatas do Flamengo ("Flamengo"), São Paulo Futebol Clube ("São Paulo"), Sociedade Esportiva Palmeiras ("Palmeiras"), Sport Club Corinthians Paulista ("Corinthians"), Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense ("Grêmio"), Sport Club Internacional ("Inter") e Clube Atlético Juventus ("Juventus").

1. Santos

O Santos distingue, dentre os seus órgãos sociais1, os (i) superiores, (ii) os independentes de fiscalização e apoio e (iii) os auxiliares à gestão. Os primeiros, que importam a este breve estudo, se compõem de (i.i) Assembleia Geral, (i.ii) Conselho Deliberativo e (i.iii) Comitê de Gestão.

A Assembleia Geral é o órgão máximo dos associados, que se reúnem, ordinariamente, a cada 3 anos, exclusivamente para eleger e empossar o presidente e o vice-presidente do Comitê de Gestão e os membros do Conselho Deliberativo.

O Comitê de Gestão é formado por 9 membros. Os 7 membros, não eleitos diretamente pela Assembleia Geral, são indicados pelo Presidente eleito do Comitê de Gestão, dentre os membros Eleitos, Efetivos e Natos do Conselho Deliberativo.

Ao Comitê de Gestão se atribui a competência de administração executiva e a representação do Clube. Ele delibera por maioria simples de votos, com a presença mínima de 5 membros, imputando-se ao seu presidente o voto de qualidade, em caso de empate.

O modelo do time da baixada abandona, portanto, o regime presidencialista e impõe um sistema colegiado de decisões.

2. Flamengo

O estatuto do Flamengo estabelece como Poderes Sociais a Assembleia Geral, o Conselho Deliberativo, o Conselho de Administração, o Conselho de Grandes-Beneméritos, o Conselho Fiscal e o Conselho Diretor. Os poderes do clube terão um presidente e um vice.

A competência para eleição do presidente e do vice do Conselho Diretor é da Assembleia Geral, que se reúne trienalmente.

Além de presidente e de vice-Presidente, o Conselho Diretor é composto por vice-presidentes temáticos, nomeados e empossados pelo Presidente do Conselho Diretor. O art. 131 do estatuto prevê a existência de 16 vice-presidências.

Compete ao presidente, ademais, de modo singular, a representação do Clube e a prática de diversos outros atos, previstos no art. 129 do estatuto.

O modelo do clube carioca se enquadra, portanto, num regime presidencialista, que atribui aos associados a escolha de seu representante.

3. São Paulo

O modelo do São Paulo é diferente dos apresentados anteriormente. Talvez se revele, aliás, dentre todos os analisados, o de menor acessibilidade aos seus associados. Essa assertiva se extrai do conteúdo do art. 35, que trata da Assembleia Geral.

A Assembleia Geral Ordinária realiza-se de 6 em 6 anos, para o fim específico de eleger e dar posse a 1/3 dos membros do Conselho Deliberativo. Não lhe compete, portanto, eleger membros do órgão diretivo.

O Estatuto reconhece, por outro lado, a soberania orgânica do Conselho Deliberativo. Este órgão, composto de 240 membros, elege e empossa 2/3 de seus membros, não escolhidos pela Assembleia Geral, que terão, todos, a posição vitalícia.

Também lhe compete, na forma do art. 50, eleger e dar posse ao presidente da Diretoria. O presidente da Diretoria indica os demais membros do órgão, que se compõe de 6 vice-presidências e 18 diretorias.

O modelo Tricolor também se revela presidencialista, mas, com uma diferença fundamental em relação ao adotado, por exemplo, pelo Flamengo: a eleição é indireta, tendo os associados pouca participação na escolha de conselheiros e nenhuma, de modo direto, na do Presidente e demais membros da Diretoria.

4. Palmeiras

O presidente do Palmeiras é eleito pela Assembleia Geral. Juntamente com o presidente elegem-se o 1o, 2o, 3o e 4o vice-presidentes.

O presidente é o dirigente máximo e o titular da função executiva, competindo-lhe, "a administração social com amplos poderes para dirigir a organização dos serviços [do Palmeiras], atendidas as disposições deste Estatuto".

Além do presidente e dos vices, o Palmeiras prevê a formação de uma administração social, composta de 26 departamentos, dirigidas por diretores, nomeados pelo presidente. Todos esses cargos - presidência, vices e diretores departamentais - compõem a Diretoria Executiva. Sua competência, prevista no art. 121 do estatuto, não abala a natureza presidencialista reconhecida pelo estatuto.

5. Corinthians

São poderes do Corinthians a Assembleia Geral, o Conselho Deliberativo, o Conselho de Orientação, o Conselho Fiscal e a Diretoria.

A Assembleia Geral se reúne ordinariamente a cada período de três anos, para eleger os membros do Conselho Deliberativo e da Diretoria. Os candidatos à Diretoria se organizam em chapas, que conterão, necessariamente, indicações para presidente, 1o e 2o vices.

Além desses integrantes, eleitos pela Assembleia Geral, a Diretoria é composta de outros Diretores Titulados e de um Secretário Geral, escolhidos livremente pelo Presidente. São, ao todo, de acordo com o art. 101 do estatuto, 13 membros, sendo 12 diretores.

Atribui-se, por fim, ao Presidente a responsabilidade pela administração geral do clube.

6. Grêmio

Os órgãos do Grêmio são a Assembleia Geral, o Conselho Deliberativo, o Conselho Fiscal, o Conselho Consultivo, o Conselho de Administração, a Presidência, as vice-presidências e a Gerência Executiva.

Compete à Assembleia Geral a eleição do presidente e dos vice-presidentes, para mandatos de 2 anos, permitida uma reeleição. Votam na Assembleia os associados maiores de 16 anos, pertencentes ao quadro social há mais de 2 anos.

A Gerência Executiva se subordina ao presidente e ao Conselho de Administração. Suas funções são: gerência de esportes, gerência administrativa e financeira, gerência comercial e marketing, gerência jurídica e gerência de planejamento.

Os cargos de gerente são remunerados.

7. Inter

São órgãos do clube a Assembleia Geral, o Conselho Deliberativo, a Diretoria e o Conselho Fiscal.

A Assembleia Geral se reúne ordinariamente, de 2 em 2 anos, para eleger o presidente, o Primeiro e o Segundo vice-presidentes.

Além dessas vice-presidências, a Diretoria é composta de outros 5 Vice-Presidentes, nomeados pelo Presidente, "ad referendum" do Conselho Deliberativo.

O presidente pode, ainda, criar outras 5 vice-presidências, desde que referidas no regimento interno da Diretoria.

8. Juventus

São Poderes do Juventus: a Assembleia Geral, o Conselho Deliberativo e a Diretoria Executiva. A Assembleia Geral tem competência para eleger e destituir os membros do Conselho Deliberativo e eleger e empossar o presidente e o vice-presidente da Diretoria Executiva.

O presidente elege, na forma do art. 88, os membros de sua confiança para formar a Diretoria Executiva, que se compõe de diretores e assessores.

O time da Rua Javari também privilegia o modelo presidencialista, com a atribuição de competência eletiva aos seus associados.

Pois bem.

A simples compilação desses dados não autoriza concluir ou apontar a prevalência de um modelo sobre o outro. O São Paulo, por exemplo, que até 2005 protagonizou, nos planos internos e externos, o futebol brasileiro, encontra-se, há pelo menos três anos, afundado em sua mais grave crise política desde a sua criação.

O Palmeiras, por outro lado, que desde 1994 não vence o campeonato brasileiro, desponta, em 2016, como grande favorito ao título.

Já o Flamengo, que vem adotando, desde o início da gestão de seu atual Presidente - Eduardo Carvalho Bandeira de Mello -, uma política mais austera, com o propósito de inverter e melhorar suas contas, parece que começará a colher os frutos de sua postura aparentemente responsável.

De todo modo, afirmar que a participação direta de associados na eleição de Presidente tem relação direta com o resultado em campo é algo que não se pode inferir, ao menos com base na breve compilação que se apresenta.

Mas uma afirmação se pode, sim, extrair: qualquer que seja o modelo, o futebol, seu time e seus jogadores sofrem com o intenso processo político, que, invariavelmente, reflete na sua gestão, e se ressentem de estabilidade, de projeção e de definição de um modelo de time.

Seja o colégio eleitoral formado por associados ou por membros de órgão colegiado, a instabilidade interna que envolve o futebol com temas associativos perturba e impede o seu desenvolvimento.

Talvez esteja, aí, um dos motivos da absoluta incapacidade de se competir num ambiente global, altamente competitivo. E, enquanto não se operar a devida separação e neutralização do futebol da política clubística, as vaidades pessoais continuarão a se sobrepor ao que realmente interessa: a afirmação social e econômica desse esporte que foi adotado como elemento da cultura de um povo.

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1 As referências a órgãos ou estatutos serão grafadas em letras maiúsculas ou minúsculas, conforme se grafem nos respectivos documentos de referência.