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Porandubas nº 482

quarta-feira, 9 de março de 2016

Atualizado às 08:11

Mais uma vez uma historinha de Minas Gerais abre a Coluna.

Jesus e Madalena

Tancredo Neves era promotor em São João Del Rey, em Minas.

Um homem chamado Jesus matou uma mulher chamada Madalena. Tancredo pediu 22 anos de cadeia para Jesus, o júri deu 18, Jesus foi para a cadeia, Tancredo esqueceu. O tempo passou. Nove anos depois, Tancredo advogado, vai a Andrelândia, pequena cidade próxima a São João Del Rey. De barba por fazer, entra em modesta barbearia de canto de rua, senta-se, está cansado, fecha os olhos, o barbeiro pega a navalha, afia, começa a tirar-lhe a barba, puxa conversa :

- O senhor é o Dr. Tancredo Neves, né ?

Tancredo abre os olhos, reconhece Jesus, o assassino de São João Del Rey. Espia pelo canto do olho, a barbearia vazia, a rua vazia, não chegava ninguém, não passava ninguém, o suor minava aflito na testa molhada e Jesus com a navalha enorme na mão pesada correndo garganta abaixo, sobe-desce, sobe-desce, abrindo caminhos na espuma.

Jesus ficou só espiando. Tancredo só teve voz para dizer :

- Sou, sim.

- Pois é, Dr. Tancredo, a vida.

- Pois é, Jesus, a vida.

- Cumpri nove anos dos 18, estou aqui, o senhor aí, o senhor com sua barba, eu com minha navalha. Só queria lhe dizer uma coisa, Dr. Tancredo.

Tancredo suava, Jesus corria a navalha pelo pescoço :

- Que coisa bonita é um júri, hein, Dr. Tancredo ? Que coisa mais bonita, que discursos bonitos que o senhor e o outro doutor fizeram !

Cenários de hoje e amanhã

Os cenários não são retratos estanques. Ganham dinâmica própria, a partir das circunstâncias de cada momento.

1º. Cenário : Delação e provas

Delcídio, com delação homologada, começa a abrir o bico. Ficar apenas nas afirmações, sem comprovação, será péssimo para ele. Tem de provar as declarações, na verdade, as denúncias. Outras testemunhas são convocadas para confirmar ou desmentir os fatos narrados. Confirmados, Lula, que teria pedido para calar Marcos Valério, ex-operador do mensalão, e Dilma, que sabia de tudo sobre a compra da Refinaria de Pasadena, são puxados para o olho do furacão.

2º. Cenário : Falta de provas

Delcídio fala, mas não prova. Por falta de comprovação, sua delação cai no poço do descrédito. Outras oitivas não confirmam o que ele disse. Delcídio complica sua situação na Lava Jato. Em vez de aliviar sua pena, a vê agravada. Lula e Dilma continuam sua passagem pelo mar vermelho (opa, das tormentas), suportando outras intempéries, mas escapando do furacão gerado pelo ex-líder do governo no Senado.

3º. Cenário : Cunha se afasta

STF determina afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara. Processo será demorado. Cunha, conhecedor do regimento e das manhas regimentais, tenta empurrar de barriga situação do mandato. Plenário acaba aprovando seu afastamento da presidência. Assume o vice Waldir Maranhão, do baixo clero. Comissão de Ética decide condenar Cunha pelo fato de ter mentido. Determina cassação do mandato. Mas a decisão se prolonga, enquanto processo de impeachment tem sequência.

4º. Cenário : Impeachment na Câmara

A confirmação do primeiro cenário joga um tanque de combustível na fogueira do impeachment. Faíscas correm pelos cantos e recantos, enchendo os pulmões da Opinião Pública. O Congresso Nacional, inflado pela deterioração da economia e pela péssima avaliação do governo, vai se afastando de Dilma, que vê sua base de apoio em refluxo. O processo de impeachment é aprovado na Câmara, caminhando para o Senado.

5º. Cenário : Senado aprova

O Senado mostrava, até pouco, boa maioria pró-Dilma. Nos últimos tempos, sob o impacto das bombas de alta precisão que atingiram Dilma e Lula (Delcídio e Operação Lava Jato levando Lula sob condução coercitiva), senadores da base governista também se afastam da presidente Dilma. O processo de impeachment da presidente é acolhido pelo Senado, obedecendo-se ao rito definido pelo STF. No afastamento da presidente Dilma, o Senado será presidido pelo presidente do STF, Ricardo Lewandovski, e o plenário tomará a decisão. Tende a aprová-lo. Pano de fundo : confirmações da delação de Delcídio.

6º. Cenário : Dilma ganha

Mesmo confirmadas as declarações de Delcídio, o Senado ainda pode mostrar maioria pró-Dilma. Nesse caso, o processo é rejeitado, desde sua admissibilidade (comissão inicial no Senado), arquivando-se o processo. Dilma continua a caminhar em seu calvário, inclusive tendo de se submeter a julgamento do STF. Resta descrever, agora, a paisagem de Lula.

7º. Cenário : Lula na berlinda

Processo de impeachment não é aprovado pelo Senado, mesmo confirmada a delação de Delcídio. Não tendo foro privilegiado, Lula é convocado para depoimentos, podendo entrar no regime de prisão temporária/preventiva. Aos fatos investigados, soma-se a bomba da delação premiada do ex-presidente do PP, ex-deputado Pedro Correa. A temperatura social se eleva.

8º. Cenário : Alas em conflito nas ruas

Sob o cenário acima, a militância petista é convocada para ir às ruas em defesa do seu ícone. Conflitos entre alas contra e a favor de Lula se multiplicam pelo país. A onda contrária se eleva metros acima da onda favorável a Lula. Que é preso. E o efeito de ver um ex-presidente da República preso ?

9º. Cenário : Lula condenado

Comprovados favorecimentos a Lula por empreiteiras (reformas no tríplex e no sítio de Atibaia), Lula é condenado. Sim. Nesse caso, uma condenação efetivada ante irrefutáveis provas. Os imóveis não estão em nome do ex-presidente. Mas as reformas indicaram suspeição de favorecimento. O cenário se agrava com a delação de Pedro Correa, ex-presidente do PP, preso em Curitiba. Ele mostrou que Lula sabia de tudo, desde as ações ilícitas ocorridas no mensalão, que ensejou a Ação Penal 470.

10º. Cenário : Economia piora

A economia não se recupera no segundo semestre, conforme promessa do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. A economia no fundo do poço aumenta o furor social. A indignação sobe às alturas. As movimentações são intensas. Críticas se expandem. Dilma ainda no governo reforça o clamor das ruas. O processo no TSE continua. Mas o final é longo.

11º. Cenário : Economia melhora

A economia dá sinais de recuperação, na esteira de análise de alguns economistas. Que consideram ter chegado ao fundo do poço, devendo, por conseguinte, começar uma escalada de melhoria, mesmo a passo de tartaruga. Sob esse desenho, a presidente Dilma, ainda no governo, passa a subir alguns centímetros na régua da imagem, podendo atravessar um final de ano menos angustiado.

12º. Cenário : Vice assume

Com Dilma impedida, o vice presidente Michel Temer assume o governo, tendo condições de resgatar a confiança dos setores produtivos, promover um grande diálogo na sociedade. A economia destroçada tem condições de se recuperar em ritmo mais acelerado. A palavra-chave desse momento é : confiança. Este é o motor de arranque dos setores produtivos e dos investidores internacionais.

13º. Cenário : PT em declínio

As ruas estão muito quentes, até porque este é um ano eleitoral. O PT vai perder espaços por todo o país. Alas internas tendem a acirrar suas divisões e mesmo Lula não consegue a unidade do partido. Hipótese de haver razoável enxugamento do corpo partidário. Muitos candidatos do PT nas grandes cidades serão execrados.

14º. Cenário : Junho, a fronteira

Se Dilma não for afastada até junho, são quase nulas as possibilidades de ser afastada no segundo semestre. Julho será um mês de férias e, a partir de agosto, começarão os atos da campanha eleitoral. Parlamentares - deputados, senadores, conjuntos técnicos - estarão atarefados com a campanha eleitoral que elegerá 5.568 prefeitos e quase 57 mil vereadores. Brasília será um deserto. Sem condições políticas para engajamento em um processo de impeachment.

15º. Cenário : TSE

TSE decide julgar os recursos do PSDB contra as contas da chapa Dilma/Michel. O processo será longo, com oitivas, recursos, devendo o caso subir ao STF. No Supremo, a situação corre para 2017. Se a chapa for cassada, realiza-se nova eleição. Persiste a possibilidade de separação das contas de Dilma das contas de Michel, eis que as Tesourarias e doações foram separadas. E há, ainda, a hipótese de o TSE não encontrar motivos para cassação da chapa. As mesmas empreiteiras que fizeram doação a Dilma o fizeram para Aécio Neves.

16º. Cenário : Preparo para 2018

Dilma continua e Lula não é preso. País caminha capengando até 2018. Moldura comportando desemprego, inflação crescente, programas sociais definhando, tende a ser um bloco fissurado. 2017 reagrupa as forças políticas com migrações partidárias e novos blocos de poder. Lula é candidato pelo PT, ressuscitando o carcomido discurso : nós e eles, peroração contra as elites, a imprensa e a Justiça. Por parte do PSDB, três nomes entram na disputa : Aécio Neves, Geraldo Alckmin e José Serra. Serra olha com atenção o PMDB.

17º. Cenário : Nada acontece

As investigações em curso sobre Lula, as pedaladas fiscais dadas pela presidente Dilma, as delações premiadas em curso não incriminam os indiciados. Ou seja, as coisas continuam sob muita fumaça, mas sem grande incêndio. Sob essa perspectiva, o país patina até 2018, sendo viável que os atuais protagonistas - Lula, Dilma, Aécio, Alckmin, Serra, e o candidato próprio do PMDB - entrem todos na paisagem eleitoral de 2018. Alckmin tem uma porta aberta no PSB, se Aécio segurar sua candidatura no PSDB.

Sérgio Moro

A partir da condução coercitiva de Lula, constata-se a formação de uma onda opiniática batendo nos costados do juiz Sérgio Moro. Onda originada em quadros da própria Justiça e alimentada pelo ódio da militância petista.

PMDB : Brasil em 1º lugar

O PMDB terá seu Congresso sábado, dia 12. Deverá aprovar proposta de candidatura própria à presidência em 2018. E aprovará um documento de orientação aos quadros do partido. Cada integrante do partido deverá colocar em primeiro plano a causa Brasil, acima dos interesses partidários ou interesses do governo. Com esta indicação, o PMDB sinaliza independência em relação ao governo. Nas votações, a causa Brasil será a inspiração maior.

Eleições

Pequenos conselhos aos pré-candidatos deste ano :

a. Cuidado com campanha negativa

Os candidatos terão de controlar muito a expressão. E a razão é muito conhecida : campanha negativa não ajuda candidatura. Quem se prestar ao esforço de passar uma campanha xingando, acusando, criando atritos, poderá ser visto como perfil negativo. É claro que os contendores devem reagir à altura diante de acusações pesadas. Mas o substantivo é melhor que o adjetivo em campanha eleitoral. Porque eleva as pessoas, conferindo-lhes uma taxa de liturgia e seriedade.

b. Cuidado, favoritos

1. É comum o candidato que exibe grande dianteira ante outros usar salto alto e, por consequência, fazer uma campanha modorrenta. Isso é um perigo.
2. Campanha só é ganha após a apuração. Por isso, os francos favoritos devem fazer campanha como se fossem os lanterninhas.
3. A arrogância, a empáfia, o excesso de confiança, a soberba puxam candidatos para o buraco. Cautela e caldo de galinha, senhores favoritos, não fazem mal a ninguém. E ajudam muito nas campanhas.