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Porandubas nº 533

quarta-feira, 7 de junho de 2017

Atualizado às 07:59

Abro a coluna com muita preocupação com o amanhã.

A propósito, uma historinha que cai bem.

Perspectivas e características

Quais as perspectivas que se apresentam ao Brasil em um contexto de crise? Sairemos da crise logo? As reformas passarão? Confesso que temos na frente um oceano e interrogações. Mas uma historinha do amigo Sebastião Nery sobre as perspectivas pode ajudar a responder:

Luís Pereira, pintor de parede, dormiu com 200 votos e acordou como deputado Federal. Era suplente de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, em Pernambuco, cassado pela ditadura. Disseram a ele: prepare umas palavras bonitas para dizer à imprensa. Escolheu alguns termos que gravou bem na cachola. Chegou a Brasília de roupa nova e coração vibrando de alegria. Murilo Melo Filho, colunista da Revista Manchete, logo no aeroporto, jogou a pergunta abrupta:

- Deputado, como vê a situação?

Nervoso, surpreso, sem saber o que dizer, tascou as duas que considerou as mais apropriadas para os jornalistas:

- As perspectivas são piores do que as características.

Pois é, a esta altura, tem muito Luís Pereira perorando por aí...

Clima geral

O clima é de muita expectativa. O Brasil parece assistir a um espetáculo com finais surpreendentes. Há uma imensa torcida pelo expurgo do presidente da República. Há uma grande parcela que torce para o presidente permanecer em seu assento no Palácio do Planalto. E há uma banda que joga um olho para o norte e o outro para o sul.

Formação de bandas

A primeira banda é composta particularmente pelas oposições, PT, PSOL e centrais sindicais à frente, e, incrível, por boa fatia da mídia. A segunda banda é composta pelos setores produtivos, razoáveis alas de profissionais liberais e parcela de formadores de opinião. O núcleo que divide o olhar é composto por políticos, muitos a favor do presidente, uma parte já desatrelada da base governista e um terceiro grupo em compasso de espera. Analisemos cada uma.

Oposições

O PT e outros partidos de oposição querem ver Michel Temer fora do Planalto. Mas carregam imensa preocupação. Seu líder maior, Lula da Silva, complica-se, a cada dia, com denúncias contra ele avolumadas, o que o torna muito próximo da República de Curitiba. A recém-eleita presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, também está implicada na operação Lava Jato. O afundamento do PT não o qualifica como protagonista da ética e da moral. Os grupos sindicais, por sua vez, se posicionam contra o governo por distinguir nele o rolo compressor das reformas. E, como se sabe, o que as centrais querem mesmo é defender as contribuições compulsórias que abarrotam seus cofres.

Mídia

As oposições contam com o escancarado apoio de parcela importante da mídia, caracterizada por coberturas enviesadas dos veículos do Grupo Globo: TVs, jornal e seus canais eletrônicos nas redes. Aliás, o viés que se percebe na cobertura da crise por parte dos profissionais - repórteres e analistas da Rede Globo - é o mais forte e intenso que se viu na contemporaneidade, ultrapassando, até, a afamada cobertura enviesada do debate Collor X Lula em 1989.

Globo I - viés

Recordando os dias de ontem. O ex-chefão da Globo, Boni, chegou a admitir: "Colocamos as pastas todas ali com supostas denúncias contra Lula, mas estavam vazias". Pois bem, a cobertura diária da crise toma longos minutos da TV Globo, com repetições do áudio da conversa que Joesley Batista gravou com o presidente Temer. Os comentaristas da Globo News, principalmente no Jornal das 10, emendam o que disseram na noite anterior. O lengalenga não contém fatos novos. É visível o esforço de um ou outro para buscar um ângulo novo, algo que traduza nova situação. O repeteco tornou-se um caso de linguagem tatibitate. Por que a Globo enviesa o noticiário?

Globo II - aposta na saída

Lauro Jardim foi quem deu o furo, quando vazou parte do conteúdo da gravação. No dia seguinte, percebeu-se que o jacaré havia se transformado em lagartixa: a ajuda financeira ao ex-deputado Eduardo Cunha para se manter calado não foi a grande nota como o Globo anunciava. Nesse trecho, o gravador de Joesley dizia: "Eu tô de bem com o Eduardo". Ao que o presidente retrucou: "tem que manter isso, viu?". Ora, para manter a ideia inicial, o sistema Globo teria optado por manter a denúncia que assumiu, "comprando" as denúncias feitas pelo PGR. É o que explica o viés continuado do noticiário. O jornal O Globo chegou, até, a produzir um editorial, pregando a saída do presidente, antecipando-se à decisão da Justiça. Aliás, a Folha de S.Paulo também fez um editorial na mesma direção.

Globo III - furo, acomodação, repetição

O furo continua a ser o alvo da mídia. A notícia dada em primeira mão tem um tremendo impacto. Pois bem, pelo tom global, os últimos 15 dias foram dados como fatais. O presidente não resistiria um minuto a mais. Se continua resistindo e, assim, contrariando o noticiário, o tom do dia seguinte se torna ainda mais agudo. Nas entrelinhas ou entreouvidos, as palavras até poderiam ser essas: "não é possível que esteja resistindo; vou dar mais uma porrada, vamos ver se ele resiste a essa". Por outro lado, é visível a acomodação, a ausência de apuração de dados, o que transforma o oba-oba dos comentaristas em algo insosso, inodoro e incolor. Discurso da mesmice.

A fúria

Comentaristas de outras emissoras também peroram com muita fúria. Cometem a síndrome do touro: pensam com o coração e arremetem com a cabeça, quando deveriam fazer o contrário. Afinal, a cachola serve ao ser pensante. Onde está a racionalidade, a lógica? Interessante é observar que ninguém quer dar a mão à palmatória. Há semanas, a grande maioria dos analistas dava como certa a derrota de Michel Temer no TSE. Agora que começa o julgamento naquela Corte, os mesmos que tinham tirado a fatura da derrota reconhecem (sem pejo) que o presidente poderá obter vitória naquela Corte.

Achismo

O fato é que a maior parte dos analistas políticos trabalha à base do "achismo", mescla de vaidades, donos da verdade, excesso de confiança em seus sentimentos. Onde estão os grandes intérpretes da política e dos costumes? Foram embora. Não há mais figuras do porte de um Carlos Castelo Branco ou de um Vilas Boas Correa. O que vemos é um desfile de trôpegos da análise, caolhos da verdade, gagos de densidade expressiva.

Loteria

Mais parece que analistas e comentaristas (observo que ainda há também sérios e honestos) apostaram na loteria da queda de Michel Temer e querem ganhar de qualquer maneira. Há muita curiosidade para vermos como se comportarão alguns "mestres" da análise política caso o presidente suba a montanha e chegue ao final do governo. O que dirão? Atribuirão o fato à ineficiência do Judiciário? Podemos, por outro lado, adivinhar o que fatalmente dirão se o presidente cair: "bem que eu disse, bem que nós antecipamos, vejam só quanto estávamos certos".

Setores produtivos

Já os setores produtivos estão alinhados ao governo na defesa das reformas, a partir das já realizadas - teto do gasto, na área da educação, na lei da terceirização - e as reformas trabalhista e previdenciária em curso. A marca do governo Temer é o reformismo. Evidentemente, os sinais de mudanças na estrutura do Estado entusiasmam empreendedores e investidores, que vêem o Brasil sair da maior recessão econômica de todos os tempos e abrir novos horizontes, com queda de juros e rígido controle inflacionário. Profissionais liberais, que têm pensamento de vanguarda, identificam-se com tais posições, enxergando no PT e em seus governantes os culpados pelo buraco do qual procura sair o país.

Os políticos

Quanto aos políticos, o que precisamos observar é o pragmatismo que os inspira. O fato de usarem os dois olhos para enxergar para onde irá a balança quer dizer que pensam, sobretudo, em sua salvação. Apostam no futuro. Se perceberem que a tendência será a de continuidade na gestão, penderão para o lado do governo. A recíproca é verdadeira. E mais: se atentarem para o fato de que Lula, mesmo encarnando o papel de demônio, terá condições de ser candidato em 2018, abrirão para ele os braços. Claro, há grupos que manterão distância do petismo.

Vídeo por demanda

Um estudo feito pela Nielsen em 60 países mostra que quase 2/3 dos entrevistados assistem a alguma forma de programação de vídeo on demand (VOD), esse sistema que permite ao usuário selecionar filmes e seriados de forma interativa, uma espécie de locadora virtual. Esse hábito de consumo se expande no mundo. 43% das pessoas entrevistadas dizem fazer isso pelo menos uma vez por dia, enquanto na AL, 24% dos assinantes de TV paga afirmam que planejam cancelar seu serviço a favor de um provedor somente online. Mas poucos realmente cancelam seu serviço. As TVs por assinatura ainda têm seu espaço econômico e função social.

Brasil analisa

Agora, vejamos as implicações por nossas plagas. Lembremos que a AT&T firmou acordo para adquirir a Time Warner por US$ 85,4 bilhões. O que explica isso? Mudanças que ocorrem na produção e distribuição de conteúdo em todo o mundo. No Brasil, esse processo de fusão está em análise no Brasil pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e também nos Estados Unidos. Já foi aprovado em todos os outros mercados internacionais em que as empresas atuam.

Ancine é contra

A Agência Nacional do Cinema (Ancine) se posicionou contra o negócio, enquanto a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) espera decisão do Cade sobre a fusão AT&T/TW para analisar questões regulatórias. Se o Cade impedir a fusão, a AT&T precisará tomar a decisão de Sofia: vender a Sky ou abrir mão da operação dos canais do Grupo Time Warner no Brasil. O que será pernicioso para o consumidor, pois isso significa retirá-lo da grade de todas as operadoras de TV por assinatura. A saída para os fãs de HBO, Cartoon Network e CNN, entre outros canais, será recorrer ao conteúdo online.

Migração para internet

A consequência se dará na migração rápida de assinantes de TV paga para a internet, uma vez que os espectadores continuarão consumindo seus conteúdos preferidos, legal ou ilegalmente. O mercado de TV por assinatura corre risco.