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Direitos autorais

Grupo Tradição altera letra de música e é condenado por danos morais

No lugar de interpretar e cantar trecho "No meu último repouso na cidade de Coxim", o grupo cantou "No meu último repouso na cidade de Campo Grande".

Da Redação

quarta-feira, 21 de março de 2012

Atualizado às 08:22

Direitos autorais

Grupo Tradição altera letra de música e é condenado por danos morais

Por decisão unânime, a 5ª câmara Cível do TJ/MS negou provimento à apelação interposta pelo grupo Tradição, que recorre da sentença que o condenou ao pagamento de R$ 30.000,00 por danos morais.

Entre os anos de 2004 e 2005, durante a gravação de um CD e DVD em Campo Grande/MS, o grupo Tradição interpretou a música "Pé de Cedro" de forma parafraseada. No lugar de cantar o trecho "No meu último repouso na cidade de Coxim", o grupo, para ser simpático à plateia, trocou Coxim por Campo Grande.

A alteração da letra de música causou indignação à população de Coxim/MS. Essa indignação foi levada até ao MP, onde a empresa reconheceu a falha e subscreveu um TAC, acordando que o Grupo Tradição faria uma apresentação musical ao público de Coxim, para pedir desculpas e reafirmar que a música "Pé de Cedro" é e sempre será de Coxim.

Ocorre que os sucessores do músico que compôs a canção não participaram e nem anuíram nesse TAC, ingressando com ação de indenização por danos morais.

Em seu voto, o relator do processo, desembargador Luiz Tadeu Barbosa Silva, afirmou que os sucessores continuam titulares dos direitos sobre a obra e entendeu que "a criação musical não pode ser alterada sem a autorização do compositor ou de seus sucessores".

O relator manteve o valor do dano moral fixado em R$ 30 mil, argumentando a possibilidade econômico-financeira do grupo.

  • Processo: 2012.003545-7

Veja abaixo a íntegra da decisão.

_______

Quinta Câmara Cível
Apelação Cível - Ordinário - N. 2012.003545-7/0000-00 - Coxim.
Relator - Exmo. Sr. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva.
Apelante - Tradição Representações Artísticas Ltda. Advogado -

Juscelino Henrique de Camargo Weingärtner. Apelados - Hilger Coutinho da Silva e outro. Advogado - Edilson Magro.

E M E N T A - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - PRELIMINAR - OITIVA DA AUTORA - ATO NÃO EFETIVADO POR AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DA DILIGÊNCIA DO INTERESSADO - NULIDADE AFASTADA - MÉRITO - ALTERAÇÃO DE LETRA DE MÚSICA SEM A AUTORIZAÇÃO DOS SUCESSORES DO COMPOSITOR - DANO MORAL CARACTERIZADO - VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL - AÇÃO DE CONHECIMENTO DE NATUREZA CONDENATÓRIA - HONORÁRIOS FIXADOS NO PERCENTUAL MÍNIMO - RECURSO IMPROVIDO.

Não cabe a alegação de nulidade pela ausência de oitiva de um dos integrantes do polo ativo quando a ré, conquanto tenha requerido o ato, deixa de recolher a diligência respectiva.

A criação musical não pode ser alterada sem a autorização do compositor ou de seus sucessores. A alteração destituída de autorização induz dano moral em favor do compositor, detentor da imutabilidade de sua obra (Lei 9.610/98).

Há de se manter o valor da indenização a título de dano moral, quando fixado com parcimônia e ponderação, atento inclusive à capacidade financeira da empresa ofensora.

Preservam-se os honorários quando fixados no percentual mínimo previsto no § 3º do art. 20 do CPC.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.

Campo Grande, 15 de março de 2012.

Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva - Relator

RELATÓRIO

O Sr. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva

Inconformada com a sentença que o condenou ao pagamento de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) a título de danos morais em prol de Hilger Coutinho da Silva e Ilda Alves da Silva, Tradição Representações Artísticas Ltda interpõe recurso de apelação visando anular o decisum ... ou em assim não entendendo, reformar ... a fim de minorar a condenação e em consequência os honorários.

A nulidade, segundo a apelante, reside na falta de oitiva ... de depoimento da autora (f. 272), enquanto a reforma reside na troca da letra da melodia "Pé de Cedro" de Coxim para Campo Grande deu-se sem premeditação ou deliberação alguma ... mas sim, no calor do show em cidade diferente da que consta na música, e com gravação de CD e DVD ao vivo, ... a fim de agitar e levantar a platéia, já que estavam gravando na capital do Estado, e que o procedimento não visava constranger quem quer que seja (f. 271).

Salientou que a gravadora responsável pela comercialização dos produtos obteve autorização da editora Irmãos Vitale para a gravação da música e que os direitos autorais foram repassados aos autores ou responsáveis pela mesma (f. 271).

Pondera ter cumprido o Termo de Ajuste de Conduta ajustado com o Ministério Público e ter o empresário do Grupo Tradição, tanto quanto o próprio Grupo, se reportado à cidade de Coxim, com pedido de desculpas e reafirmando que a música "Pé de Cedro" é e sempre será de Coxim (f. 271).

Pugna pela atribuição das despesas do processo e dos honorários aos apelados, ou a minoração tanto quantum indene e dos honorários.

Contrarrazões às f. 288-294.

VOTO

O Sr. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva (Relator)

A ação de indenização por danos morais e materiais foi proposta por Hilger Coutinho da Silva e Ilda Alves da Silva, sucessores de Goiá, músico e um dos compositores da música Pé de Cedro, com a indicação de violação de direitos autorais, praticada pelo Grupo Tradição (rectius: Tradição Representações Artísticas Ltda.) entre os anos de 2.004 e 2.005, ao gravar CD e DVD ... alterando a música do Pé de Cedro, ... no trecho onde diz "no seu último repouso na cidade de Coxim", foi dito, "no seu último repouso na cidade de Campo Grande", manchando toda uma história da música, motivando ... chacotas de algumas pessoas e indignação por parte de outras, inclusive, quem conhece a história da aludida melodia, causou revolta por macular uma página tão linda da música brasileira (f. 03-04).

A empresa recorrente reconheceu o fato, enfatizando, no entanto, que ocorrera no calor da gravação do CD e DVD, mas que tão logo souberam do desconforto, pediram desculpas a população Coxinense, bem como em toda tiragem dos CD's e DVD's a menção correta da música "Pé de Cedro", e além de promover um show em praça pública, organizado pela Prefeitura Municipal de Coxim/MS, inexistindo danos de qualquer ordem, mesmo porque não foram estes provados.

Após a oitiva das testemunhas, a sentença foi proferida, com o afastamento do pleito indenizatório material, por ausência de prova em relação a este, e acolhimento do extrapatrimonial, fixando-o em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), sob o fundamento de que:

"O requerido, neste tocante, em momento algum desmentiu a afirmativa autoral de que a letra da composição foi alterada, bastando-se em afirmar que inexistiu prova dos danos morais suportados pela conduta de divulgar a música com a modificação.

Ocorre que, segundo o disposto no artigo 24 da Lei 9.610/98, é direito moral do autor assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra.

Diz a mesma lei, em seu artigo 47, que são livres as paráfrases e paródias. Parafrasear significa traduzir em palavras próprias pensamento original de outro autor. É maneira diferente de dizer algo que já foi dito. É usar um texto como tema para trabalho de maior amplitude. Paródia traz em si a idéia de humor, sátira.

O fato é que, mesmo no caso de paráfrases e paródias, é necessária prévia autorização do autor da obra original, interpretação baseada no art. 29, III, da lei 9.610/98, que tem a seguinte redação, verbis:

'Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:

I - omissis;

II - omissis;

III - a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações;

(...)'.

Assim, qualquer alteração na composição musical, inclusive nos casos de previstos no art. 47, indispensável é a autorização expressa do autor para transformação de sua obra, sob pena de, não requerida, ser devida indenização.

Outros doutrinadores, porém, afirmam que as paráfrases e paródias dispensam a prévia permissão do autor, tomando a expressão "livres" do art. 47 da LDA de forma ampla.

Ainda que se adotasse o segundo posicionamento, verifica-se que na hipótese dos autos a letra original da canção foi alterada de modo a lançar um CD e DVD, de modo a aumentar o potencial de atração dos consumidores pela modificação significativa da letra original, não havendo falar em paráfrase, pois a canção original não foi usada como mote para desenvolvimento de outro pensamento, ou mesmo em paródia, isto é, em imitação cômica, ou em tratamento antitético do tema. Foi deturpada para melhor atender aos interesses comerciais do promovido na vendagem de seu produto.

Cumpre assinalar, porém, que os autores detém direitos de natureza pessoal e patrimonial. Os primeiros são direitos personalíssimos, por isso inalienáveis e irrenunciáveis (art. 27 da LDA), além de imprescritíveis, estando previstos no art. 24 da Lei 9.610#98. Os segundos, regulados pelo art. 28 da Lei de Direitos Autorais, são passíveis de alienação.

No caso dos autos, os autores, os compositores da canção modificada, cederam seus direitos patrimoniais sobre a mesma (fl.17). Porém, os sucessores continuam titulares dos direitos pessoais sobre a obra, nos termos do parágrafo primeiro do art. 24.

Como visto, dispõe o art. 24, IV da Lei 9.610#98, que é direito moral do autor o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra.

Nessa toada, confessando o requerido que nenhuma autorização detinha do titular da obra, a defesa do direito autoral consiste na garantia de não ver a utilização desautorizada, com alteração de conteúdo, da obra artística, o que, por si só, gera dever indenizatório, pois sem esse instrumento, o próprio direito ficaria a descoberto, desqualificando a proteção constitucional da matéria.

As testemunhas ouvidas afirmaram o constrangimento dos autores em se surpreenderem com a antiga obra alterada.

De fato, se a canção foi alterada de forma desautorizada, sendo utilizada e divulgada de forma diversa da concebida pelo antecessor dos autores, detém o direito à reparação por danos morais, pois violado o direito à intangibilidade da obra.

Cito, a propósito, julgado que, conquanto proferido sob a égide da lei anterior, se mantém atualizado quanto ao tema:

'DIREITOS AUTORAIS. LEI 5988#73, ARTS. 25, 80 E 126. EXPOSIÇÃO E ALTERAÇÕES NÃO AUTORIZADAS. REPARAÇÃO DOS DANOS PATRIMONIAL E MORAL. RECURSO NÃO CONHECIDO. EMBORA NÃO SE POSSA NEGAR AO ADQUIRENTE DE UMA OBRA DE ARTE, ESPECIALMENTE EM SE TRATANDO DE GALERIA DE ARTE, O DIREITO DE EXPO-LA, NÃO SE PODE DEIXAR SEM PROTEÇÃO OUTROS DIREITOS DECORRENTES DA PRODUÇÃO ARTÍSTICA OU INTELECTUAL, TAIS COMO O DA TITULARIDADE DA AUTORIA E O DA INTANGIBILIDADE DA OBRA. A TELEOLOGIA DA LEI 5988#73, AO GARANTIR A INTEGRIDADE DA OBRA ARTÍSTICA OU INTELECTUAL, VEDA A UTILIZAÇÃO DESTA EM DETRIMENTO DO RESPEITO AO SEU AUTOR, ENSEJANDO REPARAÇÃO DO DANO CAUSADO.' (Resp 7.550/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, DJ 02/12/1991).

Dessa forma, caracterizado o dever de indenizar, cabe a fixação do valor, que no caso em exame, deve levar em conta mais o caráter protetivo do que o reparatório, servindo o valor como desestímulo de práticas semelhantes.

É sabido que a fixação do valor indenizatório em casos de danos morais é uma tarefa árdua para o magistrado, eis que inexistem parâmetros materiais.

Para tanto, exige-se prudente arbítrio do juiz, que deve levar em consideração a gravidade da ofensa e as circunstâncias fáticas, o comportamento e a realidade econômica do ofensor, estipulando um valor suficiente para reparar o mal sofrido, cuidando para não propiciar enriquecimento sem causa, mas, por outro lado, devendo ser capaz de dissuadir à prática de novas ofensas, tendo, assim, um caráter pedagógico.

Assim sendo, tenho por bem fixar o valor da indenização por danos morais em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), valor condizente com o caráter compensatório e pedagógico que deve ser atribuído a essa espécie de indenização.

Diante do exposto, e por tudo o mais que dos autos consta,julgo parcialmente procedente o pedido inicial formulado por Hilger Coutinho da Silva e Ilda Alves da Silva em face de Tradição Representações Artísticas Ltda., para condenar a requerida no pagamento de indenização por danos morais aos requerentes, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), valor este que deve ser acrescido de correção monetária pelo IGP-M e juros de 1% ao mês, a contar da prolação desta.

Pelos motivos já delineados julgo improcedente o pedido de indenização por danos materiais.

Outrossim, condeno a requerida no pagamento de custas e honorários advocatícios estes que fixo em 15% (quinze) por cento do valor da condenação, o que faço com fulcro no art. 20, §3°, do Código de Processo Civil, notadamente em razão da realização de audiência de instrução e julgamento, e também pelo elevado tempo de tramitação deste processo.(f. 259vº-261vº)."

A ré manifesta seu inconformismo com o decisum, aduzindo nulidade da sentença, pelo fato de não ter sido ouvida a autora Ilda Alves da Silva, ou a reforma para decotar o valor indenizatório e os honorários.

1. Preliminar

1.1. Nulidade da sentença

Como fiz constar do relatório, a nulidade apontada está atrelada à falta de oitiva da integrante do polo ativo Ilda Alves da Silva.

Extrai-se da contestação que a apelante requereu dilação probatória por todos os meios de provas em direito admitidas, em especial, a produção de prova testemunhal e depoimento do Réu (f. 98).

Na fase de saneamento determinou o magistrado a manifestação das partes para a indicação e justificativa das provas que pretendiam produzir (f. 138), designando audiência preliminar.

Os autores apresentaram rol das testemunhas (f. 146). A ré, no entanto, quedou-se inerte e, na audiência, fez alusão ao pleito formulado na contestação, de oitiva da ré em evidente erro material, sendo certo que o pleito o era de oitiva dos autores, levando o juiz à redesignação da audiência de instrução e intimação dos autores para prestarem depoimento (f. 153), deprecando-se o ato.

O autor Hilger Coutinho da Silva foi ouvido (f. 172) e carta precatória foi remetida para o Estado de São Paulo visando a oitiva da autora Ilda (f. 234), cuja diligência não foi realizada em razão da apelante não ter feito o recolhimento da diligência (f. 237).

Sendo assim, não se há falar em nulidade da sentença, posto que o ato não foi realizado em razão da negligência da apelante.

A oitiva do ex adverso é interesse da parte. Assim, não concretizando a ré os meios para a efetivação do ato processual, inconcebível admitir a nulidade.

De lado outro, o magistrado tem liberdade para formar sua convicção. Não está ele adstrito a eventuais confissões quando o depoimento pessoal é colhido. E assim procedeu no caso em apreço, tanto que formou sua convicção de acordo com as provas constantes dos autos, o que afasta qualquer hipótese de nulidade, mesmo porque, a oitiva da parte é simplesmente meio de expor oralmente os fatos alegados na inicial.

Rejeita-se, portanto, a preliminar.

2. Mérito

2.1 Dano moral

Segundo a apelante, a alteração da letra da música de autoria do pai e esposo dos autores não tem o condão de gerar dano anímico, em razão da inexistência de liame e culpa e ato ilegal.

Entendo que não assiste razão a apelante.

Com efeito, a Lei 9.610/98, ao cuidar das obras protegidas, estabelece no inciso V do art. 7º que:

"Art. 7º. São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: (...).

V - as composições musicais, tenham ou não letra;"

Já no art. 22, disciplina que "Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou".

No art. 24, inciso IV, está previsto:

"Art. 24. São direitos morais do autor: (...)

IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;"

Mais adiante, no inciso III, do art. 29, está previsto que:

"Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como: (...)

III - a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações;"

No caso em apreço, conquanto tenha a apelante obtido autorização para reproduzir a música, não a obteve para alterar ou para modificar a letra de autoria do pai e esposo dos apelados.

Ora, tendo a apelante reproduzido a composição musical com modificações, sem a autorização dos sucessores do autor, evidente a ocorrência de dano moral aos demandantes.

Já dizia Savatier, citado por Caio Mario da Silva Pereira, que dano moral "é qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária, e abrange todo atentado à reputação da vítima, à sua autoridade legitima, ao seu pudor, à sua segurança e tranqüilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de sua inteligência, a suas afeições, etc".

Yussef Said Cahali , por seu turno, diz que o dano moral deve ser caracterizado por elementos seus, "como a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos."

Salvo Venosa vê o dano moral como o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima, "abrangendo também os direitos da personalidade, direito à imagem, ao nome, à privacidade etc."

Por último, trago o conceito de Maria Helena Diniz , que define o dano moral como a "lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (...) ou nos atributos da pessoa."

No caso dos autos os músicos da apelante alteraram a composição da música Pé de cedro, retirando de sua letra o trecho "no seu último repouso na cidade de Coxim", colocando na canção a oração: "no seu último repouso na cidade de Campo Grande", provocando, segundo a prova produzida, verdadeira comoção na cidade de Coxim, com a intervenção inclusive do Ministério Público, em termo de ajustamento de conduta (TAC), que levou a apelante a uma apresentação na aconchegante e acolhedora Coxim.

O dano moral é uma lesão ao direito da personalidade da pessoa. Atinge a liberdade, igualdade, solidariedade ou psicofísica. Só existe dano moral quando a dignidade é atingida, na forma do art. 5º, V e X, CF.

É o caso em apreço. Ao modificar a criação do artista sem autorização, a apelante lhe causou dano anímico. Esta circunstância, é, inclusive, prevista na Lei 9.610/98, que regula o direito autoral.

Sabe-se que esta modalidade de dano não carece de prova, pois é ele afeto ao direito da personalidade ou atributo da pessoa. Neste sentido, a jurisprudência é assente, como pode ser visto dos seguintes precedentes:

"...Concernente à ausência de consentimento, esta ficou demonstrada através de prova documental acostada à inicial, a qual não fora descontituída pelo requerido, ônus que lhe competia, segundo previsão do art. 333 do CPC. 2. Na hipótese é possível visualizar a ocorrência de violação à chamada imagem-retrato, que consiste na simples exibição, sem autorização, de imagem, situação que se encontra vedada pelo ordenamento jurídico. 3. Com exceção das teorias que procuram de algum modo vincular o direito à imagem a algum outro direito de natureza personalíssimo, como à intimidade, à honra, à privacidade, etc., tanto a doutrina quanto a jurisprudência seguem no sentido de atribuir-lhe caráter de direito autônomo, incidente sobre um objeto específico, cuja disponibilidade é inteira do seu titular e cuja violação se concretiza com o simples uso não consentido ou autorizado. 4. Entende-se suficiente a demonstração do ato ilícito e do nexo de causalidade, pois o dano moral deflui como conseqüência natural do ilícito." (TJMS, Apelação Cível N. 2012.003989-5, Rel. Des. Sideni Soncini Pimentel, j. 1º.3.2012, Quinta Câmara Cível).

(...) II) O dano moral não precisa ser comprovado, porque, em regra, considera-se in re ipsa em razão do ilícito praticado e que atinge a esfera dos direitos de personalidade do autor.... (TJMS, Apelação Cível N. 2012.001614-1, Rel. Des. Dorival Renato Pavan, j. 28.2.2012, Quarta Câmara Cível).

2.2. Quantum

A apelante busca reduzir o valor indenizatório fixado no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em razão de haver cumprido todas as cláusulas do termo de ajuste (f. 272) firmado com o Ministério Público.

Trata-se, no entanto, de reparações distintas. No termo de ajuste de conduta (TAC), a reparação vem de encontro ao dano à identidade e imagem da população coxinense (f. 124), enquanto o que se repara nesta ação é o direito à reparação extrapatrimonial causada ao artista, de ordem personalíssima, com a alteração da criação sem a devida autorização.

O valor arbitrado, R$ 30.000,00 (trinta mil reais), está compatível com a condição econômico-financeira da apelante, uma empresa que ganhou a respeitabilidade não só em nosso Estado, mas em todo o Brasil.

Não há dúvida que quantificar esta modalidade de dano é tarefa árdua ao magistrado. Todavia, tenho que o arbitrado na sentença guarda correspondência com o gravame sofrido (art. 944, CC), além de sopesar as circunstâncias do fato, a capacidade econômica das partes, a extensão e gravidade do dano, bem como o caráter punitivo-pedagógico da medida, tudo com esteio nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

2.3. Honorários

Os honorários foram fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.

Esse percentual está compatível com a regra estabelecida no § 3º do artigo 20 do CPC.

Conclusão

Isto posto, conheço do recurso, mas nego-lhe provimento.

DECISÃO

Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

POR UNANIMIDADE, REJEITARAM A PRELIMINAR E, NO MÉRITO, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Presidência do Exmo. Sr. Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso.

Relator, o Exmo. Sr. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva.

Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Luiz Tadeu Barbosa Silva, Júlio Roberto Siqueira Cardoso e Sideni Soncini Pimentel.

Campo Grande, 15 de março de 2012.

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