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Justiça do Trabalho

Revista de pertences de forma impessoal não constitui ato ilícito

Decisão do TST isenta Kraft Foods de indenizar por dano moral.

Da Redação

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Atualizado às 09:03

A 7ª turma do TST deu provimento a recurso da Kraft Foods Brasil S.A., condenada nas instâncias inferiores a indenizar empregada pela revista feita em seus pertences. A turma entendeu que a inspeção era realizada de forma impessoal, sem contato físico, e não causou danos.

O relator, ministro Pedro Paulo Manus, explicou que "a revista pessoal de pertences dos empregados, feita de forma impessoal e indiscriminada, é inerente aos poderes de direção e de fiscalização do empregador e, por isso, não constitui ato ilícito".

Para o ministro, não ficou evidenciado abuso de direito no procedimento adotado pela empresa e, portanto, não houve a ilegalidade alegada pela empregada que ajuizou a ação de indenização por danos morais. A ministra Delaíde Miranda Arantes ficou vencida.

  • Processo Relacionado : 2088400-32.2007.5.09.0002

__________

ACÓRDÃO

7ª Turma

PPM/dsv

RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. REVISTA VISUAL DE BOLSAS E SACOLAS. Esta Corte Superior tem se posicionado no sentido de que a revista visual de pertences dos empregados, feita de forma impessoal e indiscriminada, é inerente aos poderes de direção e de fiscalização do empregador e, por isso, não constitui ato ilícito. No presente caso, do quadro fático delineado pelo acórdão regional, entendo que não ficou evidenciado abuso de direito no procedimento de revista adotado pelo réu. Registrou-se que não houve contato físico com os empregados e não consta no acórdão que houve a exposição indevida destes durante a revista, ou a adoção de critérios discriminatórios para a realização da inspeção. Assim, não se há de falar em ato ilícito da reclamada. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-2088400-32.2007.5.09.0002, em que é Recorrente KRAFT FOODS BRASIL S.A. e são Recorridos S.C. e SITEL DO BRASIL LTDA.

Em face do acórdão às fls. 1465/1494 (sequencial 01), complementado às fls. 1549/1551 (sequencial 01), oriundo do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, a 1ª reclamada interpõe recurso de revista (fls. 1555/1584 - sequencial 01).

Despacho de admissibilidade às fls. 1591/1593 (sequencial 01).

Contrarrazões às fls. 1597/1605 (sequencial 01).

Dispensado o parecer da Procuradoria-Geral, nos termos do artigo 83, § 2º, II, do Regimento Interno do TST.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos extrínsecos de admissibilidade do recurso de revista, passo ao exame dos pressupostos intrínsecos.

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - REVISTA VISUAL DE BOLSAS E SACOLAS

CONHECIMENTO

O Tribunal Regional firmou o seguinte entendimento acerca da matéria, in verbis:

-INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL

A ré Kraft pede seja afastada a condenação ao pagamento de indenização por dano moral decorrente da realização de revistas pessoais realizadas. Alega que houve interpretação equivocada da prova testemunhal produzida e que jamais realizou revistas íntimas. Se assim não se entender, alega que a simples verificação de sacolas e objetos pessoais não expõe o empregado a situação vexatória (fl. 1003). Afirma, ainda, que o autor não demonstrou a existência de prejuízo à sua honra, dignidade e boa fama (fl. 1011).

Sem razão.

De início, sinale-se que, em suas razões de recurso, a Kraft não nega as afirmações da sentença de que o documento de fl. 161 revela a preocupação por parte da Kraft em prevenir os furtos e de que a prova oral esclareceu que o procedimento foi adotado e, por questões de segurança, envolveu tanto os empregados da Kraft quanto os terceirizados.

A meu ver, a revista é forma de fiscalização do empregador que atenta à dignidade dos empregados, pois todos são, a princípio, suspeitos de se apropriarem indevidamente de objetos que não lhes pertencem. Aliás, não vejo como entender de maneira diversa tal atitude.

O contrato de trabalho é pessoal, pois cada empregado é contratado individualmente, mantendo-se em cada contrato de trabalho um grau de fidúcia que o sustenta. Por isso, quando esta confiança deixa de existir, a solução é a extinção do contrato de trabalho.

O fato de não ter havido contato físico não torna lícita a conduta da ré, uma vez que a exigência de revista, diária ou aleatória, dos empregados, sem que existisse uma causa específica para sua realização, é forma de constrangimento. Igualmente, o exame de bolsas ou sacolas, que era o caso. Ainda assim, é evidente a ideia de que, ao abrir a bolsa, o empregado está comprovando que não subtraiu nenhum objeto que não lhe pertence, havendo ofensa à noção de que deve se partir da boa-fé de todos. Há, aqui, clara ofensa ao princípio geral da presunção de inocência, o qual deve ser considerado de maneira ainda mais firme em se tratando de relação de emprego, em que, como já afirmado, a fidúcia é elemento essencial.

Em que pese os motivos ponderados pela ré Kraft no documento de fl. 161, ainda que existisse a possibilidade de desvio de objetos, não se pode considerar que todos os empregados são culpados, cabendo à empresa implantar, se necessário, sistemas de proteção de seu patrimônio que não ofendam a dignidade dos empregados. Data venia, o exame dos pertences existentes dentro de bolsas e sacolas pode expor o empregado a constrangimentos, pois o que cada um carrega consigo não é problema de mais ninguém e, por isso, não pode ser visto sem que haja autorização.

Por todo o exposto, concluo que a revista implantada pela Kraft causou prejuízo moral ao empregado, devendo prevalecer a condenação em R$ 15.000,00 (fl. 915), que é até inferior ao que esta Turma costuma fixar em situações semelhantes.

Nada a deferir.

NEGO PROVIMENTO ao recurso ordinário da ré Kraft.-

A recorrente sustenta no tocante à revista dos empregados, que da forma como procedida, não caracterizou ato ilícito, porque não houve excesso, abuso ou contato físico, sendo um direito do empregador zelar pelo seu patrimônio. Aponta violação dos artigos 818 da CLT; 186, 187 e 927 do Código Civil e 333, I, do Código de Processo Civil. Transcreve arestos para o confronto de teses.

O segundo aresto colacionado às fls. 1563 (sequencial 01), oriundo do TRT da 12ª Região, enseja a admissibilidade do recurso de revista, pois consigna a tese de que a revista rotineira feita pelo empregador em bolsas e sacolas dos empregados, de forma não abusiva e sem expor a situação vexatória, não configura dano moral e, portanto, não enseja a reparação civil.

Conheço do recurso de revista, por divergência jurisprudencial, nos moldes do artigo 896, -a-, da CLT.

MÉRITO

Esta Corte Superior tem se posicionado no sentido de que a revista visual de pertences dos empregados, feita de forma impessoal e indiscriminada, é inerente aos poderes de direção e de fiscalização do empregador e, por isso, não constitui ato ilícito.

Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:

-RECURSO DE REVISTA. 2. DANO MORAL. REVISTA. OBJETOS PESSOAIS DO EMPREGADO. VALOR INDENIZATÓRIO. A egrégia Turma, com base na análise dos fatos e provas produzidos nos autos, consignou que a reclamada procedia à revista pessoal em seus empregados, restando incontroverso que tais práticas se davam de forma generalizada e apenas nos pertences dos funcionários, sem o contato físico. Neste contexto, a jurisprudência deste colendo Tribunal Superior do Trabalho inclina-se no sentido de que a revista em objetos pessoais - bolsas e sacolas - dos empregados da empresa, realizada de modo impessoal, geral, sem contato físico ou exposição de sua intimidade, não submete o trabalhador a situação vexatória ou caracteriza humilhação, vez que decorre do poder diretivo e fiscalizador do empregador, revelando-se lícita a prática desse ato. Em que pese ter o egrégio Tribunal Regional utilizado a expressão -revista íntima-, depreende-se do seu suporte fático que as revistas se dirigiam apenas aos pertences dos trabalhadores, de forma generalizada e sem contato físico, o que afasta a ocorrência de violação à intimidade do reclamante. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido.- (Processo: RR - 2368300-76.2009.5.09.0013 Data de Julgamento: 14/03/2012, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 23/03/2012.)

-RECURSO DE REVISTA. PROCESSO ELETRÔNICO - DANO MORAL. EMPREGADO SUBMETIDO A REVISTAS VISUAIS EM BOLSAS. INEXISTÊNCIA DE DIREITO À INDENIZAÇÃO. O entendimento adotado pelo Regional no sentido de que -a revista visual de bolsas dos empregados configura dano moral, razão pela qual se deve aplicar uma indenização pertinente- está em desarmonia com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual a revista visual realizada nos pertences dos empregados (bolsas, armários e veículos), de forma razoável, assim considerada aquela em que não ocorre contato corporal ou despimento e desvinculada de caráter discriminatório, não configura, por si só, ato ilícito a ensejar a reparação por dano de índole moral, mas constitui exercício regular do poder de direção e fiscalização do empregador. Recurso de Revista conhecido e provido.- (Processo: RR - 88500-02.2008.5.19.0004 Data de Julgamento: 07/03/2012, Relator Ministro: Márcio Eurico Vitral Amaro, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/03/2012.)

-RECURSO DE REVISTA - INDENIZAÇÃO - DANO MORAL - REVISTA VISUAL DO EMPREGADO E DE BOLSAS E SACOLAS - AUSÊNCIA DE CONTATO FÍSICO. A revista apenas visual do empregado e de bolsas e sacolas dos funcionários da empresa, realizada de modo impessoal, geral, sem contato físico e sem expor a intimidade do obreiro, não submete o trabalhador à situação vexatória e não abala o princípio da presunção da boa-fé que rege as relações de trabalho. O ato de revista do funcionário e de bolsas e sacolas, por meio de verificação meramente visual, é lícito e consiste em prerrogativa do empregador inserida dentro do seu poder diretivo, não caracterizando prática excessiva de fiscalização capaz de atentar contra os direitos da personalidade do empregado, em especial sua dignidade e intimidade. Recurso de revista não conhecido.- (Processo: RR - 86700-12.2008.5.09.0005 Data de Julgamento: 08/02/2012, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/02/2012.)

-DANO MORAL. REVISTA NAS BOLSAS E SACOLAS DOS EMPREGADOS. Diante dos fatos registrados pelo Tribunal de origem, entendo que a revista efetuada em relação à reclamante, na sua bolsa ou sacola, sem contato físico ou revista íntima, não teve caráter ilícito, apto a ser reparado por meio de indenização por dano moral. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento.- (RR - 228900-04.2006.5.09.0008, Rel. Ministro: João Batista Brito Pereira, 5ª Turma, DEJT 01/04/2011)

No presente caso, do quadro fático delineado pelo acórdão regional, entendo que não ficou evidenciado abuso de direito no procedimento de revista adotado. Registrou-se que não houve contato físico com os empregados e não consta no acórdão que houve a exposição indevida destes durante a revista, ou a adoção de critérios discriminatórios para a realização da inspeção. Assim, não se há de falar em ato ilícito da reclamada.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso de revista para excluir da condenação o pagamento da indenização por dano moral.

Fica prejudicado o exame do tema atinente ao valor dessa indenização.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, conhecer do recurso de revista, quanto ao tema -Indenização por dano moral - revista visual de bolsas e sacolas- e, no mérito, dar-lhe provimento para excluir da condenação o pagamento da indenização por dano moral, ficando prejudicada a análise do tema atinente ao valor dessa indenização. Vencida a Exma. Ministra Delaíde Miranda Arantes. Mantém-se o valor arbitrado à condenação.

Brasília, 27 de junho de 2012.

Pedro Paulo Manus

Ministro Relator

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