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Justiça do Trabalho

Empresa é condenada por reduzir salário de trabalhador paraplégico

Salário era pago "por fora".

Da Redação

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Atualizado às 07:48

Um empregado da empresa paulista Comercial Cerávolo Ltda. vai receber indenização por danos morais, no valor de R$ 15 mil, em decorrência de a empresa ter retirado os salários que lhe pagava "por fora", após ele sofrer grave acidente rodoviário que o deixou paraplégico e afastado pelo INSS. A 3ª turma do TST entendeu devida a indenização que havia sido indeferida pelo TRT da 15ª região.

Na reclamação ajuizada pelo empregado em 2010, além das verbas trabalhistas pertinentes, o empregado requereu indenização pelos danos morais sofridos e teve o pedido acatado pelo juízo do 1º grau.

No entanto, a empresa interpôs recurso e o TRT reformou a sentença, excluindo da condenação o pagamento da indenização por danos morais. No entendimento regional, o pagamento do salário "por fora", correspondia a "danos de ordem material, que serão ressarcidos, uma vez que incluídos na condenação". Inconformado, o empregado recorreu ao TST, sustentando que ilegalidade da redução salarial lhe garantiria a indenização pelos transtornos morais causados.

Ao examinar o recurso na 3ª turma do TST, o ministro Alexandre Agra Belmonte, relator, lhe deu razão, com o entendimento que a redução salarial "no momento em que o empregado mais necessitava da integralidade de seus vencimentos, de modo a honrar com as obrigações habitualmente assumidas, redundou em ato ilícito, na forma do artigo 186 do CC/02". Segundo o relator, a redução salarial configura dano moral passível de indenização, pois atinge direito fundamental à subsistência própria e da família e ofende a dignidade da pessoa humana.

O relator acrescentou ainda que o pagamento de salários "por fora", por si, é prejudicial ao empregado, uma vez que implica em menores contribuições previdenciárias e, consequentemente, em menor recebimento do benefício previdenciário pelo trabalhador. Irregularidade que foi solucionada pela via judicial, informou.

O relator reformou o acórdão regional e restabeleceu a sentença que deferiu ao empregado a indenização pelo dano moral sofrido. Seu voto foi seguido por unanimidade na 3ª turma.

Veja a íntegra da decisão.

_____________

ACÓRDÃO

3ª Turma

GMAAB/ah/lr/MCG

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. SALÁRIO NÃO CONTABILIZADO ("POR FORA"). ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO SOFRIDO PELO RECLAMANTE. REDUÇÃO DO PAGAMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. Ante uma possível violação de dispositivo de lei, impõe-se o provimento do agravo de instrumento, para melhor exame do recurso de revista. Agravo de instrumento provido.

RECURSO DE REVISTA. SALÁRIO NÃO CONTABILIZADO ("POR FORA"). ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO SOFRIDO PELO RECLAMANTE. REDUÇÃO DO PAGAMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. Trata-se de hipótese na qual a reclamada, após acidente automobilístico que resultou na paraplegia do reclamante, reduziu o salário que vinha sendo pago "por fora". A redução, levada a efeito no momento em que o reclamante mais necessitava da integralidade de seus vencimentos, de modo a honrar com as obrigações habitualmente assumidas, redundou em ato ilícito, na forma do artigo 186 do Código Civil. Tal prática configura dano moral que deve ser indenizado pela reclamada, pois reduzir salário é atingir direito fundamental à subsistência própria e da família e ofender a dignidade da pessoa humana. Tem-se por violado o dispositivo de lei citado, o que determina o provimento do recurso, restabelecendo-se a sentença, no particular. Recurso de revista conhecido e provido.

CONCLUSÃO: Agravo de instrumento provido. Recurso de revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-461-82.2010.5.15.0129, em que é Recorrente ALEXANDRE RODRIGO DE CARVALHO e Recorrido COMERCIAL CERÁVOLO LTDA.

Contra o r. despacho (fls. 428-429) que negou seguimento a recurso de revista, por não configuradas as hipóteses previstas nas alíneas do artigo 896 da CLT, o reclamante interpõe agravo de instrumento (fls. 432-438).

Sustenta que o recurso de revista merece processamento, uma vez que entende ter demonstrado que a decisão regional afronta dispositivos de lei e da Constituição Federal, além de divergir do aresto que colaciona.

Não foram apresentadas contraminuta e contrarrazões, como certificado (fl. 442), sendo dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, na forma do artigo 83, § 2º, inciso II, do RITST.

É o relatório.

VOTO

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO

O agravo de instrumento é tempestivo (fls. 430 e 432), subscrito por advogado habilitado (fl. 21) e processado nos autos do recurso denegado (Resolução Administrativa-TST nº 1.418/2010). CONHEÇO.

O egrégio Tribunal Regional negou seguimento ao recurso de revista do reclamante, ao fundamento de que:

"(...)

RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR /

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL

Ao concluir que o reclamante não faz jus à indenização por danos morais, o v. acórdão, além de ter se fundamentado nas provas, conferiu razoável interpretação ao dispositivo constitucional apontado, o que torna inadmissível o apelo, de acordo com as Súmulas 126 e 221, II, do C. TST.

Por outro lado, o recorrente não logrou demonstrar o pretendido dissenso interpretativo, uma vez que o único aresto colacionado se mostra inespecífico, não preenchendo, dessa forma, os pressupostos da Súmula 296, inciso I, do C. TST.

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista.

Publique-se e intime-se." (fl. 428)

O reclamante interpõe, então, agravo de instrumento (fls. 432-438). Sustenta que o recurso de revista merece processamento, uma vez que entende ter demonstrado que a decisão regional afronta dispositivos de lei e da Constituição Federal, além de divergir do aresto que colaciona. Afirma que a reclamada, ao reduzir o pagamento do salário não contabilizado, pago "por fora", no momento em que o reclamante mais necessitava dele, em função do afastamento em decorrência do acidente automobilístico sofrido que o deixou paraplégico, causou-lhe enormes transtornos sociais. Entende que todos os pressupostos para a imposição do dever de indenizar, o ato causador do dano e a culpa da empresa, ficaram comprovados.

Vejamos.

Em linhas gerais, o egrégio TRT da 15ª Região, reformou a sentença, excluindo da condenação o pagamento de indenização por dano moral.

O artigo 186 do Código Civil estabelece que aquele, que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Ante uma possível violação do mencionado dispositivo de lei, impõe-se o provimento do agravo de instrumento, para melhor exame do recurso de revista.

Em face do exposto, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.

II - RECURSO DE REVISTA

O recurso de revista é tempestivo (fls. 363 e 406), está subscrito por advogado habilitado (fl. 21) e dispensado o preparo, pelo que passo à análise dos pressupostos intrínsecos de admissibilidade.

1 - CONHECIMENTO

1.1 - SALÁRIO NÃO CONTABILIZADO ("POR FORA") - AFASTAMENTO EM DECORRÊNCIA DE ACIDENTE AUTOMOBILISTICO SOFRIDO PELO RECLAMANTE - REDUÇÃO DO PAGAMENTO - DANO MORAL

O egrégio Tribunal Regional deu parcial provimento ao recurso ordinário da reclamada, excluindo da condenação o pagamento de indenização por danos morais. Eis a motivação do decisum:

"(...)

DANOS MORAIS

A princípio, destaco que ficou evidente que a reclamada pagava habitualmente salário "por fora".

De igual modo, restou demonstrado que a parcela supracitada, após o reclamante ter se afastado do trabalho em virtude do acidente de trânsito, passou a ser paga a menor.

O pagamento de salário "por fora" e a sua ulterior diminuição, entre outras condutas, consubstanciam, tão-somente, danos de ordem material, que serão ressarcidos, uma vez que incluídos na condenação.

Nesse contexto, apenas para elucidar a matéria ora apreciada, colaciono os ensinamentos do insigne Sílvio de Salvo Venosa, verbis:

Dano moral é o prejuízo que afeta o ânimo psíquico, moral e intelectual da vítima. Nesse campo, o prejuízo transita pelo imponderável, daí porque aumentam as dificuldades de se estabelecer a justa recompensa pelo dano. Em muitas situações, cuida-se de indenizar o inefável. Não é também qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização. Aqui também é importante o critério objetivo do homem médio, o bonus pater familias: não se levará em conta o psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com os fatos diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino. Nesse campo, não há fórmulas seguras para auxiliar o juiz. Cabe ao magistrado sentir em cada caso o pulsar da sociedade que o cerca. (...) Será moral o dano que ocasiona um distúrbio anormal na vida do indivíduo; uma inconveniência de comportamento ou, como definimos, um desconforto comportamental a ser examinado em cada caso (in Direito Civil, Responsabilidade Civil, 3ª edição, Ed. Atlas, págs. 33 e 34).

Assim, excluo a indenização em epígrafe.

(...)." (fls. 360-361)

Contra essa decisão, o reclamante interpõe recurso de revista, às fls. 406-427. Aduz que a decisão regional, acerca do dano moral, merece reforma, considerando que a redução no pagamento do salário não contabilizado, pago "por fora", no momento em que o reclamante mais necessitava dele para honrar com suas obrigações, em função do afastamento em decorrência do acidente automobilístico sofrido que o deixou paraplégico, causou-lhe enormes transtornos sociais, na medida em que não está recebendo o benefício do INSS do salário não contabilizado, tornando-se inadimplente com seus compromissos financeiros. Assevera que a prática do pagamento de salário "por fora" além de burlar a legislação trabalhista, viola normas previdenciárias com repercussão imediata, causando manifesto prejuízo ao reclamante, que se viu impedido de receber o que lhe era de direito, justamente quando mais precisava, além de fragilizar a subsistência da entidade familiar, sendo certa a ocorrência de constrangimento. Entende que todos os pressupostos para a imposição do dever de indenizar, o ato causador do dano e a culpa da empresa, ficaram comprovados. Denuncia ofensa aos artigos 5º, X, da Constituição Federal e 186 do Código Civil e divergência jurisprudencial.

Vejamos.

O artigo 186 do Código Civil estabelece que aquele, que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Na hipótese, a reclamada, após acidente automobilístico que resultou na paraplegia do reclamante, reduziu o salário que vinha sendo pago "por fora". A redução, levada a efeito no momento em que o reclamante mais necessitava da integralidade de seus vencimentos, de modo a honrar com as obrigações habitualmente assumidas, redundou em ato ilícito, na forma do artigo 186 do Código Civil.

Tal prática configura dano moral que deve ser indenizado pela reclamada, pois reduzir salário é atingir direito fundamental à subsistência própria e da família e ofender a dignidade da pessoa humana.

Acrescente-se que o só fato de pagar salários "por fora" já implica prejuízos para o reclamante, na medida em que as contribuições previdenciárias são feitas a menor, e via de consequência, o benefício previdenciário também é pago a menor; irregularidade solucionada depois de acionada a via judicial.

A egrégia Corte Regional, ao reformar a sentença, excluindo da condenação o pagamento de indenização por dano moral, violou o dispositivo de lei citado, o que autoriza a cognição recursal.

Sendo assim, CONHEÇO do recurso de revista, por violação do artigo 186 do Código Civil.

2 - MÉRITO

2.1 - SALÁRIO NÃO CONTABILIZADO ("POR FORA") - AFASTAMENTO EM DECORRÊNCIA DE ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO SOFRIDO PELO RECLAMANTE - REDUÇÃO DO PAGAMENTO - DANO MORAL

Conhecido o recurso por violação do artigo 186 do Código Civil, o seu provimento é medida que se impõe.

DOU PROVIMENTO ao recurso de revista para, reformando o v. acórdão regional, restabelecer a r. sentença às fls. 303-315, no particular.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, I - dar provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista; e II - conhecer do recurso de revista por violação do artigo 186 do Código Civil, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reformando o v. acórdão regional, restabelecer a r. sentença às fls. 303-315, no particular.

Brasília, 5 de Setembro de 2012.

ALEXANDRE AGRA BELMONTE

Ministro Relator