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Reclame Aqui: o canal entre empresas e consumidores que foi parar no Judiciário

Empresas contestam o conteúdo das reclamações na Justiça, mas as decisões têm sido favoráveis ao site.

Da Redação

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Atualizado em 16 de maio de 2016 17:34

Um overbooking, a perda de um negócio, e a falta de um canal efetivo de comunicação entre empresa e cliente. Estes foram os principais fatores que levaram o empresário Maurício Vargas a dar o pontapé inicial e criar o Reclame Aqui, uma das mais importantes fontes de informações sobre consumo do país.

O Reclame Aqui se define como não apenas um site de reclamações, mas um site de pesquisa. Diariamente, mais de 600 mil pessoas utilizam a plataforma para se informar a respeito da reputação das empresas antes de realizar uma compra ou contratar um serviço.

Recentemente, o site promoveu uma campanha em comemoração de seu aniversário chamada "O Jantar da Vingança". O objetivo era fazer com que representantes das empresas campeãs de reclamações saboreassem do mesmo "veneno" oferecido aos consumidores.

A ampliação do alcance do site e a exposição abriu os olhos de fornecedores para a importância da opinião do consumidor, mas também despertou a fúria de algumas empresas, descontentes com a questão da "reputação" e o teor de certas publicações. E é aí que entra em cena o Judiciário.

Litigância

Com 15 anos de existência, o Reclame Aqui já foi, e é, alvo de inúmeras ações no Judiciário. As autoras alegam, na maior parte dos processos, que os usuários teriam divulgado fatos inverídicos ou que excederam os limites do direito de informação e de liberdade de expressão, afetando a reputação da empresa.

Sustentam ainda que não prevalece a ilegitimidade passiva da Óbvio Brasil, a holding que é dona do Reclame Aqui, e também que a empresa tem dever de vigilância sobre o que é publicado em sua plataforma.

Entretanto, o diretor de operações do Reclame Aqui, Diego Campos, argumenta - com base na CF, no CDC e, principalmente, no marco civil da internet - que o site não é responsável pelo conteúdo publicado por terceiros.

"Hoje com o marco civil internet ficou muito mais simples determinar quais são as reais responsabilidades do Reclame Aqui na condição de provedor de conteúdo. Ele define que o Reclame Aqui não é responsável pelo conteúdo redigido por terceiros. Obviamente que isso não significa que o Reclame Aqui não tenha que tomar providencias em situações que exijam essas providências."

Por outro lado, Campos explica que a dinâmica de funcionamento do Reclame Aqui está baseada no art. 5º da CF, do qual destaca cinco pontos: "a liberdade de expressão vedando o anonimato, a ausência de censura, o direito ao contraditório e o direito à informação". Assim, o site não se isenta da responsabilidade de tomar providências em situações que as exijam.

"O Reclame Aqui tem uma equipe preparada e dimensionada para atender e analisar essas solicitações [de remoção de conteúdo] todos os dias. São centenas de reclamações editadas ou desativadas diariamente, justamente porque houve violação dos termos de uso do site ou porque em algum momento o consumidor acabou extrapolando seus direitos (uso de palavras inadequadas, por exemplo)."

Este entendimento tem sido adotado por alguns dos principais Tribunais de Justiça do país. Segundo o diretor, a grande maioria das ações ajuizadas contra o site tiveram decisão favorável a ele. Afirma que, na maioria das vezes, entende-se que "a atividade desenvolvida pelo Reclame Aqui é legítima, respeita a legislação vigente do Brasil, e que os direitos fundamentais dos cidadãos precisam ser garantidos acima de qualquer coisa".

Além disso, Campos considera pequena a quantidade de processos abertos contra o site, tendo em vista a quantidade de empresas reclamadas e de reclamações registradas. De acordo com ele, em 2015, foram pouco mais de 64 processos distribuídos, número pequeno diante do número de reclamações que o site registrou.

Pesquisa realizada no site do TJ/SP com relação à Obvio Brasil Holding Ltda. revela que há, atualmente, disponíveis para consulta, 28 processos em 1º grau, e 17 em grau recursal. Pela mesma razão social, se encontra no TJ/RJ quatro ações em tramitação, no TJ/MG, 1 processo; no TJ/SC, 3 processos; no TJ/PE, 2 processos e do TJ/DF, nenhum processo.

Alvo: Judiciário

Apesar de não caracterizar relação de consumo, o "serviço" do Judiciário também é alvo de avaliação no site. Uma seção, que contempla o TJ/SP, conta com 26 reclamações, das quais, conforme balanço divulgado pelo Reclame Aqui, apenas uma foi atendida.

Entre as queixas mais recentes estão "Juiz equivocado em julgar minha causa", "Depósito judicial falso", "Demora para atos surtirem efeitos práticos", "Tribunal improdutivo", "Atraso no processo", "Má qualidade do sistema digital do TJ/SP", "Justiça que sempre falha", "Prerrogativas sumariamente incongruentes", entre outras.

Vídeos publicado no YouTube com reclamações dos serviços prestados pelo site também já fez com que o Reclame Aqui passasse do polo passivo para o ativo da demanda. A empresa buscou o Judiciário alegando que as postagens teriam caráter ofensivo à reputação da empresa requerente e atingem a pessoa dos sócios.

O juiz de Direito Flávio Saad Peron, da 16ª Vara Cível de Campo Grande/MS, negou pedido de antecipação de tutela para que os vídeos fossem excluídos. De acordo com o magistrado, não foram verificados comportamentos que denigram ou ofendam a reputação, a imagem e a honra dos requerentes, afastando, assim, o perigo de demora no provimento jurisdicional.

"Ainda que se possa afirmar que um dos vídeos seja mais incisivo que o outro, inexiste, ao menos por ora, qualquer conteúdo ofensivo, calunioso ou difamatório que possa importar nos danos morais alegados."

Decisões

Recentemente, a 2ª câmara de Direito Privado do TJ/SP negou pedido de indenização formulado por uma médica oftalmologista devido à publicação de comentários de um paciente no site Reclame Aqui. O tribunal, entretanto, manteve a deliberação de 1º grau para determinar a exclusão do site da reclamação indicada na inicial.

Apesar de a profissional alegar que o comentário seria ofensivo e teria causado lesão à sua honra e imagem, o colegiado concluiu que o site funciona como mera plataforma por meio da qual se estabelece um diálogo entre consumidores e prestadores de serviço, não podendo ser responsabilizada.

Ainda em abril deste ano, a Justiça Federal de SP isentou o Reclame Aqui de retirar publicações feitas por clientes contra advogados e sociedades de advogados do site. Segundo a juíza Federal Renata Coelho Padilha, da 12ª vara Cível em SP, a escolha de utilizar esse canal de reclamações é do próprio cliente, sobre quem recai a responsabilidade por eventuais danos causados a terceiros.

"O que não se admite, contudo, é que o Judiciário interfira na livre iniciativa da requerida de forma indevida, sem uma justificação fundada na legislação constitucional ou infraconstitucional", afirmou na decisão.

Em outra oportunidade, em dezembro do ano passado, o juiz de Direito Alexandre Batista Alves, da 14ª vara Cível de SP, concedeu antecipação de tutela para obrigar o Reclame Aqui a remover todas as reclamações com conteúdo ofensivo ao MercadoLivre.

De acordo com o magistrado, é certo que a manifestação do pensamento é livre e assegurada em nível constitucional, contudo, os abusos praticados no exercício desse direito são passíveis de exame e apreciação pelo Poder Judiciário.

Em sua decisão, o juiz pontuou não ser ilegal ou ilegítima a atividade do Reclame Aqui, consistente em disponibilizar um espaço virtual entre consumidores e fornecedores, a fim de que reclamações sejam veiculadas e até mesmo sanadas. "Ao revés, fortalece o exercício da cidadania, dando ênfase à liberdade de expressão."

Contudo, ressaltou que mesmo o site não sendo responsável pelo conteúdo do material, têm o dever de exclui-lo da internet quando instado a fazê-lo, como provedor e hospedeiro.

Termos de uso

Para usufruir dos serviços prestados pelo site, o Reclame Aqui impõe como condição a observância de alguns fatores, constantes dos "Termos e Condições de Uso". No item 5, denominado "Da Propriedade Intelectual e da Responsabilidade pelas Informações", cinco subitens destacam-se, em letras vermelhas.

De acordo com o site, o usuário tem a ciência de que, após postar um comentário, a publicação não poderá ser retirada de maneira alguma (5.6); e não poderá incluir comentários ilícitos no site, atribuindo a alguém a prática de crime, ou fato ofensivo à sua reputação (5.7), devendo pautar suas opiniões em conformidade com a lei e a moral (5.8).

Ainda conforme esclarece o site, o Reclame Aqui não endossa as opiniões e comentários ofensivos e duvidosos de usuários, sendo que estes sempre que detectados serão retirados a qualquer momento (5.9).

Segundo Diego Campos, para evitar abusos nos comentários, o site exige que todos os usuários sejam identificados com nome e sobrenome, CPF, e-mail, telefone e cidade/Estado onde reside. Além disso, existem mecanismos que identificam palavras de baixo calão no conteúdo de reclamações, fazendo a edição automática. Depois que a reclamação é registrada, a empresa citada é notificada para verificar e, caso existir alguma irregularidade, abrir um chamado de moderação de conteúdo. Se a ofensa for constatada, é feita uma edição do conteúdo, ou até mesmo uma remoção.

"É importante destacar que o Reclame Aqui não faz análise de mérito, ou seja, se o reclamante tiver alguma relação de consumo ou comercial com a empresa reclamada, e a reclamação abordar essa relação, não cabe ao Reclame Aqui analisar se o mesmo tem razão ou não em seu pleito."

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