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Os serviços de valet e os riscos para o consumidor

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Atualizado em 14 de agosto de 2013 10:55

Meu amigo Outrem Ego mora em frente a alguns restaurantes que oferecem serviços de manobristas grátis (os chamados valets). E, um dia desses, me ligou indignado. Ele disse que é perigoso atravessar as tranquilas ruas de perto de sua casa porque os manobristas passam em alta velocidade: "Os manobristas recebem o automóvel das mãos do cliente e, assim que este entra no restaurante, eles saem em disparada, pisando fundo no acelerador". Disse, também, que a rua tem sido o local de estacionamento dos veículos: "Ora, se é para estacionar na rua, eu mesmo faço", reclamou.

De fato, esses e outros problemas atingem os consumidores que entregam seus automóveis para os manobristas de bares, restaurantes, teatros e outros estabelecimentos.

Assim, na coluna de hoje tratarei dos direitos e violações relativos a esse serviço, que é oferecido por uma série de estabelecimentos comerciais na cidade de São Paulo e em todo o país.

Os abusos são muitos e vão além dos apontados por meu amigo, tais como excesso de velocidade, ultrapassagem de semáforo no vermelho, conversões ilegais, estacionamento em locais proibidos, o que inclui calçadas e guias rebaixadas, etc. E, muitos consumidores não sabem dos riscos que correm: se o automóvel entregue nas mãos dos manobristas sofrer algum tipo de multa de trânsito, como de estacionamento irregular ou ultrapassagem proibida no semáforo, é o consumidor que arcará com seu pagamento. Claro que ele tem direito de se ressarcir junto ao serviço de valet ou do estabelecimento comercial que o oferece.

Mas a solução não é tão simples, pois o consumidor tem que, primeiro, pagar a multa, depois procurar o prestador do serviço ou restaurante, teatro, etc. e tentar receber. E, infelizmente, não há boas notícias por aqui, porque muitos estabelecimentos simplesmente se negam a fazer o reembolso, alegando que não há prova de que foi o manobrista ou que não há como provar que aconteceu naquele momento, dentre outros tipos de escusas.

A saída, então, é o Poder Judiciário, mas muitos desistem porque nem sempre o valor da multa compensa o trabalho e o custo. Pior: se a multa gerar pontuação negativa no prontuário do proprietário, é para este que vai. Aliás, mesmo que o prestador do serviço ou o estabelecimento comercial faça o reembolso da multa, ainda assim, o consumidor sofrerá mais transtornos, pois terá ainda que apresentar recurso ao Detran e tentar provar que era outro o motorista. Algo difícil de conseguir.

Além disso, o comum é que o manobrista, ao verificar que o veículo sofreu multa, retire a notificação do vidro e a jogue fora. Conclusão: o consumidor só fica sabendo quando recebe o aviso para pagamento em casa.

Há mais problemas. O manobrista pode riscar a lataria do veículo, pode rasgar o assento, pode quebrar o câmbio, estragar o motor (lembre-se de que, às vezes, até mesmo na cara do cliente, o manobrista sai cantando pneu ou chega rasgando, como se diz). Ele pode bater o veículo em outro ou na guia ou no poste, etc. Mais grave: ele pode atropelar alguém. Acontece também dele deixar o veículo aberto e ele ser furtado ou furtarem coisas que estavam no interior.

A responsabilidade pelos danos, segundo a lei, é tanto do prestador de serviço de valet como do estabelecimento comercial que o oferece. O problema é que, mais uma vez, nem tudo é constatado na hora ou pode ser provado pelo consumidor.

Alguns estacionamentos já adotam a tática de verificar os vícios aparentes que o carro tenha e, no ato da entrega do recibo, anotam as avarias. É uma boa ação que garante ambas as partes. Mas, muitos não fazem isso, nem os serviços de valet. Além do mais, os problemas com motor, câmbio, etc. não podem ser constatados desse modo. Logo, se o manobrista causar algum dano ao veículo, é difícil provar que aconteceu quando estava nas mãos dele.

A situação piora muito se o acidente causado atingir bens de terceiros ou causar danos diretamente a outra pessoa, que deve ser socorrida, hospitalizada, etc. e, é mais grave ainda, se causar invalidez provisória, permanente ou morte.

Em todos esses casos, segundo entendimento do Poder Judiciário, o proprietário do veículo causador do acidente poderá ser processado e responsabilizado para indenizar o terceiro atingido. E não é pouca coisa: evidentemente depende da extensão do dano, mas, por exemplo, pode ocorrer perda total do veículo do terceiro, hospitalização, invalidez ou morte. A indenização nesses casos envolve tudo o que esse terceiro/vítima perdeu. Além disso, poderá haver indenização pelos danos morais sofridos a ser paga à vítima que sobreviveu ou aos familiares da vítima falecida.

É verdade que a responsabilidade final é do prestador do serviço de valet ou do estabelecimento comercial. Porém, como o Judiciário entende que o proprietário que entrega o veículo ao terceiro (pode ser o manobrista, o filho, o amigo, etc.) é o primeiro responsável, este, uma vez processado, terá que arcar com toda a indenização e, só depois, é que poderá acionar o prestador do serviço de valet ou o estabelecimento comercial.

Lembro de que há o seguro: tanto o do consumidor (se tiver seguro para indenizar terceiros) como o do serviço de valet e do estabelecimento comercial. Contudo, se o consumidor tiver seguro, é necessário que não haja restrição na apólice para a entrega do veículo a terceiros, pois se houver a seguradora não quererá pagar a indenização. Além disso, as indenizações do seguro têm limites para cada tipo de dano e o juiz não está limitado a eles: a condenação pode ser maior e o proprietário terá que pagar a diferença, que pode ser altíssima.

No caso do seguro do prestador do serviço de valet e do estabelecimento comercial, o mesmo se dá em relação aos limites. Mas, o principal nesse aspecto é que não dá para garantir que eles tenham, de fato, seguro contratado.

Por tudo isso, como diria meu amigo Outrem Ego, a melhor prevenção é, sem dúvida, não utilizar o serviço, especialmente se o consumidor desconfiar de que seu veículo será largado na rua. Se é para estacionar nas ruas, é melhor ele mesmo fazer o serviço, pois é mais seguro, ele o coloca em local permitido, tranca o veículo corretamente, liga o alarme e leva as chaves.