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Corrida presidencial: novos desafios da velha política

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Atualizado às 07:41

Superada a anestesia da Copa do mundo, o grid de largada da corrida presidencial ganhou contornos mais nítidos na semana em que o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, arrebatou o apoio do 'centrão', conglomerado de partidos que hoje controla a pauta do Congresso Nacional e domina parcela expressiva da Esplanada Ministerial de Michel Temer.

A adesão em bloco das siglas que tutelam a agenda legislativa e administram o grosso do orçamento Federal torna o ex-governador de São Paulo competitivo na campanha pelo Palácio do Planalto, atenuando desconfianças acerca do seu desempenho que pairam sobretudo sobre o mercado financeiro e o empresariado.

Ao mesmo tempo, Jair Bolsonaro (PSL) e Ciro Gomes (PDT), rivais de Alckmin na disputa por vaga no segundo turno, sofreram reveses de natureza partidária, cujas consequências ainda estão sujeitas às intempéries da reta final de convenções, em meados de agosto.

Bolsonaro, líder nas pesquisas de intenção de voto que excluem o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), teve dois insucessos nas tratativas para escolher generais do Exército como vice.

Deve referendar a advogada Janaina Paschoal, uma das redatoras do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, como companheira de chapa - opção pouco efetiva para agregar apoios fora do eleitorado já convertido ao bolsonarismo.

Ciro, que flertou com o 'centrão' nos últimos dois meses e chegou a oferecer revisões em seu programa econômico para se ajustar ao figurino liberal almejado pelas siglas centristas, se distanciou do grupo com declarações ofensivas ao Ministério Público e uma inesperada manifestação contrária à venda da Embraer para a norte-americana Boeing.

Para ilustrar o súbito upgrade na candidatura de Alckmin é oportuno recapitular:

1) O tucano passará a ter ampla predominância na propaganda de TV, com 38% do tempo total dos programas fixos e 10 das 28 inserções diárias de 30 segundos veiculadas nos intervalos dos programas de maior audiência.

2) Cerca de 280 deputados integram as legendas que estão hoje próximas de formalizar embarque na coalizão alckmista - quase 30 votos além do patamar necessário para formar quórum qualificado e viabilizar aprovação de mudanças na Constituição.

3) Ministérios como os da Educação, Saúde, Transportes e Cidades, responsáveis por fatia expressiva da dotação orçamentária da União, são geridos pelo 'centrão'. São pastas de capilaridade nacional, capazes de irrigar com recursos e programas todos os rincões do país com vigor e celeridade.

A bússola do 'centrão' é conhecida. O bloco se guia pelas variáveis clássicas da política brasileira. Com as restrições ao financiamento privado, os partidos passaram a ser sustentados essencialmente pelo fundo partidário e, indiretamente, pelos recursos que administram na máquina pública. Daí a necessidade permanente de controlar a pauta do Legislativo e amealhar postos-chave nos Ministérios.

Prevaleceu entre os líderes do bloco a visão de que Alckmin seria a alternativa disponível no grid eleitoral que ofereceria menor risco para a manutenção dessa equação, criando um ambiente de blindagem institucional aos seus dirigentes, muitos deles questionados no campo ético.

Outro fator de desequilíbrio em favor de Alckmin foi a demanda das bases eleitorais dos centristas. O projeto de poder de cada sigla, atrelado ao tamanho de sua bancada na Câmara, depende da performance dos deputados e da formação de quociente eleitoral nos Estados.

O tucano é visto como apto a estruturar palanques regionais robustos e produzir agenda temática alinhada ao perfil de centro-direita hegemônico nos redutos desses parlamentares.

Efeito colateral

Alckmin passa a ter, portanto, instrumentos político-partidários para ganhar pontos nas pesquisas, onde segue estacionado com 7% a 8%, e perseguir uma vaga no segundo turno. O tucano, contudo, terá de lidar com os aspectos tóxicos da ampla aliança com os próceres do que se convencionou chamar de 'velha política'.

Ao atrair o consórcio que sustenta o impopular Temer, o ex-governador paulista absorve a agenda negativa que ronda o governo Federal e vira alvo imediato dos outsiders.

Dada a elevada repugnância do eleitorado à classe política tradicional, é prematuro decretar já a volta da polarização PSDB-PT que vinha permeando as campanhas presidenciais pós-redemocratização.

Lula, principal líder do PT, está preso e deve ter sua candidatura barrada pela Justiça Eleitoral. São imprecisas as projeções de transferência de votos do ex-presidente para eventual substituto petista - seja ele Fernando Haddad ou Jaques Wagner.

Desprezado pelo 'centrão', Ciro já acena aos eleitores de esquerda na expectativa de reinventar sua candidatura na esteira dos apoiadores de Lula que hoje buscam uma opção distante do petismo.

Em paralelo e com estratégias distintas, Bolsonaro e a ex-ministra Marina Silva (REDE) apelarão à negação da política tradicional como plataforma central de suas campanhas.

Ambos detêm musculosas redes de mobilização digital, ferramenta de campanha que independe de coalizões partidárias e se retroalimenta com o ódio inoculado em fração significativa do eleitorado.

Tais redes tendem a ser anabolizadas pelo noticiário policial prodigioso da operação Lava Jato, que vinculará até 7 de outubro os atuais detentores de poder e seus aliados a práticas de corrupção.

Em vez da usual polarização entre 'azuis' e 'vermelhos', há margem, portanto, para um enfrentamento das forças que gravitam no entorno do 'sistema' contra os seus mais contumazes detratores.

Mesmo diante das incertezas acerca do epílogo da narrativa de vilanização do establishment político, os presidenciáveis mais resilientes e capazes de mover as peças do xadrez sucessório em consonância com o 'regulamento' tendem a ser favoritos.

Até porque a premência de construção de maioria no segundo turno exigirá ampla habilidade para superação de estridentes diferenças ideológicas.

Para prestar atenção nos próximos dias:

Confirmação de Josué Alencar como candidato a vice na chapa de Alckmin (importante sobretudo para o tucano crescer no eleitorado de Minas Gerais);

Ritual de pacificação do PSDB paulista (Caso Alckmin e Doria superem as divergências internas, darão passo decisivo para fortalecer a estratégia anti-Bolsonaro no Estado);

Homologação das candidaturas de Henrique Meirelles e Álvaro Dias (ambos pouco competitivos, mas capazes de tirar pontos de potenciais concorrentes ao segundo turno);

O 'Dia D' do PSB nacional (aliança com Ciro, PT ou neutralidade);

Desdobramentos do lançamento do programa de governo de Lula-PT e articulações em torno do nome escolhido para vice na chapa.