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Quem fiscaliza os fiscais?

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Atualizado em 11 de agosto de 2011 13:29

 

Como sabido de quase todos os operadores do Direito, o Supremo Tribunal Federal, na ADIn 3.367 relatada pelo Ministro Cezar Peluso, quando julgou pleito apresentado pela Associação dos Magistrados Brasileiros contra a Emenda Constitucional que criou o Conselho Nacional de Justiça, além de afirmar, irrespondivelmente, a constitucionalidade do CNJ, deixou certo que a competência daquele Conselho é "relativa apenas aos órgãos e juízes situados, hierarquicamente, abaixo do Supremo Tribunal Federal". Tautologicamente enfatizou que "o Conselho Nacional de Justiça não tem nenhuma competência sobre o Supremo Tribunal Federal e seus ministros, sendo esse o órgão máximo do Poder Judiciário nacional, a que aquele está sujeito". Sintomaticamente, embora julgasse necessário afirmar e repetir a superioridade hierárquica do Supremo Tribunal, esqueceu-se de aclarar a quem compete julgar eventual deslize atribuído a membro daquela Corte Superior.

Realmente, segundo o art. 8° do Regimento Interno do STF, "compete ao Plenário e às Turmas, nos feitos de sua competência, (II) censurar ou advertir os (sic) juízes das instâncias inferiores e condená-los nas custas, sem prejuízo da competência do Conselho Nacional da Magistratura." Ou seja, nem mesmo o Plenário tem competência para impor sanção administrativa a ministro da Casa. Em outras palavras, a quem compete fiscalizar a conduta dos ministros da Suprema Corte?

De fato, a LOMAN, como é conhecida a lei complementar 35/79, dita Lei Orgânica da Magistratura Nacional, prevê, no art. 35, sem abrir qualquer exceção, serem deveres dos magistrados, qualquer seja o patamar em que estejam:

"I - Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;

II - não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar;

III - determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais;

IV - tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que os procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.

V - residir na sede da Comarca salvo autorização do órgão disciplinar a que estiver subordinado;

VI - comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término;

VII - exercer assídua fiscalização sobre os subordinados, especialmente no que se refere à cobrança de custas e emolumentos, embora não haja reclamação das partes;

VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular."

Sendo isso assim, a quem compete fiscalizar se o ministro do STF mantém ou não conduta irrepreensível? Se comparece ou não pontualmente ao expediente? Se excede ou não injustificadamente os prazos para decidir ou despachar? Ao que parece, a ninguém. E tanto isso é assim que o índice do RISTF, quando se refere aos seus ministros, arrola todos os temas que lhes dizem respeito, aí não incluídas as palavras "dever" e "obrigação". Ei-los:

Ministro do STF

- antiguidade: regulação (art. 17);

- apartes (art. 133, parágrafo único);

- arguição de suspeição (art. 278);

- assento: incompatibilidade (art. 18);

- assento no Plenário (art. 144);

- autor: pedido de vista (art. 134);

- composição do gabinete (art. 357);

- convocação nas férias (art. 78, § 3º);

- convocação nos recessos (art. 78, § 3º);

- direitos (art. 16);

- garantias (art. 16);

- impedimentos (arts. 277 e 287);

- incompatibilidade (art. 16);

- jurisdição nacional (art. 20);

- manifestação oral (art. 133);

- posse (art. 15);

- prazos (art. 111);

- prerrogativas (art. 16);

- Presidente do STF: Relator e Revisor (art. 75);

- Relator: atribuições (art. 21);

- Revisor (art. 24);

- suspeição (art. 277);

- transferência de Turma (art. 19).

No dia 2 de agosto último, deu entrada no Conselho Nacional de Justiça, protocolada sob o número 12.636, representação firmada por advogado, na qual, tendo como fato justificador a repercussão negativa causada pela ausência de ministro do STF para participar de mera festividade social ocorrida no Exterior, quiçá com despesas pagas por advogado (clique aqui) que, notoriamente, frequenta a Suprema Corte no interesse de sua clientela, era sugerido que aquele E. Conselho "editasse providências com vistas à preservação do respeito devido ao art. 37 da Constituição Federal". Citou-se então o contido no acórdão da Suprema Corte, proferido na ADC 12/DF, sendo relator o pranteado ministro Menezes Direito, no sentido de que, "dentro das atribuições do Conselho Nacional de Justiça está a de preservar os princípios que estão presentes no caput do art. 37 da Constituição. E um desses princípios é aquele relativo à moralidade".

No corpo da representação, aludiu-se ao conhecido discurso proferido pelo ministro Carlos Maximiliano quando se despediu do E. Supremo Tribunal Federal (clique aqui) onde ele, com toda franqueza, confessa: "O constante receio de aparecer em público em desacordo com as exigências do cargo pesa sobre mim como um rochedo: ao penetrar, por tolerância e com os meus em grill rooms de cassinos em réveillons espalhados por todo o mundo, eu, embora jamais indigitado como baluarte contra as atrações do pecado, experimento algo do constrangimento do seminarista que, por maldosos companheiros convidados para uma tertúlia de família, de súbito sofresse o envolvimento traiçoeiro da ruidosa alegria de venustas beldades livres de compromissos e opulentas de audácia".

"Cabe, portanto, a esse E. Conselho definir se tal comportamento, que, como se vê do noticiário, a muito se afigura absolutamente insólito, afeiçoa-se ou não aos princípios deontológicos previstos no mencionado art. 37 da Magna Carta" concluía a representação.

A secretaria do CNJ, entretanto, com apoio na Portaria n° CNJ/52, de 20 de abril de 2010, "decidiu" devolver a representação ao signatário, esquecida de que, ao dar-se por incompetente, a "autoridade judiciária" deve, por amor à instrumentalidade do processo, enviar a peça à autoridade que reputa competente. É o que diz o art. 122 da lei n° 5.869/73. Conhece?

Ou seja, delegou-se a um mero funcionário de secretaria a competência para "indeferir liminarmente" uma representação que menos não pretendia do que chamar a atenção daquele Conselho para um fato notório apto a desmoralizar o Judiciário, donde o cabimento do contido no art. 19, II, de seu Regimento Interno, que lhe atribui o poder de "zelar pela observância do art. 37 da Constituição Federal e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário".

Em derradeiro caso, era de remeter-se a representação à Suprema Corte, para que ela definisse a quem incumbe fiscalizar os fiscais, coisa que a secretaria deixou de fazer.

Fica no ar uma pergunta: quem apuraria a veracidade de uma notícia dizendo que um desses ministros é proprietário de prostíbulo, como ocorre alhures (clique aqui)?