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Desnecessidade de intimação do revel na fase de conhecimento e necessidade da sua intimação no cumprimento de sentença

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Atualizado às 07:49

O art. 346, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), estabelece que "os prazos contra o revel que não tenha patrono nos autos fluirão da data de publicação do ato decisório no órgão oficial".

Assim, se o réu for citado regularmente e não contestar a ação, ele será considerado revel, nos termos do art. 344, do CPC/2015, sendo que não haverá necessidade de intimá-lo dos atos processuais subsequentes que forem praticados durante a fase de conhecimento, conforme o já mencionado art. 346, do mesmo diploma legal.

A regra acima mencionada, aparentemente, conflita com a regra do art. 513, § 2º, inciso II, do CPC/2015, que prescreve, para a fase de cumprimento de sentença, que "o devedor será intimado para cumprir a sentença (...) por carta com aviso de recebimento, quando representado pela Defensoria Pública ou quando não tiver procurador constituído nos autos", salvo na hipótese de o réu ter sido citado por edital para o processo de conhecimento.

Em outras palavras, apesar de o art. 346 determinar que o réu revel não precisa ser intimado dos atos processuais, o art. 513, § 2º, inciso II, do CPC/2015, preceitua que no início do cumprimento de sentença o réu revel (exceto o que foi citado por edital) deve ser intimado para cumprimento da decisão judicial por meio de carta com aviso de recebimento.

Diante disso, pergunta-se: o que deve prevalecer? A interpretação literal do art. 346, do CPC/2015, para todo o processo de conhecimento, inclusive para a fase de cumprimento de sentença? Ou, a interpretação que leva em consideração o inciso II do § 2º do art. 513 do mesmo diploma legal, no sentido de que, na fase de conhecimento não há necessidade de intimação mas, para o início da fase de cumprimento de sentença, é necessário intimar o réu revel que não foi citado por edital pessoalmente pelo correio por meio de carta com aviso de recebimento?

Note-se que as perguntas acima formuladas são bastante pertinentes pois, na vigência do CPC/1973, o art. 322, com a redação dada pela lei 11.280/06, tinha a seguinte redação:

"Art. 322. Contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da publicação de cada ato decisório.

Parágrafo único. O revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar".

Portanto, na vigência do Código de Processo Civil de 193, o Superior Tribunal de Justiça manifestou-se no sentido de que seria dispensada a intimação do réu para a fase de cumprimento de sentença. Confira-se, a propósito, a ementa:

"RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO E PROCESSO CIVIL.CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. RÉU REVEL, CITADO PESSOALMENTE NA AÇÃO DE CONHECIMENTO, QUE NÃO CONSTITUIU ADVOGADO NOS AUTOS NEM APRESENTOU CONTESTAÇÃO. LEI Nº 11.232/05. INTIMAÇÃO PESSOAL. DESNECESSIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 322 DO CPC.

1. O artigo 535 do Código de Processo Civil não resta malferido quando o acórdão recorrido utiliza fundamentação suficiente para solucionar a controvérsia, sem incorrer em omissão, contradição ou obscuridade.

2. Nos termos do art. 322 do Código de Processo Civil, será dispensado da intimação dos atos processuais o réu revel que não constituiu advogado nos autos.

3. Após a edição da Lei nº 11.232/2005, a execução por quantia fundada em título judicial desenvolve-se no mesmo processo em que o direito subjetivo foi certificado, de forma que a revelia decretada na fase anterior, ante a inércia do réu que fora citado pessoalmente, dispensará a intimação pessoal do devedor para dar cumprimento à sentença.

4. Recurso especial improvido.

(REsp 1241749/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 13/10/2011, grifos nossos)".

Contudo, com a entrada em vigor do CPC/2015, foi expressamente inserido no diploma processual o já mencionado inciso II do parágrafo segundo do art. 513, que categoricamente determina que o devedor será intimado para cumprir a sentença por carta com aviso de recebimento quando não tiver procurador constituído nos autos. Tal disposição pertence ao CPC/2015 e não encontra correspondente no CPC/1973.

Portanto, atualmente, ainda que o réu tenha sido citado pessoalmente para o processo de conhecimento, não tenha apresentado defesa e seja considerado revel, ele deve ser intimado pessoalmente por carta com aviso de recebimento (por não ter procurador constituído nos autos) para o início da fase de cumprimento de sentença.

Nesse sentido foi a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça proferida em 02 de junho de 2020. Veja-se, a propósito, a ementa do acórdão:

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REVELIA NA FASE COGNITIVA. AUSÊNCIA DE ADVOGADO CONSTITUÍDO. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DOS DEVEDORES POR CARTA PARA O CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. REGRA ESPECÍFICA DO CPC DE 2015. REGISTROS DOUTRINÁRIOS.

1. Controvérsia em torno da necessidade de intimação pessoal dos devedores no momento do cumprimento de sentença prolatada em processo em que os réus, citados pessoalmente, permaneceram revéis.

2. Em regra, intimação para cumprimento da sentença, consoante o CPC/2015, realiza-se na pessoa do advogado do devedor (art. 513, § 2.º, inciso I, do CPC/2015) 3. Em se tratando de parte sem procurador constituído, aí incluindo-se o revel que tenha sido pessoalmente intimado, quedando-se inerte, o inciso II do §2º do art. 513 do CPC fora claro ao reconhecer que a intimação do devedor para cumprir a sentença ocorrerá "por carta com aviso de recebimento".

4. Pouco espaço deixou a nova lei processual para outra interpretação, pois ressalvara, apenas, a hipótese em que o revel fora citado fictamente, exigindo, ainda assim, em relação a este nova intimação para o cumprimento da sentença, em que pese na via do edital.

5. Correto, assim, o acórdão recorrido em afastar nesta hipótese a incidência do quanto prescreve o art. 346 do CPC.

6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

(REsp 1760914/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/06/2020, DJe 08/06/2020, grifos nossos)".

A interpretação dada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça ao art. 513, § 2º, inciso II, do CPC/2015 está em harmonia com o Princípio do Contraditório consagrado pelo art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal e extremamente valorizado pelo diploma processual em vigor, como se percebe da simples leitura 7º, 9º e 10, entre outros. Assim, a decisão da Corte Superior acima referida é digna de aplausos e absolutamente correta.