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Quem anda a 200 km/h na Autobahn tem que ter atenção redobrada

terça-feira, 23 de julho de 2019

Atualizado em 22 de julho de 2019 15:24

Quem anda a 200 km/h na Autobahn tem que ter atenção redobrada, disse o OLG Nürnberg

Andar sem limite de velocidade nas autoestradas alemãs, as famosas Autobahns1, é um sonho para muitos motoristas. Principalmente se for a bordo de um Mercedes Benz. Mas esse privilégio pode sair caro, como mostra uma recente decisão do Tribunal de Justiça de Nurembergue, de 25/5/2019.

Em 2015, um motorista resolveu alugar um Mercedes Bens para viajar da pequena cidade de Erlangen, na Bavária, para Berlim. Ele fechou com a locadora um contrato de locação e de seguro, que o liberava do pagamento de qualquer franquia em caso de dano.

No contrato, também estava autorizado a pilotar o veículo uma outra pessoa, que acabou provocando o acidente ao manusear o sistema de navegação do carro enquanto dirigia a uma velocidade de 200 km/h na Autobahn.

Em seu depoimento, o motorista afirmou que estava vendo informações acerca da quilometragem e do tempo que ainda faltavam até o destino final, bem como verificando a distância até o próximo posto de gasolina.

Durante o uso do sistema de navegação, ele segurou o volante com a mão esquerda, mas perdeu o controle do carro, chocando-se com a grade divisória entre as pistas da autoestrada, danificando consideravelmente o automóvel.

A locadora processou não apenas o locatário, mas também o motorista, causador do acidente, acusando-o de ter agido com culpa grosseira ao dirigir a 200 km/h na Autobahn manuseando o sistema de navegação do carro.

No contrato de locação havia uma cláusula, inserida nas condições gerais, que reduzia a responsabilidade da locadora no caso de o dano ao veículo ser decorrente de culpa grosseira do condutor.

E, para a seguradora, o motorista, enquanto pessoa autorizada a dirigir o carro, estava incluído na eficácia de proteção da cláusula restritiva de responsabilidade, tal como o próprio locatário.

A locadora requereu, então, que os réus fossem condenados ao pagamento de metade dos danos sofridos em razão do comportamento gravemente culposo do causador do acidente.

Em defesa, os réus alegaram a abusividade da cláusula, inserida nas condições contratuais gerais, que permitia à locadora responsabilizar o condutor do veículo com base na gravidade de sua culpa. Segundo o motorista, ele dirigia apenas a 130 km/h na hora do acidente, não se podendo falar em culpa grosseira de sua parte.

Eles ganharam em primeira instância, mas o OLG Nürnberg reformulou a sentença do juízo de Nürnberg-Fürth, condenando o motorista imprudente a pagar à locadora a soma de 11.947,69 euros, mais juros, além de condená-lo ao pagamento de 31% das custas processuais.

Para a Corte, a responsabilidade do condutor baseia-se no § 823, inc. 1 do BGB (responsabilidade extracontratual), porque ele violou culposamente a propriedade da locadora. E essa responsabilidade não pode ser afastada pelo contrato entre a locadora e o locatário do carro. Em relação a esse pacto, o Tribunal afirmou inexistir abusividade na cláusula que prevê a redução da responsabilidade da seguradora em função da culpa grave do motorista.

Segundo o Tribunal, no caso concreto, o condutor do veículo teria agido culposamente ainda que estivesse andando a uma velocidade de 130 km/h, pois, concomitantemente, usava o sistema de navegação do veiculo.

A culpa grosseira, diz o acórdão, exige que a violação do dever seja subjetiva e objetivamente grave, de modo a ultrapassar consideravelmente a medida padrão da culpa, prevista no § 276, inc. 2 do BGB.

O cuidado exigido no trânsito precisa ser infringido de forma extraordinária, deixando o causador do dano de observar grosseiramente aquilo que qualquer um teria observado naquela situação.

Quem anda em autoestrada nessa velocidade (comprovada de 200 km/h) cria um alto risco potencial de dano não só para si próprio, mas também para os outros.

Não por outra razão, em todos os países do mundo a alta velocidade em autoestradas é proibida - exceto na Alemanha, sublinhou criticamente o Tribunal, acentuando que no exterior o comum é a velocidade máxima girar em torno de 130 km/h, quando não inferior.

A perícia apontou que quando o motorista, a 200 km/h, tem uma distração de apenas três segundos (ao mexer no sistema de navegação, por exemplo), o carro anda, no mínimo, um trecho de 167 metros sem que o condutor tenha qualquer visão sobre a pista, dificultando enormemente qualquer reação.

E no caso concreto, o motorista mexeu por mais de três segundos no "navi" com o carro em alta velocidade, o que fez com o veículo desviasse, chocando-se com a mureta de proteção entre as pistas, caracterizando culpa grave.

O Tribunal ressaltou, portanto, que quem anda acima de 130 km/h tem que se concentrar bastante na direção. E ainda quando o condutor desvie rapidamente o olhar da pista para o sistema de navegação, isso pode configurar culpa grave, legitimadora do dever de indenizar, como previa o contrato celebrado.

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1 Autobahn é substantivo feminino, cujo plural é Autobahnen. Pede-se aqui, contudo, licença ao leitor para, "abrasileirando" o termo, formar o plural com o acréscimo do "s" com o fim exclusivo de facilitar a compreensão aos leitores não familiarizados com o idioma de Goethe.