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A Liberdade Religiosa nos Estados Modernos

quinta-feira, 2 de março de 2017

Atualizado às 07:38



Editora:
Almedina Brasil
Autora: Heloísa Sanches Querino Chehoud
Páginas: 145



A separação entre Estado e religião é construção do liberalismo, corrente de pensamento que ganhou forças sobretudo na Inglaterra do século XVIII, calcada no racionalismo, na liberdade individual, na autodeterminação do indivíduo, e fruto de intensa e longa luta contra o absolutismo. Para o pensamento liberal, o relacionamento do ser humano com seu Deus é "atitude que só a ele diz respeito". Em outras palavras, um assunto exclusivamente privado.

Vem daí o incômodo contemporâneo, mote da pergunta científica condutora da obra: voltar a permitir que o Estado invada a seara religiosa é ceder espaço na batalha contra o autoritarismo, o totalitarismo? Significa abrir mão de liberdades conquistadas?

Mais uma vez na História, a complexidade da realidade impõe ao jurista uma reanálise do tema. Enumerando diversas ocorrências recentes em que a crença de um grupo de indivíduos pode levar à ameaça de outros direitos fundamentais da coletividade, a autora descortina o drama de se ter que revisar um princípio tão caro à sociedade moderna. No percurso desenvolvido, merece destaque a delicadeza do registro do fenômeno religioso como inerente à humanidade, reflexo da percepção com a própria mortalidade.

Em texto fluido, descomplicado, a autora começa por lembrar que a liberdade religiosa "integra o catálogo de direitos fundamentais", e possui estreitos vínculos com a dignidade da pessoa humana. Pode ser classificada como liberdade pública, porque, em suas ótimas palavras, "implica garantir ao cidadão uma área de atuação livre, que se deve manter isenta da intromissão estatal". Para tanto, traça substancioso panorama histórico do surgimento e consolidação do princípio.

No contraponto necessário, e valendo-se de boas lições doutrinárias, ressalva que isso "não significa, entretanto, que o Estado laico tenha que tolerar quaisquer práticas ou atividades no interior das organizações religiosas". Haverá hipóteses, adverte, em que deverá agir a fim de garantir outros direitos fundamentais, caso da segurança pública e até mesmo da vida. Por mais relevantes que sejam, os direitos fundamentais não são absolutos, devendo manter relação harmônica entre si, e "limitar-se reciprocamente, diante de um fato concreto que o exija".

A obra discorre sobre as várias dimensões da liberdade religiosa, desdobrando-a em liberdade de crença, de culto e de organização religiosa. Detém-se ainda na extensão às confissões religiosas dos mesmos direitos conferidos aos indivíduos, conferindo-lhes liberdade de organização e de autodeterminação. Chega, por fim, aos diplomas legislativos e aos marcos históricos brasileiros.

Servem de conclusão as lições de Bandeira de Mello, para quem o constitucionalismo do século XX é marcado pela superação da perspectiva do liberalismo individualista, considerando o indivíduo "para além de sua dimensão unitária, defendendo-o também em sua condição comunitária (...)". Na síntese perfeita trazida pela autora, o momento é de insuficiência do absenteísmo estatal para a garantia dos próprios interesses individuais e coletivos.

Sobre a autora :

Heloísa Sanches Querino Chehoud é mestre em Direito Internacional Empresarial e Financeiro pela Universidade de Zurich (magna cum laude); mestre em Direito Constitucional pela PUC/SP, onde também se graduou em Direito. Ex-procuradora do Estado de São Paulo. Advogada.

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Ganhador :

  • Leonardo Lopes Garcia de Moraes, de Garça/SP