COLUNAS

Reformas radicais já!

terça-feira, 15 de março de 2005

Atualizado em 14 de março de 2005 14:47

Francisco Petros*


Reformas radicais já!


Não resta dúvida de que nenhum processo de reformas é fácil. Seja no Brasil, seja em qualquer lugar. Os interesses acomodados durante longos períodos nos quais não houve alterações no status quo atuam para que mudanças necessárias na condução de políticas econômicas e sociais acabem por não acontecer. Ao menor sinal de que algo "novo" possa emergir surgem "grupos de poder" habilitados pela disponibilidade de recursos financeiros e humanos que impedem que a sociedade se mobilize e, desta forma, o "estado das coisas mude".

Os exemplos são muitos. No momento, temos as discussões sobre as reformas da previdência pública nos EUA. Possivelmente veremos alterações importantes na estrutura previdenciária da maior nação do mundo. Simultaneamente, é provável que a essência destas mudanças sejam mitigadas por interesses de curto prazo. O mesmo ocorre na Europa onde países como a Itália, França e Alemanha não conseguem reformar o Estado, apesar dos crescentes riscos fiscais que colocam em risco o Pacto de Estabilidade Fiscal, estabelecido desde o lançamento do euro como moeda única dos principais países do Velho Continente. A "vantagem" destas nações desenvolvidas é que o "custo da inércia" é substancialmente menor quando comparamos com nações subdesenvolvidas ou em desenvolvimento. Nestas últimas, a ausência de reformas é muito mais grave, pois impede que haja avanço substantivo do processo capitalista. Se no primeiro mundo, são os interesses dos cidadãos que impedem os avanços, nos países subdesenvolvidos é a cidadania que não é alcançada. Um custo muito diferente e elevado.

No caso do Brasil, a aceitação passiva da situação vigente é notória. País de imensos recursos naturais e humanos, no Brasil reina uma complacência impressionante diante da ausência de progresso econômico, social e político. A reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social entre empresários e membros do governo, ocorrida na última quinta-feira (10/3/05) espelha com fidelidade este quadro. O que se ouviu nesta reunião é de forma inconteste simbólica da passividade do governo e da sociedade. Vejamos.

José Dirceu, Ministro-chefe da Casa Civil disse que "É fato, sim, que aumentamos os gastos com pessoal, mas porque era uma demanda da modernização do crescimento do país. E não no sentido que se dá muitas vezes, de que estamos desperdiçando recursos". Ora, alguém poderia perguntar: por que não empreender uma reengenharia da estrutura de recursos humanos alocadas no Estado? Ou será que estamos presenciando uma reforma profunda dos serviços fornecidos pelo Estado para os seus cidadãos?

O "príncipe" Antônio Palocci Filho, a encarnação atual e cabocla de Metternich, o articulador do Congresso de Viena em 1814, fez o seguinte pronunciamento: "O ideal para todos nós seria reduzir a carga tributária, mas não há espaço tendo em vista os projetos sociais e os compromissos fiscais do governo". O fraseado e o conteúdo do pronunciamento do Ministro da Fazenda expressam que não há nada de novo para acontecer no âmbito da tributação. Será que alguém em sã consciência pode considerar o sistema tributário brasileiro minimamente razoável? É possível que seja desenvolvido um espírito empreendedor no Brasil com este sistema tributário? São os "projetos sociais" e a área fiscal do governo tão eficientes que possam justificar que mais de 35% do PIB seja destinado aos impostos? Será que a política monetária do Banco Central está no "estado da arte" a ponto que não possamos sequer analisar os seus terríveis efeitos fiscais?

Uma sociedade tão desigual como a brasileira requereria um processo de contínuo reformismo, profundo e efetivo. Ao invés disso o que temos? Uma manutenção do "estado das coisas". Como se fosse uma espécie de Lei da Gravidade, há esperança no governo de que candidamente cheguemos à modernidade a partir de uma "serena" política econômica e social. Enquanto isso, os empresários vêem-se constrangidos pela crescente informalidade dos negócios, projetos de investimento são adiados e a contratação formal de mão-de-obra permanece restrita a uma parcela menor da economia. Do lado social, a saúde pública, a segurança do cidadão, o andamento das tarefas das diversas esferas do Estado, etc. continuam sofríveis. Tristemente sofríveis.

Exceto pela preservação integral dos princípios democráticos, as reformas no Brasil deveriam ter um caráter radical. O governo deveria ser ardoroso na busca de mudanças construtivas e substantivas no funcionamento do Estado. Reformas de caráter capitalista, pelas quais fossem aguçados os valores mais profundos da cidadania: (i) o respeito irrestrito à Lei, (ii) a efetiva participação no sistema econômico do cidadão, do consumidor e do empreendedor e (iii) o acesso à educação de qualidade que aumente a mobilidade social.

Trata-se de um caminho essencial a ser trilhado. É provável que seja um projeto além das fronteiras temporais de um mandato presidencial. O que vemos é o medo de "radicalizar" tendo em vista os temores de não se reeleger. É necessário que se mobilize a sociedade para tirá-la do imobilismo atual que dá uma sensação de estabilidade, mas que potencializa as instabilidades potenciais: a violência, a desesperança, a injustiça social e a ausência de sustentação do crescimento econômico.

Por enquanto, estamos a fingir que as coisas mudam. Tudo permanece igual. E se vierem mudanças é possível que sejam para pior. Este é o custo da passividade.

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* Economista e pós-graduado em Finanças. Foi Vice-Presidente e Presidente (1999-2002) da APIMEC - Associação Brasileira dos Analistas e Profissionais do Mercado de Capitais (São Paulo).







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