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Política & Economia NA REAL n° 190

terça-feira, 20 de março de 2012

Atualizado em 19 de março de 2012 13:24

O pior já passou ? (I)

O título desta nota é uma das perguntas mais repetidas em tempos de crise, especialmente quando se trata de uma crise de proporções equivalentes à de 1929. Há quem seja capaz de dar uma resposta clara em meio ao cenário obscuro que se desfralda perante os olhos do analista. De nossa parte, preferimos repisar alguns aspectos já abordados difusamente nos últimos meses. Vejamos :

1. A crise de crédito iniciada em meados do terceiro trimestre de 2008 ainda produzirá efeitos por mais alguns anos. Um montante enorme de capital foi "queimado", o que reduz a capacidade do sistema financeiro privado financiar o consumo e o investimento;

2. A perda de capital do sistema financeiro privado se transformou numa crise fiscal de Estados de vez que recursos públicos foram utilizados para resgatar, mesmo que imperfeitamente, o sistema privado. Assim...

3. A capacidade de consumo e investimento público também estão limitados, o que limita a criação de emprego via dispêndios públicos;

4. As taxa de desemprego das economias centrais devem permanecer elevadas por alguns anos, até que a produtividade (mais produção com o mesmo quantum de fatores de produção) cresça. O efeito é que o consumo está estagnado;

5. Faltam lideranças políticas capazes de mudar as expectativas dos agentes e, com efeito, alterar a debilitada confiança de consumidores e investidores;

6. Não houve alteração significativa na forma de operar dos mercados. Os reguladores não conseguiram alterar politicamente e de forma significativa os riscos sistêmicos relacionados à má alocação de recursos, sobretudo no que tange à especulação;

7. O preço do petróleo, bem acima de US$ 100/barril, retira ainda mais o poder de compra dos consumidores dos países centrais.

O pior já passou ? (II)

Em larga medida os fatores de risco acima mencionados continuam presentes no cenário mundial e estão ainda a espalhar seus efeitos, desta feita sobre os países menos desenvolvidos (ou emergentes) dentre os quais o Brasil, a China e a Índia. Estes últimos começam a dar sinais de que vão crescer menos do que se projetava há poucos meses, sobretudo a China, que ainda cresce muito, mas bem menos (para os padrões chineses) quando se analisam os últimos trimestres em relação aos imediatamente anteriores. Paradoxalmente, é possível, e até mesmo provável, que os ativos reais e financeiros dos países mais implicados com a crise se valorizem. Isso se deve não propriamente em função de uma mudança estrutural nos frágeis fundamentos, mas em função da queda do risco espelhado na volatilidade dos mercados. Cai o risco, sobem os preços. É este fenômeno que estamos a identificar nos diversos segmentos do mercado acionário norte-americano, especialmente o de empresas tecnológicas (NASDAQ). No caso dos EUA, há tênues sinais de recuperação, mesmo que não sejam ainda seguramente promissores. Assim sendo, a nossa melhor visão indica que se esta calmaria atual permanecer mais algum tempo, o valor dos ativos vai subir ainda mais. Não é o caso de se desprezar os significativos riscos. Todavia, não é o caso de majorá-los.

O pior já passou ? (III)

Na opinião da diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, já está passando sim. Embora alertando que há ainda muito o que fazer, ela percebe "os mercados financeiros estão mais calmos e os indicadores recentes sugerem um pequeno ímpeto na atividade econômica, basicamente nos Estados Unidos" e que "existem sinais de que as fortes ações de política econômica - especialmente na Europa - estão fazendo a diferença".

O BC : mais transparente e menos soberano

O anúncio da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária do BC deixou ao mercado o entendimento de que a taxa básica de juros cai para o patamar de 9% e por aí fica por um bom tempo. Há quem critique o BC por esta linguagem "surpreendente". A nosso ver não há propriamente uma "surpresa". A mudança da linguagem da autoridade monetária, mais transparente e previsível, chega em boa hora. O futuro não é tão opaco desde 1929 e os BCs de todo o mundo têm procurado demonstrar que estão mais ocupados com a recessão que com a inflação. Para isto tem inovado na linguagem abandonando as frases mais tradicionais de seus informes. O Brasil segue esta linha e está correto. O que nos parece mais preocupante é que esta positiva mudança vem acompanhada por uma desconfiança crescente de que a soberania operacional do BC está mais reduzida. O governo parece interessado em dar as cartas na política monetária e isto não é institucionalmente interessante, sobretudo quando os problemas estruturais da economia brasileira estão se multiplicando e contaminando as expectativas dos agentes ansiosos por investir. O governo precisa mostrar que está operando para minorar os riscos macro e microeconômicos da economia brasileira, sem retirar da autoridade monetária a necessária soberania operacional para agir em favor do real. A bola esta com o Planalto e não com o BC.

E a caderneta de poupança ?

Ou o governo propõe uma mudança em relação à remuneração da caderneta de poupança ou a política monetária do BC ficará limitada no que se refere à redução dos juros. Dificilmente isto ocorrerá nestes meses pré-eleição, mas esta questão é urgente e necessária.

O rumo do câmbio

É certo que o governo tem um "arsenal" para tentar controlar a valorizada taxa de câmbio. Isto não significa que as medidas combinadas com vistas a este objetivo vão funcionar bem, sobretudo porque os efeitos são bem elásticos, seja sobre o mercado financeiro, seja sobre a economia real. O maior risco de todos, a nosso ver, é que uma queda mais forte dos preços das commodities possa desvalorizar mais velozmente o real. Neste caso, podemos ter o recrudescimento da inflação e os consequentes efeitos sobre a taxa de juros. E o tal do "arsenal" pode ser inútil e o BC talvez tenha de mudar sua postura de acomodação monetária mais rapidamente. É lógico que estamos falando de uma hipótese ainda não muito visível, mas o governo deveria examinar esta possibilidade para fins de estabelecer políticas macroeconômicas que evitem riscos exacerbados.

A gerente e o seu perfil político

Ao que parece a presidente gostaria de projetar para o seu imenso eleitorado a imagem de "gerente" em detrimento da de "líder política". O noticiário carregado de informações que dão conta de atrasos significativos no cronograma de obras indica que o perfil tecnocrático pretendido pelos viventes palacianos de Brasília está distorcido e pode contaminar o eleitorado mais à frente. Como as coisas não vão bem também na arena política, há perda de identidade por parte da presidente. Apesar disso, Dilma goza de invejável taxa de aprovação popular por conta do "bom desempenho econômico". O fato é que a taxa de emprego está menos exuberante e os ganhos de renda andam caindo. A paciência popular pode tomar o sentido contrário e resvalar na popularidade presidencial. O governo talvez esteja exagerando na crença de que são imbatíveis. Mas enquanto o amparo popular bafejar a presidente, a rebeldia de seus aliados - entre os rebeldes inclua-se parte do PT - será limitada.

Dilma em seus labirintos

Segundo tese que as fontes oficiais fazem questão de alimentar, a mais recente crise política que Dilma está enfrentando com seus parceiros é uma "crise da política" (ou dos partidos), sem maiores consequências. Coisa de estômagos ávidos e mau atendidos. Não é bem assim, porém, no mundo real, embora a dose de fisiologismo esteja na origem das rebeliões contra a presidente. Tudo isso gera prejuízos sim, imediatos e de longo prazo :

1. A necessidade de nomear gente não qualificada para cargos no Executivo e de manter ministérios e órgãos e secretarias inúteis torna o governo mais ineficiente ainda do que qualquer governo normalmente já é e encarece seu custo para a sociedade.

2. Por causa desses desarranjos, o governo já desistiu de levar adiante qualquer uma das reformas estruturais que dariam mais segurança à economia nacional. A reforma tributária se restringirá, se ocorrer, apenas ao fim da guerra do ICMS entre os Estados; a reforma política dorme em berço esplêndido; a previdenciária vai se resumir à criação do fundo de aposentadoria dos servidores federais; a trabalhista e sindical a presidente acaba de descartar em conversa semana passada com líderes sindicais. E assim por diante.

3. A ANTT já está parada, por falta de quorum em sua diretoria para tomar decisões colegiadas.

4. Dificilmente será votado antes de julho o Código Florestal.

5. As novas regras de distribuição dos royalties do petróleo continuam suspensas, com prejuízos para os Estados e municípios que reivindicam parte desses recursos e atrasos na licitação de novas áreas para exploração.

O fisiologismo e a articulação política, ao contrário do senso comum, tem um custo elevadíssimo, não são para serem tratadas como "coisas da politiquinha".

Não é dela apenas

A crise que Dilma vem enfrentado praticamente desde que tomou posse, em intervalos cada vez menores entre um episódio e outro, não é uma crise do governo Dilma somente, embora a situação se agrave pelo estilo da presidente. É uma crise do "sistema político" de partilha do poder com um carrilhão de partidos. A presidente pode até mudar isso. O problema é que...

...Dilma é de choque

Dilma parece não admitir ser contrariada. Lula também não. Que o diga o senador Eduardo Suplicy, no index lulista desde que ousou disputar as prévias presenciais petistas com o ex-presidente em 2002. Só que Lula tinha jogo de cintura elástico, sabia como poucos usar o bambolê da política. Como se diz popularmente, fazia com a arte do limão uma limonada. Dilma até agora só mostrou que é capaz de fazer da limonada um limão. Carrega ressentimentos e os expõe, às vezes com truculência, como se deu agora na demissão dos líderes. Mantém ministros sob permanente tensão, com cenas de humilhação diante de terceiros. Está colhendo os azedumes que espalha.

Líderes sem liderança ?

Eduardo Braga (Senado) e Arlindo Chinaglia (Câmara) vão ter de esforçar muito para confirmarem na prática a liderança que Dilma lhes entregou. Nenhum dos dois é conhecido por sua habilidade política, ambos costumam ser ásperos e ríspidos, ao contrário de seus antecessores, Romero Jucá e Cândido Vaccarezza. Mas Dilma não levou para casa o desaforo da derrota de Bernardo Figueiredo (ANTT) no Senado nem as conversas de Vaccarezza com os ruralistas para tentar mudar o texto do Código Florestal aprovado pelo Senado. Deu o rompante e até terá de segurar a ventania. Ontem, segunda-feira, ela já se meteu diretamente nas negociações para a aprovação da Lei Geral da Copa, ação que até agora evitava fazer. Vai ter se se meter cada vez mais.

Em fogo brando

Piora a situação o fato de a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, por culpa de seu estilo não raras vezes grosseiro, não estar mais nas graças de seus liderados. Ideli está sendo cozinhada em banho-maria por gente de diferentes partidos. Se não mudar, o óleo pode ferver e vai ser outra enxaqueca para Dilma.

Eduardo tropeça

Não foi muito feliz do senador Eduardo Braga em algumas de suas primeiras declarações como novo líder do governo no Senado, ao dizer coisas como, por exemplo, "a política do 'toma lá, dá cá' está no passado" e "os partidos terão direito de indicar, mas dentro de um novo contexto". Primeiro, é confessar que esta prática era normal, o que a presidente sempre fez questão de negar. Segundo, porque vai irritar os parceiros, que também detestam se apontados publicamente como fisiológicos. E terceiro, porque não é real : um governo que acaba de nomear o senador Marcelo Crivella para o inútil ministério da Pesca e se prepara para recolocar o PDT no ministério do Trabalho única e exclusivamente para adular aliados, não está mudando nada. E os aliados tanto sabem disso que vão continuar chiando e levando. O novo slogan do franciscanismo político pode até ser este : "É chiando (ou chantageando) que se recebe".

Este sabe o certo

Veja-se o PMDB nesta história : está amuado, mas ficou quietinho, pois sabe que as mudanças vieram para tudo permanecer como está. O PMDB teme mesmo é que tentem lhe "roubar" a presidência da Câmara (e até a do Senado) em 2013 e a vice-presidência da República em 2014.

Troco na agulha

Para lembrar a presidente Dilma de que ele existe, é forte e merece ser bem tratado, o PMDB já prepara uma armadilha para o Palácio do Planalto : escolhido por Renan Calheiros para relatar o Orçamento da União de 2013 no mesmo dia em que foi escorraçado a liderança do governo no Senado, Romero Jucá estuda a possibilidade de tornar as normas do orçamento impositivas e não apenas autorizativas. Hoje, pela lei, o governo é "autorizado" a gastar tanto em tais lugares. Não está obrigado. Se o Orçamento virar impositivo, ele terá de cumpri-lo rigorosamente. Uma camisa de força para a gestão da economia. E um possível desastre pela forma pouco séria como o Congresso trata do assunto. Mas o PMDB sabe como pouco criar o perigo para depois salvar a "mocinha".

Haddad na UTI

Lula não terá muito tempo de sossego quando for liberado pelos médicos até o fim desse mês. A candidatura do ex-ministro Fernando Haddad à prefeitura de SP inspira sérios cuidados. E somente Lula, com muito esforço, pode tirá-la da UTI. Baixou o desânimo em uma parte dos petistas. E há petistas com indisfarçável sorriso de vingança, com cara de "eu não avisei". Para mal de todos os pecados do ex-ministro, seu substituto na Educação, Aloizio Mercadante, sem querer ou querendo, está "desconstruindo" sua gestão aos poucos.

Depois é que serão elas

Tudo indica que Serra levará as prévias do PSDB paulistano neste domingo, contra os seus dois contendores na disputa, o deputado Ricardo Trípoli e o secretário estadual José Aníbal. Mas o processo todo, até pela ação tortuosa de Serra, deixará sequelas. E Serra nunca foi bom aparador de arestas. Pelo contrário.

Radar NA REAL

16/3/12 TENDÊNCIA
SEGMENTO Cotação Curto prazo Médio Prazo
Juros ¹
- Pré-fixados NA estável estável/alta
- Pós-Fixados NA baixa baixa
Câmbio ²
- EURO 1,3243 baixa baixa
- REAL 1,8081 estável/baixa estável/baixa
Mercado Acionário
- Ibovespa 67.684,13 estável/alta estável
- S&P 500 1.404,17 estável/alta alta
- NASDAQ 3.055,60 estável/alta alta

(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável

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