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Política & Economia NA REAL n° 4

terça-feira, 10 de junho de 2008

Atualizado às 07:50

 

Cenário piorado I

Claramente nos últimos dias tivemos um aumento das complicações no cenário econômico mundial. Vejamos. Do lado europeu, as declarações, na semana passada, do presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, de que a autoridade monetária está "em estado de alerta" em relação à inflação. Provavelmente, teremos uma rodada bem mais longa de aperto monetário. A inflação no Velho Continente gravita ao redor de 2,4%, nível acima da meta de inflação de 2,3%. Há claros sinais que a indesejada composição entre inflação e recessão está mais próxima nos 15 países que adotam o Euro como moeda que nos EUA.

A Inglaterra que não utiliza o Euro como moeda viu a sua taxa de juros básica ser mantida no patamar de 5% ao ano pelo seu Banco Central, e as preocupações em relação à inflação estão mais moderadas. Mas a atividade econômica começa a cair mais rapidamente. Há, inclusive, expectativas de que a taxa de juros básica possa cair para algo como 4,5% ao ano ainda neste ano em função da redução mais aguda do consumo. Tudo aponta para uma piora mais acentuada do cenário e as expectativas neste sentido estão piorando sensivelmente.

Cenário piorado II

Nos EUA as coisas estão bem piores que há pouco tempo, e há cada vez menor espaço para as autoridades agirem no curto prazo. Tudo ficará para o médio prazo ao que parece. O custo da alta das matérias-primas e do petróleo está afetando cada vez mais o consumo. Com efeito : sobe a inflação, cai o emprego, cai a renda e, assim, forma-se um perigoso círculo vicioso. Para combater a queda da atividade o Congresso norte-americano formulou ao final do primeiro trimestre um pacote de estímulo ao consumo de US$ 100 bilhões. Esta medida foi totalmente neutralizada pela alta dos combustíveis. Somente neste mês de junho a gasolina já aumentou 9% nos EUA. A taxa de inflação ao consumidor deve atingir algo como 0,5% este mês, apenas se considerarmos o efeito da alta dos combustíveis. A taxa de desemprego teve em maio o maior salto mensal dos últimos 22 anos e está aumentando há cinco meses consecutivos. As vendas de veículos em maio (14,3 milhões em termos "anualizados") caíram para o patamar mais baixo nos últimos 13 anos.

Diante deste cenário tudo se tornou parodoxal : estamos ao final de uma desastrosa administração Bush e pouco se sabe sobre o que o próximo presidente, seja McCain ou Obama, fará e em que condições encontrará a economia. Do lado do Federal Reserve há uma certa perplexidade em relação ao que priorizar - se a inflação galopante ou o desemprego em alta. Uma dúvida cruel como se pode ver.

Países emergentes em melhor posição

Não tenhamos ilusões sobre a possibilidade de que a posição dos países emergentes, sobretudo os BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), não seja afetada pela seqüência de choques que estão a produzir maior inflação e menor atividade nos países mais desenvolvidos. Somente os EUA representam 25% do PIB mundial e a redução de sua atividade não será compensada pelo desempenho chinês que, diga-se em alto e bom som, vive pendurado no consumo norte-americano. A manutenção dos preços das commodities em patamar elevado certamente é fator favorável para os países emergentes, pois é deste segmento que são extraídos os seus maiores ganhos, sobretudo externos. Contudo, o maior efeito do fator "commodities" (preços elevados das matérias-primas) é sobre a saúde do balanço de pagamento, seja pela atratividade por parte dos investidores internacionais por estes países num momento de fragilidade das maiores economias, seja pelos resultados mais positivos da balança comercial.

No caso do Brasil, o saldo comercial é declinante em função da (desastrosa) administração da política cambial. Nenhum outro país emergente relevante tem cometido erros tão gritantes neste item. O segmento mais arriscado no momento é o das ações : depois de valorizações seguidas nos últimos anos é possível e provável que o pior cenário externo venha a atingir com maior intensidade o preço das ações. A conferir.

O governo, a inflação e as limitações eleitorais

Não há dúvida de que o presidente Lula está preocupado com a escalada inflacionária, que já está correndo o mundo e ronda o Brasil. Ele sabe mais do que ninguém que mais do que o Bolsa-Família e outros programas sociais, seu maior capital eleitoral tem saído da melhoria do poder aquisitivo das populações de menor renda, o efeito mais positivo dos preços baixos. E é isto que está agora ameaçado, por razões internas e externas. A inflação dos alimentos para as famílias de renda de 1 a 2 salários mínimos nos 12 meses vencidos em maio está quase o dobro da inflação das famílias de mais de 2 até 30 SM. A longo prazo, é explosivo.

O governo, porém, para não ofender sua base eleitoral, bastante inquieta, e com temor também de aplicar uma dose forte demais de remédios anti-inflacionários e comprometer demais o bom crescimento da economia, está com receio de tomar medidas mais duras, além das ações do Banco Central na taxa de juros. Vacila claramente.

Um exemplo : a meta fiscal "oculta"

Começou a circular em Brasília, estava até em jornais de fim de semana, a informação, de fontes não reveladas, que o presidente Lula autorizou o Ministério da Fazenda a trabalhar com uma meta de superávit primário da 4,5% do PIB para este ano, mais próxima dos 5% sugeridos por alguns conselheiros econômicos paraoficiais do presidente.

Teríamos então três metas de superávit em 2008 : a oficial, de 3,8 do PIB ; extraoficial, de 4,3% (os tais 0,5% a mais do "cofrinho do Mantega) ; e a oculta - ou disfarçada, de 4,5%. A razão desse jogo de esconde-esconde : não assanhar (e irritar) os aliados, que poderiam pensar que o governo está com dinheiro sobrando para pagar juros e poderiam pedir mais gastos. Evita também que se alegue que s CSS não é necessária uma vez que há sobra no Orçamento para aumentar o superávit.

Não tem sentido, porém, fazer desse jeito. Além dos efeitos objetivos que um aumento do superávit terá sobre a escalada de preços, com resultados mais no médio prazo segundo muitos especialistas, um dos objetivos da medida é inverter as expectativas negativas dos agentes econômicos. Como bem disse o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, em entrevista n'O Globo deste domingo, "na economia, psicologia é fundamental". E como atuar sobre as expectativas com um superávit primário disfarçado e oculto ?

E não há muito o que esperar lá de fora com se poderá ver nas duas notas a seguir. Temos nós mesmos de fazer o nosso dever de casa.

A reforma tributária imaginária e o novo imposto real

O Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, tornou-se assim uma espécie de "caixeiro-viajante" da reforma tributária. Nessa condição, conversando com empresários, governadores, prefeitos e políticos, Appy está convicto de que as mudanças propostas pelo Palácio Planalto no sistema tributário brasileiro deverão estar aprovadas até o fim do ano. Esta também é a convicção dos deputados Antonio Palocci e Sandro Mabel, respectivamente presidente e relator da Comissão Especial que trata da reforma.

Podem anotar : é otimismo demais. As divergências entre Estados, União e prefeituras ainda não foram vencidas. E só serão, de fato, quando forem apresentadas as especificações das mudanças que estão sendo propostas, a começar das alíquotas de alguns impostos. Uma coisa são os princípios, a filosofia, outra é a prática, aquilo de quem arrecada, quem gasta. Além do mais, mais um mês e o Congresso entra no recesso oficial de meio de ano e, em seguida, no recesso branco eleitoral, até o fim total das eleições de outubro. Na volta, terá que se ver principalmente com o Orçamento de 2009. O tempo para outras coisas será muito curto. Ainda mais para algo tão complexo quanto uma reforma tributária.

Deve-se entender ainda que o governo, com a participação do Congresso, tem promovido algumas mudanças tributárias importantes, embora pontuais. Algumas não aprovadas totalmente e outras nem absorvidas direito. Um caso é o das mudanças embutidas na nova política industrial. Outro é o de uma MP aprovada definitivamente no Senado na semana passada que de tão abrangente está sendo chamada de uma mini-reforma tributária. Atinge vários setores e ainda nem foi deglutida totalmente pelas empresas. Tudo isso é entrave para a grande reforma.

CSS : a única coisa certa

O que parece certo mesmo, do mundo real, é o renascimento do imposto do cheque, com a alíquota de 0,10% e apelidado, para dourar a pílula, de Contribuição Social para a Saúde - CSS. Parte da oposição - parte dela apenas, porque aquela capitaneada por governadores e prefeitos quer o novo imposto - já conseguiu postergar duas vezes a votação da proposta na Câmara. Seu fôlego, porém, está se esgotando. O governo tem ampla maioria na casa, como sabemos, e está usando suas armas naturais para convencer os aliados mais recalcitrantes e ganhar as simpatias dos governadores.

Como ocorre nessas ocasiões, cresceu a liberação de verbas das emendas dos parlamentares, sempre um poderoso instrumento de convencimento à turma do "é dando que se recebe". Quanto aos governadores, foi oferecido a eles, na regulamentação da emenda 29 sobre gastos na saúde, a permissão para que se inclua entre as despesas consideradas da área de saúde as dívidas contraídas para aplicação no setor e as recursos destinados ao Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico (Fundeb).

Uma nova tentativa de votar a proposta será feita nesta quarta-feira. A própria oposição já dá a batalha por perdida. A disputa se transfere então para o Senado, para onde o projeto retorna por ter sido alterado na Câmara. E a CSS só não será aprovada lá se houver uma mobilização da sociedade nos mesmos moldes da que levou à derrubada da CPMF no ano passado.

Plano de vôo frustrado : o caso Varilog é grave

Observados todos os aspectos legais, negociais e financeiros da transação envolvendo a aquisição da VarigLog pelos brasileiros Marco Antônio Audi, Marcos Haftel e Luiz Eduardo Gallo há probabilidade enorme de que as coisas possam se complicar muito do ponto de vista político, no que se refere à ministra Dilma Roussef e o advogado (e compadre do Presidente Lula) Roberto Teixeira e, por conseguinte, para o governo. O negócio sob suspeita é mais facilmente "rastreável", as transações podem ser conhecidas em grande parte e as brigas judiciais podem favorecer a maior volume de informações que as atualmente disponíveis. Ao contrário da "CPI dos cartões corporativos", recheada de falatório e poucos fatos apurados, as transações envolvendo a VarigLog podem produzir muitos resultados práticos. Basta vontade para tal. Haverá ?

Antes de responder a esta pergunta, é preciso entender algumas coisas. As conseqüências não serão apenas para os envolvidos diretamente, se ficar comprovado culpa e favorecimento. Pode atingir feio e irremediavelmente a confiança no Brasil, nossas relações com investidores externos. Por que, tão ou mais grave do que o negócio, se for confirmado que houve jogadas financeiras escusas e compadrios, é a questão que envolve a ANAC em particular e as agências reguladoras em si. Na história já está comprovado, que o governo agiu e interferiu na Agência para que ela aprovasse um negócio privado. A própria ministra Dilma admitiu isto. E já atuou do mesmo modo em outras ocasiões, em outras agências, na área de energia e na área de transportes.

E as agências reguladoras ?

Como fica a independência das agências, como fica a autonomia delas? Que confiança podem ter os investidores nacionais e estrangeiros para entrar em negócios públicos, se o governo pode interferir para levar o negócio de um lado para o outro, de acordo com suas conveniências políticas, ideológicas e até eleitorais ? Como adquirir o direito de uma concessão se depois o governo age para mudar as regras do jogo ?

Nesse ponto, tão ou mais grave (do ponto de vista das instituições) é a questão da compra da BrTelecom pela Oi, ex-Telemar. É um negócio que está sendo incentivado e em parte até patrocinado pelo governo, com recursos do BNDES. São claríssimas as pressões do Executivo sobre a ANATEL para que esta apresse as propostas de mudança (a serem decretadas por Lula) no Plano Geral de Outorgas das telecomunicações. Somente depois disso, o negócio, que já está fechado, será legalizado. Muda-se a lei para validar um negócio privado.

O PGO já deveria ter sido alterado há algum tempo, em razão do avanços tecnológicos do setor, entre outros. Mas só se viu que ele precisa mudar e com urgência, depois do negócio BrT-Oi. E com endereço mais ou menos certo.

Isso não recomenda nossas instituições. É preciso reforçar a independência e a autonomia das agências. Elas são órgãos de Estado, não de governo. Está no Congresso, desde 2004, uma proposta do presidente Lula criando um estatuto para as agências. A proposta inicial tem sérios problemas, pois, na realidade, submete as agências ao Executivo. Ela está paralisada porque as mudanças propostas não agradam ao governo.

Quanto ao caso VariLog em si, não dá para deixar como está. O governo deveria ser o primeiro interessado em esclarecer tudo. Duas fotos publicadas pela imprensa neste último fim de semana - a da festa no Palácio do Planalto quando a venda da empresa foi fechada, e a dos donos da Gol com o advogado Roberto Teixeira num elevador também no Planalto, mostram que o caso "não pode ficar por isso mesmo".

Desqualificar a denunciante - de fato, Denise Abreu é uma pessoa complicada, polêmica -, culpar outra vez a oposição (conforme o secretário de Lula, Gilberto Carvalho), ou ainda dizer que é fogo amigo (ou inimigo) para queimar a candidatura de Dilma Roussef, não cola. Como diria o Barão de Itararé, há mais coisas no ar que aviões de carreira.

Respondendo a pergunta : o governo terá de demonstrar esta vontade de investigar. Por isso, apesar da aparente tranqüilidade, a preocupação com esta história é muito grande.

Político não dorme de toca

A eleição do petista paulista Arlindo Chinaglia para a presidência da Câmara dos Deputados só foi possível por um amplo acordo entre os dois maiores partidos da base de Lula no Congresso - o PMDB e o próprio PT. Pela praxe do Congresso Nacional, o partido com a maior bancada fica com a presidência da Casa. Nesta legislatura seria do PMDB que é o maior na Câmara e também no Senado.

Embora tendo costurado uma grande aliança com o PMDB, uma situação dessas, com o PMDB presidindo a Câmara e o Senado, era insuportável para o PT e incômoda para o presidente do Lula. O partido que um dia já foi presidido por Ulysses Guimarães, ficaria forte demais no legislativo. Assim, costurou-se um acordo que deu o Senado para o PMDB, com Renan Calheiros, depois caído em desgraça, e a Câmara para Chinaglia e o PT. Foi uma forma também de evitar que, nas franjas de algumas insatisfações nas bases governistas, se infiltrasse alguma coisa parecida com Severino Cavalcanti ou uma candidatura oposicionista.

Acertou-se que a situação seria invertida nos dois últimos anos da legislatura, 2009-2010. O PT no Senado, o PMDB na Câmara. Este lugar para o presidente do partido, Michel Temer, que já presidiu a casa uma vez. O acordo, no entanto, está sob ameaças. O PT tomou gosto pelo lugar na Câmara. Além do mais, sentiu-se traído pelo PMDB nos acertos para a aliança municipal em São Paulo. No Senado, o ex-presidente José Sarney, embora nunca admita, está de olho no posto. Tanto que não quis substituir Renan, para se preservar. Essas dificuldades, porém, podem ser contornadas pelo presidente Lula, se ele resolver mesmo interferir e jogar o peso do Palácio no negócio.

Uma outra, porém, parece mais complicada. O deputado Ciro Nogueira (PP-PI), ex-escudeiro de Severino Cavalcanti, influente junto ao poderoso (eleitoralmente no Congresso) baixo clero, está em plena campanha para substituir Chinaglia. E conquistando adeptos. Já foi convidado a desistir da candidatura, mas recusou qualquer conversa até agora. Avança na insatisfação natural da sua gente somada a uma certa prepotência dos líderes aliados. No mínimo, venderá caro uma rendição.

É isto. Faltam ainda nove meses para eleição das mesas da Câmara e do Senado mas ela já toma parte dos corações e mentes dos partidos e dos congressistas.

Vaca muito louca na Coréia

A suspensão da importações de carne americana por parte da Coréia em função de razões sanitárias (doença da vaca louca) tem gerado violentos protestos nas principais cidades coreanas. Além de milhares de pessoas nas ruas a protestar contra a possibilidade de retomada das importações, a violência tem se tornado comum com quebras de ônibus, invasão de lugares públicos e troca de golpes entre policiais e populares. Há quatro anos e meio, a importação de carne americana foi adotada pela Coréia. Recentes negociações entre Seul e Washington levariam à normalização do comércio de carne. Todavia, a população não aceita essa possibilidade e, simplesmente, perdeu a cabeça. Para não dizer que enlouqueceu. E viva a carne brasileira.

A nova cartilha liberal

A tal da cartilha originada do "Consenso de Washington" que foi lançada no final dos anos oitenta por economistas liberais liderados por John Williamson produziu uma visão anti-estatista, privatista e pró-mercado que alimentou parcelas importantes de governos de países de terceiro mundo como o Brasil e o México. Na realidade aquela cartilha tinha pontos bastante interessantes, tais como, a responsabilidade fiscal e uma pregação de austeridade na administração da moeda.

De outro lado, suas recomendações pró-mercado, sobretudo no que se refere à liberdade de capitais, são bastante polêmicas. Na década de 90, esta liberdade propiciou as condições para as crises cambiais de pelo menos uma dúzia de países. Agora a "nova cartilha" avança no que tange ao papel do Estado, inclusive como investidor em projetos de infra-estrutura. Esperemos que esta proposição não seja a desculpa que faltava para maiores gastos totais dos governos. É preciso reduzir os gastos correntes e aumentar os investimentos. Senão, desta feita, teremos as "quebras de países" pela via fiscal... A cartilha pode ser usada de diferentes formas. Depende de quem lê...