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Política & Economia NA REAL n° 44

terça-feira, 24 de março de 2009

Atualizado em 23 de março de 2009 19:16

 

Terça-feira, 24 de março de 2009 - nº 44

Ops! Fato novo, relevante e positivo - I

Uma das razões fundamentais para a descrença na recuperação mais rápida da economia norte-americana foi o fato do pacote de US$ 787 bi, aprovado pelo Congresso há cerca de um mês, ser considerado insuficiente para cumprir dois papéis, a saber: (i) estimular a demanda (via criação de empregos) e (ii) sanear o combalido sistema financeiro do país. Neste último item, os analistas mais argutos logo perceberam que a possibilidade de que um cenário de depressão era mais provável, a mesma rota seguida pelo Japão durante a década dos noventa. Sobraram inclusive críticas de economistas que apoiaram Obama desde o lançamento de sua candidatura, tais como Paul Krugman e Joseph Stiglitz. A conseqüência da insuficiência do pacote foi que as ações dos bancos derreteram no mercado e a desconfiança ficou ainda mais acentuada em relação ao sistema financeiro. Este era o cenário prevalecente até a semana passada quando o FED surpreendeu a todos e abriu uma linha de US$ 300 bi para o Tesouro dos EUA e US$ 700 bi adicionais para a aquisição de ativos (podres) do sistema financeiro.

Ops! Fato novo, relevante e positivo - II

Além do que informamos na nota acima, o Tesouro dos EUA vai promover leilões a partir dos próximos dias para comprar ativos mais antigos nas carteiras dos bancos. Estes ativos poderão ser comprados não somente pelo Tesouro, mas também por investidores institucionais, os quais serão estimulados a participar uma vez que tal modalidade de operação pode ser muito lucrativa. É uma espécie de "fundo" que tem intrinsecamente dois méritos: (i) aumenta a liquidez do sistema e diminui a incerteza e (ii) cria uma "precificação" efetiva e transparente para os ativos bancários. Esta medida, somada à aquisição de "ativos tóxicos" por parte do Tesouro, é muito significativa e pode retirar o enrosco que paralisou a política de retomada da atividade econômica da maior economia do mundo (25% do PIB mundial). É para se prestar a atenção à evolução de tudo isto, pois deve haver recuperação dos mercados nas próximas semanas, o que joga para cima as expectativas. Se o governo dos EUA conseguir recuperar a credibilidade do sistema, estará aberta a possibilidade para que se adote um tratamento mais consistente para gerar empregos, renda e crescimento. Ao invés de uma longa depressão, poderemos visualizar um cenário de recessão mais breve. É tudo que o mundo espera.

Como agir em relação aos investimentos

A maior alteração na política de investimento é que a taxa de juros de longo prazo pode voltar a subir. Os títulos de 10 e 30 anos do Tesouro Americano estavam muito valorizados, refletindo a extraordinária demanda por este "porto seguro". De outro lado, os metais preciosos não paravam de subir com o medo de uma inflação crescente e substancial no longo prazo em função da injeção de recursos públicos no sistema. Este processo não será revertido no curto prazo, mas pode ser amainado. O que já é muito positivo. Além de ser fundamental. E quem ganha? Ganham os mercados de renda fixa de títulos privados que devem ter a sua demanda aumentada, bem como o mercado acionário. O Brasil neste contexto deve seguir a mesma rota do mercado internacional: bolsa para cima, juros de longo prazo para cima (apesar da provável queda mais acentuada da taxa Selic de curto prazo) e câmbio mais estabilizado - pode até haver uma valorização mais acentuada do Real. Estamos vendo uma luz nascente no horizonte. Esperamos que venha a ser crescente e bem mais luminosa diante de tanta incerteza desde o final de 2007 e que foi acentuada em meados do terceiro trimestre do ano passado.

Lula e o FMI

Lula fez muito bem ao defender que os emergentes não participem da injeção de recursos nos organismos multilaterais (FMI, Banco Mundial e BID). Embora a presente crise afete todos os países, não parece razoável que os emergentes gastem recursos para viabilizar as políticas dos organismos multilaterais os quais são controlados pelos países mais ricos. Nenhum dos países emergentes tem poder de emitir moeda transacionável no mercado internacional. Não há credibilidade para estas e nem demanda. Nem mesmo da China, país tão propalado pela imprensa e investidores nos últimos anos. Os países ricos têm estas possibilidades. Que as usem para financiar o FMI e seus anexos. Além disso, esta injeção de recursos não vem acompanhada de uma revisão da forma de agir destes organismos, os quais foram absolutamente negligentes em relação à crise. Há um ponto para se prestar atenção: será que a injeção de recursos no FMI, BIRD e BID vai implicar em mudanças na estrutura de voto e representação entre os países? Este é um ponto vital.

Aerolíneas e o BNDES

Novamente estamos a ver o BNDES na sua ação "desenvolvimentista". Já apoiou a BrOi, a Aracruz, o Grupo Votorantim, a indústria automobilística e por aí vai. Agora, chegou a vez de financiar aviões da Embraer para a Aerolíneas Argentinas? O ponto aqui é saber o que de fato pode e não pode o banco de desenvolvimento. Quem fiscaliza de fato a suas políticas? Quem verifica se o que está sendo feito e se isto é do interesse do país? Quanto custa tudo isto? Já criticamos por diversas vezes o BNDES e o governo por suas políticas. Falta transparência sobre o custo das políticas anticíclicas do governo - e o BNDES é parte essencial deste custo. Crises muitas vezes geram "esqueletos" fiscais que saem das tumbas e passam a gerar pressões inflacionárias e fiscais no médio prazo. Será que alguém do Congresso se importará com tudo isto?

E o trabalhador?

O sindicalismo brasileiro, cujo papel é altamente questionado (e questionável) no momento atual de crise bem que poderia fazer uns cálculos e verificar quais são os benefícios governamentais que recebem as empresas, e qual é o montante de recursos destinados aos trabalhadores. A desproporção entre estes segmentos é justificável e contribui de forma efetiva para a retomada da atividade econômica? Um trabalhador de classe média, por exemplo, não poderia ter o seu IR reduzido?

A popularidade do governo e a crise

O fato é que a queda de popularidade do presidente e a avaliação do governo no combate ao desemprego continuam em excelentes patamares tanto na pesquisa CNI/IBOPE quanto na DataFolha. É verdade que no item do desemprego (46% em março contra 57% em dezembro) não é uma nota tão boa, mas está longe de ser ruim. Contudo, a avaliação positiva do governo (64% em relação aos 73% de dezembro) é substantiva e faz valer o capital político do governo (e de Lula). O que se vê é um presidente forte para combater a crise. O que é bom. Mas, por outro lado, faz recair sobre ele uma responsabilidade ainda maior em relação à condução do governo neste delicado momento.Há mais dois fatos positivos em relação à pesquisa: a maior consciência da população em relação à gravidade da crise (37% em março contra 35% em dezembro), embora ainda não seja prevalecente a opinião de que o cenário é muito sério. De outro lado, 41% da população ainda tem pouco medo de ser afetado pela crise, aspecto relevante para a propensão ao consumo. Finalmente, é certo que o governo tem capital político, mas é igualmente certo que a população que hoje dá crédito pode retirá-lo no momento em que a crise ainda está se instalando com maior intensidade por aqui. Todavia, este é um ponto a ser verificado no futuro.

Tranquilidade. Tranquilidade?

Pelos sinais emitidos externamente, o governo recebeu com naturalidade os resultados das duas pesquisas. Não é uma tragédia, avalia-se. E não é. Nem dá para avaliar se ela é uma tendência. Pode ser uma barriga. É evidente que os números de Lula e do governo foram impactados pela crise e o crescimento do desemprego. Não dá para dizer até onde isso vai parar porque é impossível prever o quanto e por quanto tempo a economia mundial e nacional estarão debaixo de um terremoto. Se durar muito mais, vai afetar o projeto político envolvendo a ministra Dilma. Ela não se sustenta sem um ambiente econômico saudável. Não tem ainda luz própria. E sem os raios de Lula, murcha. O governo deve começar a fazer coisas (ou mostrar que está fazendo) para tentar manter o otimismo. O grande mal é que começaram a aparecer as greves e o sindicalismo de um modo geral está inquieto e insatisfeito.

América do Sul: risco aumentando

Temos salientado nesta coluna que, além dos riscos advindos da crise nos países centrais, o risco regional está se tornando perigoso para a política externa e econômica do Brasil. Juntamos aos fatos anteriormente comentados em colunas passadas mais dois que justificam a nossa preocupação: (i) o novo passo estatizante de Hugo Chávez, desta feita no que diz respeito à nacionalização da unidade local do Banco Santander e, mais importante, (ii) o aumento dos conflitos entre as elites argentinas e o governo do casal Kirchner. Neste último item, vale ressaltar que a presidente Cristina Kirchner está enfrentando por meio de medidas reguladoras a imprensa, mais especificamente o grupo Clarín, bem como o setor rural que promove um (perigoso) bloqueio, o qual deve afetar as exportações e o suprimento doméstico. Não devemos desprezar nenhuma notícia ao redor do Brasil. Isto mexe muito com a percepção dos investidores em relação à região.

O que de fato pensa o presidente?

Lula vai aos EUA e discursa contra o protecionismo. Semana que vem deve repetir a ladainha na reunião do G-20, na Inglaterra. Mas, quando recebe a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, em SP, diz que o protecionismo dos vizinhos é normal. Diz que os países devem trabalhar pela definição de um "preço justo". No início do mês, Argentina ampliou barreiras a produtos brasileiros importados. O que Lula pensa de fato sobre o assunto? Talvez um pouco de cada posição. O protecionismo dos ricos é inaceitável. Dos emergentes, justificável. No caso da Argentina dos Kirchner há outro detalhe: o Brasil não cria confusão com os vizinhos. Vai acatar sempre o que eles fizerem.

OCDE, novas projeções

Nos próximos dias teremos o anúncio das novas projeções da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que analisa as maiores economias do globo. Sem que saibamos os números, podemos antecipar para os nossos leitores o quem vem por aí: projeções que mostrarão a maior crise dos últimos sessenta anos e redução das projeções para o PIB dos países emergentes. A organização previu ao final do ano uma redução de apenas 0,4% do PIB para este ano. Agora terá de fazer uma correção de rota. Simples como isto.

Por aqui, também novas projeções

Vejamos a tabela abaixo sobre as previsões para o PIB deste ano:

Credit Suisse +1,3%
Austin Ratings +0,7%
Bradesco +0,6%
Tendências +0,3%
Relatório Focus 0%
WestLB -0,2%
BNP Paribas -1,5%
Morgan Stanley -4,5%

Estes números refletem em grande medida um ajuste das expectativas de algumas instituições em relação ao crescimento deste ano depois da queda de 3,6% do PIB no último trimestre do ano passado. A nossa opinião é que o PIB deste ano deve cair entre 2% e 3% em relação ao ano passado como um todo. Portanto, deve haver um ajuste adicional das expectativas dos agentes em relação ao crescimento. O fato novo (v. primeiras notas) é o pacote de medidas nos EUA. O saneamento do sistema financeiro pode ser mais rápido e isto pode favorecer muito as expectativas em relação ao médio prazo.

Imposto oculto

O preço dos combustíveis, especialmente o da gasolina e do óleo diesel, sempre foi, no governo Lula (e também em outros governos, em determinados períodos) um preço político, ajustado e estabelecido por ponderações que não as de ordem técnica. Durante um bom tempo, por exemplo, a empresa deixou de ajustar os preços desses combustíveis, para cima, mesmo com o petróleo ficado muito tempo acima dos US$ 100, para não pressionar a inflação e garantir bons fluídos políticos para o presidente. Agora que a situação se inverteu e o petróleo está a menos de US$ 60, a empresa também não está animada a fazer reajustes nos preços, agora para baixo. Só que por outra razão, como o próprio presidente Lula confessou: "Ela tem grande importância para o superávit primário". Segundo ele, também contribui para os cofres do Tesouro com impostos e royalties. Ou seja, os preços da gasolina e do diesel são mais um imposto "oculto" que a sociedade brasileira paga, pois a Petrobrás apenas arrecada - quem paga é quem usa os combustíveis. É preciso, ainda, garantir recursos para a empresa fazer seus planos de investimentos e, então, compensar o período em que a Petrobrás manteve os preços artificialmente baixos. De qualquer forma, não será surpresa se a orientação sofrer uma guinada e a Petrobrás reduzir um pouco o que cobra pelos dois combustíveis: o governo está precisando fazer alguma "bondade" para compensar a tensão econômica.

Perigo nas bombas

Os níveis de gasolina adulterada (ou "batizada") oferecida nos postos de SP já estão superiores aos alcançados no pior ano do "batizado", em 2005. Será que tem alguma coisa a ver com o aumento na importação de solventes registrado nos últimos meses?

Lula, o STF e o italiano

É firula para a platéia a informação que Lula teria avisado Gilmar Mendes que se o STF deixar para ele decidir sobre a extradição ele não extraditará o italiano Cesare Battisti, e que se o querem extraditado a casa constitucional é que deverá fazê-lo. Teria sido um recado duro de Lula. Na realidade, o que Lula quer é um favor do STF, para não se indispor com os italianos (se não assinar a extradição), não ficar mal com a sua ala esquerda e não desautorizar o ministro Tarso Genro (se mandar o italiano de volta). O ônus e as críticas recairão sobre Gilmar Mendes e os seus. Lula está se revelando um "pessedista" (do antigo e extinto PSD), principalmente o mineiro, que inventou o muro político muito antes dos tucanos da melhor estirpe.

Maquiagem nas contas

Poucos analistas acreditam que o "novo" Orçamento Federal deste ano, anunciado com um corte de R$ 21 bilhões em que relação ao que havia sido aprovado pelo Congresso no fim de 2008, é para valer. O ministério do Planejamento fez contas de chegada - e chegou. Novos cortes serão necessários, porque a perda de receitas, avaliadas em mais de R$ 48 bilhões pelo próprio Ministério, ainda pode estr subestimada. Há também uma previsão de crescimento do PIB de 2% já considerado otimista. Contudo, o governo fez tudo para evitar problemas políticos agora e não adiou o aumento dos servidores, não cortou nem as obras do PAC e nem avançou sobre as emendas individuais dos parlamentares. Sequer admitiu a redução do superávit primário. Fez mágica. Até previu uma redução de R$ 7 bilhões nos pedidos de aposentadoria, coisa que costuma crescer em tempos de crise e desemprego. A realidade é que o governo deverá optar mesmo é pela redução do superávit, pelo uso do Fundo Soberano do Brasil além de contar com os ganhos que terá com o serviço da dívida pública fruto da redução dos juros. O que não faz a perversa combinação de interesses eleitorais com a condução da economia...

MPs: soluções e problemas

Os juristas do Congresso e da nossa política - lá estavam, entre outros, Michel Temer, Nelson Jobim e José Antônio Toffoli e tiveram a anuência de José Sarney - inventaram mais um monstrengo neste país com a decisão de que as MPs só trancam as pautas da Câmara e do Senado em determinadas circunstâncias. Pode não ser uma aberração jurídica - já vimos as mais diversas interpretações para a proposta. Mas sem dúvida é uma aberração política. Neste tema pode haver mais problemas do que soluções. Deixando de trancar a pauta, as MPs obrigarão o governo a um maior esforço para aprová-las antes do prazo de validade, o que é bom. Porém, se elas caducarem, haverá sérios obstáculos jurídicos, e esta é uma possibilidade real dada a fragilidade da base governista. Por outro lado, sem o trancamento da pauta, o Planalto pode se sentir menos constrangido em editar MPs versando sobre tudo e nada. Já há sinais tanto no Congresso quanto no governo sobre o acerto da decisão.

MPs: e o Congresso?

A Câmara e o Senado criaram um ardil para eles próprios: não tem mais o escudo das MPs para justificar a inação parlamentar em relação a uma série de projetos de suma importância que dormitam nas Casas. Esta semana mesmo espera-se que as pautas de votação preparadas por Michel Temer e José Sarney venham recheadas desses projetos. Será que eles vão esperar uma definição do Supremo sobre a questão, inseguros diante da constitucionalidade da interpretação? Prevaleceu, na história, a norma de Abelardo "Chacrinha" Barbosa: "Eu não vim para explicar. Eu vim para confundir." Bastaria que Sarney e Temer cumprissem (como os outros anteriores a eles) o que está cristalino na Constituição: formar uma comissão para analisar liminarmente as MPs e devolver para o Planalto aquelas que não cumprem os requisitos constitucionais de urgência e relevância. Simples e direto. Mas, quem quer complicações com o governo, quando estão todos pensando na posição de vice em 2010, num novo mandato para a filha, etc. e tal...?