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Porandubas nº 597

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Atualizado em 6 de novembro de 2018 14:45

Abro a coluna lembrando momentos cômicos de tempos pesados.

Ditador de plantão

Humberto Castelo Branco, presidente, encontra Carlos Castelo Branco, jornalista:

- Você leu a notícia de um jornal do Uruguai dizendo que é filho do presidente do Brasil?

- Não, presidente. Li uma notícia dizendo que sou filho do ditador de plantão.

O anjo no alto

Entrevista coletiva no Palácio do Planalto. Carlos Castelo Branco pergunta ao presidente Humberto Castelo Branco:

- Como V. Exa. se sentiu ao ler a declaração de Carlos Lacerda chamando-o de Anjo da Rua Conde Laje?

- O anjo fica na parede, no alto, de onde contempla o desfile das prostitutas.

(Da verve de Sebastião Nery)

Primeiros movimentos

Os primeiros movimentos do presidente eleito começam a mostrar seu estilo de jogo. Trata-se de um protagonista que joga avançado, no ataque, evitando a retaguarda. Sua ideia de enxugar a Esplanada dos Ministérios para 15 ou 16 Pastas ganha aplausos na opinião pública. E por escolha de pessoas com bom trânsito, a partir do juiz Sérgio Moro, o perfil mais admirado e elogiado na praça. A amplitude que deseja dar ao Ministério da Justiça significará que o foco no combate à corrupção continuará aceso.

Moro na Justiça

A aceitação do juiz Sérgio Moro, de aceitar o encargo do Ministério da Justiça, com escopo ampliado, foi um gol de placa de Bolsonaro, mesmo sob críticas de patamares da intelectualidade e da mídia. Moro sinaliza ímpeto em sua gestão moralizadora. O juiz, ao aceitar de pronto a missão, abandona a carreira. Para muitos, principalmente petistas e opositores ao novo governo, sua escolha sinaliza um viés antilulista, dando margem às especulações de que não teria sido justo e imparcial na condenação de Lula. Daí a onda que se forma, de que o juiz ajudou Bolsonaro a se eleger e, agora, é recompensado. A campanha de "Lula livre" ganhará força.

STF na mira

Especula-se que o juiz Moro, na verdade, está de olho no STF, para onde seria guindado dentro de dois anos, tempo em que a Corte abrirá vaga com a aposentadoria do decano Celso de Mello, que chegará aos 75 anos. Bolsonaro já sinalizou nessa direção. Tirar um juiz de 1ª instância e jogá-lo na Corte Suprema seria uma decisão de muita polêmica. Coisa diferente de puxar para a Corte um ministro da Justiça. A nomeação seria algo mais corriqueiro. Quanto à decisão de Moro, alguns acham que deveria passar um tempo antes de ingressar na política. Ele acaba de dizer que jamais concorrerá a cargo eletivo. O fato de ingressar no Poder Executivo, para alguns intérpretes, não significa ingresso na política.

Juiz e política

Juízes italianos, que trabalharam na Mani Pulite, a operação Lava Jato da Itália, até defendem a entrada de magistrados na política, mas não de maneira abrupta, durante o tempo em que ainda operam nas frentes de combate à corrupção. Lá, o juiz Giovanni Falcone, apontado por Sergio Moro como sua inspiração para deixar a toga e assumir cargo no governo, foi um dos responsáveis por deflagrar a operação Mãos Limpas no país, tendo, antes, trabalhado contra a máfia siciliana Cosa Nostra.

Inspiração

Diz Moro: "Lembrei-me do juiz Falcone, muito melhor do que eu, que depois dos sucessos em romper a impunidade da Cosa Nostra, decidiu trocar Palermo por Roma, deixou a toga e assumiu o cargo de Diretor de Assuntos Penais no Ministério da Justiça, onde fez grande diferença mesmo em pouco tempo. Se tiver sorte, poderei fazer algo também importante".

Falcone no governo

Falcone construiu sua trajetória em Palermo, na Sicília. Em 1991 aceitou um cargo no Ministério da Justiça no governo de Giulio Andreotti. Naquele momento, o governo italiano estava pressionado pela opinião pública a investigar a máfia na Sicília. A pressão foi causada, sobretudo, após a morte de Salvo Lima, político do partido Democracia Cristã e aliado de Andreotti. No Ministério da Justiça, o juiz assumiu o cargo de Diretor-Geral de Investigação Criminal, sendo bem-sucedido. Amigos de Falcone acreditavam que o convite era uma armadilha para afastá-lo das investigações locais. "Foi a decisão correta porque a luta contra a máfia começava em Palermo, mas só poderia ser vencida em Roma", disse seu amigo, o juiz Ignazio de Francisci. Foi morto após a Suprema Corte italiana confirmar as condenações de mafiosos feitas por ele em Palermo.

O atentado

Em 23 de maio de 1992, foi vítima de um atentado, uma carga de 400 quilos de TNT enterrados sob o asfalto da estrada para o aeroporto de Palermo. Além do juiz, morreram também a sua mulher e três guarda-costas. Seis meses depois, foi morto o procurador Paolo Borsellino, em um atentado com um carro bomba, carregado com 100 quilogramas de dinamite, numa autoestrada em Palermo.

O astronauta

O astronauta Marcos Pontes, escolhido para comandar o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação, também é objeto de polêmica. Trata-se de uma pessoa simpática, sempre sorridente, mas pairam dúvidas sobre as condições que preenche para administrar uma área que exige conhecimento. Um leitor me lembra: ele é formado pelo ITA, uma exemplar escola de engenharia e está no métier há décadas. O Ministério poderá abrigar as universidades públicas. O astronauta está cheio de boas intenções, mas a comunidade acadêmica está com um pé atrás.

Guedes, o arquiteto da economia

Paulo Guedes, que dará forma à economia, compõe sua equipe, abre conversas a torto e a direito, ganha poder à medida que entra nos domínios do amplo ministério que comandará. Guedes está cercado de expectativas, com o mercado apostando forte em sua visão liberal-privatista. Gostaria ele de ver parte da reforma da Previdência aprovada ainda este ano, pelo menos a que abriga a questão da idade para aposentadoria. Não será fácil. O presidente eleito tem dúvidas sobre o modelo de capitalização que Guedes quer imprimir na Previdência Social.

Lorenzoni

Como deputado, Onyx Lorenzoni não era confinado, como dizem alguns comentaristas, no grupo menos qualificado da Câmara. Falou alto no microfone. Foi um dos mais destacados atacantes do petismo/lulismo, levando adiante a bandeira liberal do DEM. Liderou grupos e teve importante desempenho como relator das 10 Medidas contra a Corrupção. Graças a suas habilidades culinárias, aprovadas pelo pequeno grupo que frequentava seu apartamento em Brasília, liderou o projeto Bolsonaro. Assim atesta seu amigo, o eleito senador Major Olímpio. O pequeno grupo fez germinar a seara que acabou se alastrando pelo país.

Major Olímpio

O senador eleito será uma das extensões mais firmes do governo Bolsonaro no Congresso. Com mais de nove milhões de votos obtidos em São Paulo, deverá ser um perfil de forte expressão na Câmara Alta, com possibilidade de vir a ser líder do governo ou líder da bancada do PSL. Tem boa expressão e coordenou uma campanha bolsonarista bem-sucedida no maior colégio eleitoral do país, onde desbancou o candidato Eduardo Suplicy.

Articulação direta

Entremos, agora, no modus operandi do governo Bolsonaro. Lê-se que, ao invés de fazer uma ampla coligação partidária, o capitão teria inclinação para fazer uma articulação direta, olho no olho, palavra na palavra, com cada parlamentar. Ou seja, o presidencialismo de coalizão daria lugar ao bolsonarismo, expressão que mostra a nova modelagem a ser posta em prática. Para tanto, ele poderia contar com a simpatia dos integrantes da bancada da bala (segurança), da bíblia (evangélicos) e do boi (agronegócio). Essas bancadas somariam cerca de 250 parlamentares na Câmara. A ideia seria a de atender demandas setoriais das bancadas e, por conseguinte, cooptar seu apoio. Essa modelagem resistirá ao tempo?

Pragmatismo

Esse é o busílis. Os parlamentares são afeitos ao jogo de recompensas. E o jogo pressupõe não apenas atendimento de demandas temáticas, mas espaços na estrutura governamental. A justificativa é simples: a política visa a conquista do poder. E a conquista do poder, por sua vez, implica ganhos na máquina administrativa. Com esses espaços e nomeações, o parlamentar aumenta seu cacife e obtém mais prestígio nas bases. Essa corrente forma o presidencialismo de coalizão. É possível, até, fazer-se uma articulação direta, mão na mão; depois de algum tempo, o toma lá, dá cá vai aparecer. Em suma, a base de apoios do governo Bolsonaro retomaria, mais cedo ou mais tarde, o modelo tradicional. Passaria um tempinho na articulação direta até se deparar com a real politik.

Mensalão

Urge lembrar que o mensalão, composto nos tempos de Lula, começou com a "compra" isolada de parlamentares. Em vez de se firmar no apoio de grandes partidos, Luiz Inácio teria orientado o então ministro José Dirceu a cooptar isoladamente cada parlamentar. Deu no que deu.

Afastamento

O presidente eleito não deve desconsiderar os fundamentos da nossa tradição e posicionamento no cenário das relações internacionais. Tensões colocam o país em situação desconfortável com as declarações do presidente eleito sobre as relações com o Mercosul (Argentina, Paraguai, Uruguai), União Europeia, China (nosso principal parceiro comercial), países árabes e muçulmanos, desprezando três bilhões de consumidores, um quarto do mercado mundial. Acende-se sinal amarelo.

Peça-chave

O ministro das Relações Exteriores, a ser escolhido, será peça-chave para garantir portas abertas com os países que se surpreenderam com a sinalização diplomática feita pelo presidente Bolsonaro. A conferir.

Estética simples

As fotos não poderiam ser mais reveladoras. O presidente eleito falando atrás de uma mesa simples, sob um fundo onde se via uma bandeira do Brasil pregada na parede com durex. Ao lado, a tradutora de sinais. Noutra cena, o capitão toma café da manhã, cortando o pão e jogando nele leite condensado. A mesa está sem toalha. Tudo muito rústico. Simples. Natural. A produtora de campanha está numa garagem nos fundos da casa do empresário Paulo Marinho. Sem sofisticação tecnológica. Sem grandes equipamentos. Coisa rudimentar. O métier dos tradicionais marqueteiros virou de cabeça para baixo. Ufa!

A expressão bolsonarista

O presidente eleito não procura esconder cacoetes linguísticos. Ancora-se em uma linguagem coloquial, cheia de oks, "mandando ver", "botar pra quebrar", "cortar a cabeça", sem querer parecer alguém que escolhe o melhor termo para se expressar. É assim com todos, jornalistas ou assessores. Transmite impressão de ser sincero em suas convicções. Mas os exageros causam medo, mesmo sob desculpa de que, em certos casos, usa figuras de linguagem: "fuzilar a petralhada", por exemplo.