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Novo Estatuto do Torcedor: mais populismo penal enganoso

A consolidação das regras gerais dos esportes, no Brasil, veio com a lei Pelé (Lei 9.615/l998). Para combater a violência, a baderna e o vandalismo nos estádios o legislador criou, em 2003, o Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/2003).

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Atualizado em 13 de setembro de 2010 15:53


Novo Estatuto do Torcedor: mais populismo penal enganoso

Luiz Flávio Gomes*

A consolidação das regras gerais dos esportes, no Brasil, veio com a lei Pelé (9.615/98 - clique aqui). Para combater a violência, a baderna e o vandalismo nos estádios o legislador criou, em 2003, o Estatuto do Torcedor (10.671/03 - clique aqui). Nenhuma política séria de prevenção foi instituída concomitantemente. Consequência: a insegurança aumentou e a violência não diminuiu. Para "resolver" o problema, uma nova lei (novo estatuto do torcedor - 12.299/10 - clique aqui) que, atendendo os apelos populares e midiáticos, criminalizou várias condutas - a dos cambistas, por exemplo - e incrementou a pena de vários crimes.

As mortes e selvagerias incontáveis (sobretudo aquela dos torcedores do Coritiba, no final de 2009) geraram emocionadas demandas populares de mais punição. Os meios de comunicação bem sabem hiperdramatizar a violência. O legislador brasileiro, que é muito sensível a esse tipo de demanda e de pressão, sobretudo diante de cada emergência penal, em lugar de incentivar uma séria política de prevenção da violência, aciona sua "fábrica de leis", que é em regra emocional, irracional e desproporcional, "vendendo-as" como remédio para o problema.

Me bate mais que eu gosto de apanhar! O povo pede, a mídia exige, o legislador atende. A nova lei, afora suas aberrações e simbolismos, sendo mais um fruto do populismo penal brasileiro, na medida em que não veio acompanhada de medidas preventivas concretas, constitui mais uma deslavada enganação, que vive da exploração da crença popular de que mais leis punitivas é a solução "definitiva" para os problemas da insegurança.

De 1940 (ano do nosso Código Penal - clique aqui) a 30/6/09, conforme tese de doutoramento apresentada por Luís Wanderley Gazoto (UnB, 2010), o Congresso Nacional brasileiro aprovou 122 leis penais, sendo 80,3% de leis punitivistas (agravadoras da sanção penal), 12,3% de leis benéficas ao infrator e 7,4% indiferentes. Algumas penas foram quintuplicadas, sextuplicadas ou octuplicadas. Na 53ª legislatura da Câmara dos Deputados (de janeiro de 2007 a 30/6/09) foram apresentados 308 projetos, sendo 95% punitivistas (incremento das penas). Na 52ª e 53ª legislaturas do Senado Federal (de janeiro de 2003 a 30/6/09) foram apresentados 172 projetos, sendo 97% punitivistas. É só isso o que o legislador brasileiro sabe fazer: endurecer cada vez o sistema penal, prometendo sempre o "remédio certo".

Quando, depois de um certo tempo, se constata que o remédio anterior não funcionou, diante das novas demandas de mais punição, de mais rigor, o legislador solta do seu arsenal punitivo (da sua fábrica) mais uma batelada de leis, prometendo (novamente) que agora o problema - da insegurança - será definitivamente solucionado. É a clássica política do more and more of the same, ou seja, mais e mais do mesmo remédio milagroso que, desacompanhado de medidas preventivas concretas, não passa de uma nova enganação.

De enganação e enganação os legisladores vão vivendo e se reelegendo e o povo e a mídia continuam frustrados pedindo mais leis duras. Com isso as medidas preventivas concretas - que significa gastos e responsabilidade - vão sendo adiadas eternamente.

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*Diretor Presidente da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes







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