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Responsabilidade do construtor por erros de projetos de terceiros

Ao se tornar um canteiro de obras de infraestrutura, o Brasil precisa de uma definição em seus empreendimentos: quais os limites da responsabilidade do construtor em caso de erros de projeto de terceiros.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Atualizado em 5 de novembro de 2010 11:00


Responsabilidade do construtor por erros de projetos de terceiros

Kleber Luiz Zanchim*

Ao se tornar um canteiro de obras de infraestrutura, o Brasil precisa de uma definição em seus empreendimentos: quais os limites da responsabilidade do construtor em caso de erros de projeto de terceiros. Nas licitações para obras em geral, o Estado apresenta o projeto a ser seguido pelo contratante privado. Os documentos são produzidos pelo próprio ente público ou por projetistas contratados por ele. Ocorre que, por vezes, o projeto tem falhas. Nesse caso, deve-se resolver quem paga a conta de possíveis prejuízos.

Há decisões judiciais que atribuem também ao construtor a responsabilidade por danos decorrentes de erros de projeto elaborado por terceiros. O principal argumento é que ele, sendo um especialista em construção, somente pode executar uma obra se estiver convicto de que o projeto é adequado. Ao construir a partir de referências técnicas que julga temerárias, o construtor passaria a responder junto com o projetista pelos prejuízos causados ao dono da obra. A ponderação é razoável, mas não pode ser desconectada das peculiaridades dos casos concretos, especialmente quando um dos contratantes é o Estado.

Em primeiro lugar, deve-se analisar o objeto dos contratos. Se a licitação for somente para construir, todo o cálculo de preços e contingências do construtor levará em conta apenas a construção. Não é razoável que ele tenha de computar incertezas relativas àqueles que o precederam, como os projetistas. Se o Estado impõe um projeto, deve suportar os custos e ônus de eventuais erros dele decorrentes, sem prejuízo de regresso contra quem o formatou. Trata-se do binômio poder e responsabilidade: ao definir as especificações da obra (poder), o ente público submete-se às consequências dessa decisão (responsabilidade).

Em segundo lugar, é preciso separar dever de informar, decorrente da boa-fé objetiva, de responsabilidade por falhas no projeto. A condição de especialista cria para o construtor o dever de avisar o Estado sobre eventuais incongruências do que foi projetado por outrem. Contudo, não o torna responsável por danos oriundos da insistência do ente público em seguir com a obra nos termos propostos na licitação. Afinal, se o Estado desejar prosseguir com aquilo que projetou, o agente privado não poderá recusar a execução, sob pena de sofrer sanções como advertências, multas ou até impedimento temporário de contratar com a Administração. Evidente que aumentos de custos decorrentes da posição estatal de manter o projeto sem alterações deverão ser compensados no contrato para evitar desequilíbrios econômico-financeiros.

Importante comentar ainda sobre a abrangência daquele dever de informar do construtor. Aspecto fundamental nesse tema é a complexidade do empreendimento. Quanto mais complexo for, mais difícil será a identificação antecipada de possíveis problemas. Portanto, o construtor violará seu dever de informar apenas se, segundo padrões esperados para a natureza específica da obra, tiver condições de verificar de antemão os vícios do projeto.

Responsabilizar solidariamente todos os envolvidos em uma obra de infraestrutura por falhas em qualquer de suas etapas tende a trazer reflexos negativos para os empreendimentos. Isso porque a formação dos preços pelos licitantes vincula-se à carga de riscos a que estão sujeitos. Se estiverem expostos à responsabilização por fatos de outrem, serão obrigados a cobrar por isso. O melhor parece ser deixar ao projetista o que é do projeto e ao construtor o que é da construção.

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*Sócio do escritório Souza Araujo Butzer Zanchim Advogados. Professor do GVLaw. Professor do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa

 

 

 

 

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