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Perguntar se deve: É possível tomar em conta a economia seriamente?

Como está formulada, dá para pensar que se trata de arrogante questionamento de um advogado desta geração. Não é, todavia, porque os currículos escolares e as leituras desses operadores do Direito contemporâneo não lhe dão o norte. Lamentável. Não é deles, porque lhes falta o suporte cultural, alicerçado e construído em horas de silêncio interior. Pior.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Atualizado em 31 de março de 2011 11:27

Perguntar se deve: É possível tomar em conta a economia seriamente?

Jayme Vita Roso*

Como está formulada, dá para pensar que se trata de arrogante questionamento de um advogado desta geração. Não é, todavia, porque os currículos escolares e as leituras desses operadores do Direito contemporâneo não lhe dão o norte. Lamentável. Não é deles, porque lhes falta o suporte cultural, alicerçado e construído em horas de silêncio interior. Pior. E não é, porque há, na profissão, poucos que saibam manejar o vernáculo com as entonações da finesse apropriada, como antes era corrente e até enfastiava.

Deixarmos os cordelistas respondê-la? Seria caricato.

Então passemos aos economistas fazê-lo com propriedade, sem serem autocríticos.

Para não rechear do supérfluo este diálogo, no espaço que o autor destas linhas honrosamente dispõe, levar-se-á em conta a genialidade de Mário Henrique Simonsen, que conseguiu em 1969 desmontar as previsões futurológicas do Hudson Institute (Brasil 2001, Apec Editora), com sólidos argumentos, articulando seu pensamento com leve ironia. Seguem algumas de suas ideias, na contundência contra Kahn, famoso então, proprietário daquela entidade: "agressivamente inaceitável"; "parece resultar de uma fantástica escassez de imaginação", "o resultado teria que ser algo muito bizarro" e a que coroa: "e quando as pessoas pragmáticas e bem formadas se vêem forçadas a apelar para a ideologia é sinal de que paira vasta ignorância científica sobre o assunto".

O livro foi escrito para servir de contraponto ao pessimismo do Instituto e do fraco crescimento do PIB brasileiro ente 1962 e 1967, dando "um pouco mais de otimismo em nossos analistas". Com o panorama nacional modificado, em meados de 1972, retorna com "Brasil 2002" (Apec e Bloch) e, no nariz de cera, lançou: "futurólogo é uma espécie de cartomante recheado de álgebra, e que procura satisfazer uma das maiores angústias da humanidade, o pré-conhecimento do futuro...", porque os modelos por ele criados "possuem uma grandiosidade apocalíptica, inacessível àquelas condições prosaicas repletas de condicionais e condicionantes"

Deixando para quem possa cogitar, com o indispensável conhecimento, mesmo porque alguns economistas dissertam acerca da influência da política sobre a economia e se eles têm serventia (claro que tem mesmo porque as opiniões dos que são competentes e honestos, moral e intelectualmente, são ignoradas pelos políticos, isto é, pelos advogados e engenheiros, como esclarecido em "Pears Encyclopedia") (118ª ed., Penguin Books, 2009 F, 1-30).

Pois o título deste artigo vai encontrar a resposta apropriada em recentíssima obra de Dean Baker (Taking Economics Seriously, Boston Review, 2010) já em uma eloquente dedicatória: "Com a esperança de que possamos começar pensando a respeito de política econômica na maneira de que, nem sempre, vá operar em favor do rico e do poderoso".

Com desenvoltura demole o mito do mercado livre, aborda as práticas desonestas nesse âmbito, revisa com luzes novas a teoria do Big Bang e propõe uma economia para cada um. Tudo isso em 89 páginas num livro que se leva no bolso do paletó; todo drama americano do escândalo imobiliário é abordado.

Esse economista em 2002 advertia as autoridades do seu país, sobre os riscos da bolha do mercado imobiliário no mesmo teor que o fazíamos em Mercado Comum como alerta sobre um megabanco norte-americano (nº 171, p. 13). Três anos depois, Baker voltou a renovar seus argumentos, alertando que o colapso imobiliário levaria à recessão, como está sendo evidenciado com a difícil, - penso - cruenta e inimaginável crise recessiva que se delonga, apesar dos esforços do Presidente Obama.

Aparecendo em programas na televisão e dando palestras, Baker, na catarse de 2008, opôs-se às decisões do governo Bush em assumir as dívidas dos bancos, pois o custo seria do povo, enquanto que os acionistas e os CEO (sempre bem pagos) estariam salvos. Sustentou que a crise de 1980 levou à quebra muitos bancos, mas nem por isso o sistema bancário deixou de operar, ridicularizando a elite norte-americana que pensa egoisticamente em manter seus privilégios. E Baker vem cumprindo seu itinerário de críticas, como renova no livro mencionado.

No ambiente do livro o escriba dá realce, à proposta: "Uma economia para cada um", ou seja, apenas o último capítulo será tido em conta. Com dose de otimismo, viu o dilema do custo do atendimento médico, a sua acessibilidade e o preço dos medicamentos.

Com otimismo, escreve: "Se os obstáculos políticos para uma economia que sirva a maioria dos americanos são enormes, também existem benefícios potenciais. Após a Segunda Guerra, os Estados Unidos usufruíram, durante três décadas, de benefícios que foram compartilhados enormemente. Com as correntes políticas aplicadas, a economia pode voltar a esse crescimento. Abandonando regulamentos que incentivam uma distribuição para a classe mais alta e aproveitando o desperdício que a acompanha, poder-se-ia oferecer ganhos reais para os quais os ricos dos anos de crescimento se mostraram ardilosos.

Considere isto: se parte do PIB destinada à saúde cair dos 17% para 10%, típico do próximo e mais dispendioso conjunto dos sistemas de saúde pública, mais de 900 bilhões de dólares poderão ser usados em outras áreas. Isto é 3000 dólares para cada americano. Pode ser comparado, um pouco menos, aos benefícios do redirecionamento do sistema financeiro em busca da eficiência, em lugar de rápidos e grandes lucros.

Pagamos um grande preço como país pelo retorno à direita do país nas últimas três décadas. Há elevados potenciais ganhos, revertendo essa rota (p. 86/87).

Não há nenhum erro na teoria econômica, mas alguns economistas insistem em ignorar seus próprios princípios, quando passam a fazer parte do governo. Logo, não há necessidade de se proteger o livre mercado, porque ele é suficientemente regulado. O que se deve ser feito: levar a sério essa tarefa, sem favorecimento, sem corrupção e sem redimensionar as grandes decisões em favor dos interesses corporativos. Afinal, temos a Constituição de 1988 que é explícita e o povo precisa ser respeitado, como lá também deve ser.

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NOTAS BIBLIOGRÁFICAS:

Os livros mencionados neste artigo são os seguintes:

Estes livros têm peculiaridades próprias muito interessantes para o leitor contemporâneo, a indiscutível autoridade de Mario Henrique Simonsen que tendo escrito Brasil 2001 em 1969 e Brasil 2002 em 1972, mostram a faceta do scholler criticou no primeiro as previsões equivocadas do Hudon Institute que criticava fortemente a economia brasileira dos anos 60 e, na obra subsequente tendo voltado a abordar a futurologia, traça com inegável brilho as suas ideias sobre o futuro do país, fazendo propostas concretas, que se repetiram enquanto ministro. Sobretudo, em 20 de março de 1974, fez um pronunciamento no auditório do Ministério da Fazenda abordando o desempenho da economia brasileira a partir de 1968 a necessidade de continuar com o talento de Bulhões e Delfim Neto para continuar mantendo o ritmo adequado da expansão; acenou com o ingresso de capitais, estimulo à exportação e combate a infração pelo sistema gradualista com taxas compatíveis e palatáveis para o país, além de relembrar necessidade de se superar as desigualdades regionais, inclusive com incentivos fiscais; terminando por propor um modelo de empresa privada forte através de redução de custos, redesenhando o modelo das arcaicas sociedades por ações (que ocorreu em 1976) e redefinindo o mercado de ações como fonte de suprimentos de capitais para as empresas.

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*Advogado e fundador do site Auditoria Jurídica

 

 

 

 

 

 

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