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Acidente do trabalho e responsabilidade civil subjetiva: matéria constitucional

Jorge Carvalho do Val

Atualmente, muito se discute sobre qual a natureza da responsabilidade civil a ser aplicada nos casos das ações visando o recebimento de danos morais e/ou materiais, movidas contra o empregador e que envolvam acidentes ou doenças profissionais. Cumpre salientar que, devido à edição da EC 45/04, a competência para apreciação destes litígios foi transferida da Justiça Comum para a Justiça do Trabalho.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Atualizado em 20 de junho de 2011 09:56

Acidente do trabalho e responsabilidade civil subjetiva: matéria constitucional

Jorge Carvalho do Val*

Atualmente, muito se discute sobre qual a natureza da responsabilidade civil a ser aplicada nos casos das ações visando o recebimento de danos morais e/ou materiais, movidas contra o empregador e que envolvam acidentes ou doenças profissionais.

Cumpre salientar que, devido à edição da EC 45/04 (clique aqui), a competência para apreciação destes litígios foi transferida da Justiça Comum para a Justiça do Trabalho1.

Parte da doutrina, acompanhada por minoritário posicionamento jurisprudencial, entende ser aplicada nesses casos a responsabilidade civil objetiva, na qual se prescinde da ocorrência de culpa ou dolo, para a caracterização da responsabilização do empregador, aplicando à tese, analogicamente, o previsto no Código Civil de 2002 (clique aqui) que, em seu artigo 927, parágrafo único, diz:

"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo".

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem."

Como se vê no artigo acima mencionado, somente se aplica a responsabilidade civil objetiva nos casos prescritos em lei ou, então, quando a atividade promova risco efetivo à direito alheio.

Deste entendimento, se aplicaria a responsabilidade civil objetiva aos empregadores que desenvolvam atividades potencialmente prejudiciais aos seus empregados, caso ocorra um acidente ou doença laborativa.

Todavia, além de não existir na legislação lei específica que aplique a responsabilidade civil objetiva nesses casos, é temerário deixar à própria convicção dos magistrados, ao julgarem as ações de cunho indenizatório acima descritas, a definição do que venha a ser atividade de risco, pela insegurança jurídica que tal fato pode criar.

O que esquecem estes doutrinadores e magistrados ao aplicarem a teoria da responsabilidade objetiva, é que no Estado Democrático de Direito, deve-se observar o princípio da legalidade, contido no inciso II do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 (clique aqui). Nesse sentido ensina Alexandre de Moraes2:

"O art. 5º, II, da Constituição Federal, preceitua que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Tal princípio visa combater o poder arbitrário do Estado. Só por meio das espécies normativas devidamente elaboradas conforme as regras de processo legislativo constitucional podem-se criar obrigações para o indivíduo, pois são expressão da vontade geral."

Pois bem, a tese da atividade de risco atenta diretamente a este princípio, uma vez que não existe, até o presente momento, vontade do legislador para discriminar quais são as atividades potencialmente danosas à integridade física e moral dos empregados.

Contrariamente, existiu vontade do legislador originário em se aplicar às pretensões indenizatórias dos empregados contra seus empregadores decorrentes de acidentes do trabalho ou doenças profissionais a eles equiparadas, a responsabilidade civil subjetiva, de acordo com o disposto no inciso XXVIII do artigo 7º da Carta Magna:

"XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este esta obrigado quando incorrer em dolo ou culpa."

Ora, tal vontade é clara: para que se haja o dever de indenizar deve ter concorrido o empregador com culpa ou dolo.

Ademais, pela supremacia das normas constitucionais no ordenamento jurídico é exigido que, na função hermenêutica de interpretação do ordenamento jurídico, seja sempre concedida a preferência ao sentido da norma que seja mais adequado à Constituição Federal.

Portanto, existente norma constitucional que expressamente determina a necessidade da verificação da culpa ou dolo nos casos em tela, deve ser observado o entendimento em conformidade à Constituição, da aplicação da responsabilidade civil subjetiva.

Qualquer entendimento contrário deve ser declarado inconstitucional e consequentemente retirado do ordenamento jurídico pátrio.

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1 Vide Súmula Vinculante 22 do STF: "A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional nº 45/04."

2 In Direito Constitucional - 27ª. ed. - São Paulo: Atlas, 2011. p. 45.

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*Advogado do escritório Do Val, Pereira de Almeida e Nascimento Advogados










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