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O asilo não é a salvação para Assange

O asilo concedido por Rafael Correa no Equador é uma falsa resposta a um problema muito mais complexo.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Atualizado em 20 de agosto de 2012 14:45

O asilo concedido por Rafael Correa a Julian Assange no Equador é só uma falsa resposta a um problema muito mais complexo, de difícil solução prática e de resultados imprevisíveis.

Concedido o asilo será necessário retirar Assange do prédio da Embaixada do Equador em Londres. Foi fácil entrar, mas será extremamente difícil deixar o local sem ser capturado pela polícia britânica. A embaixada equatoriana fica no primeiro andar de um prédio alto de tijolos vermelhos que abriga também apartamentos residenciais de particulares, localizado atrás de uma loja de departamentos da Harrods. O prédio tem várias entradas com portões e um estacionamento particular. Contudo, a embaixada não tem ligação direta com nenhuma das saídas laterais e nem mesmo com o estacionamento. A única ligação direta com a rua é pela saída principal do prédio onde viaturas da polícia britânica permanecem dia e noite há oito semanas, desde que a justiça britânica concedeu a extradição de Assange para a Suécia e ele refugiou-se na embaixada do Equador.

A solução seria o governo britânico conceder um salvo-conduto às autoridades diplomáticas equatoriana para que possam retirar Assange do prédio e conduzi-lo ao aeroporto. Entretanto, essa é uma expectativa demasiadamente ingênua e praticamente impossível de acontecer, porque enfraqueceria as decisões do Poder Judiciário inglês, comprometeria as relações externas com a Suécia e abriria um precedente perigoso para as autoridades britânicas.

Assim, não podendo sair pela porta principal, Assange poderia sair pela janela, mas há câmaras por todos os lados. Cogita-se que as autoridades policiais britânicas invadam a embaixada do Equador em busca do foragido, mas esta hipótese é arriscada porque, em primeiro lugar, o direito inglês autoriza esta possibilidade apenas para a captura de terroristas, o que não é o caso de Assange. Em segundo lugar porque a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas não permite esse tipo de conduta e as embaixadas gozam de imunidades de jurisdição e de execução relativamente aos poderes do país que as hospedam. Ademais, o fato de o governo britânico não reconhecer o asilo concedido pelo Equador não o autoriza a penetrar a embaixada em busca de Assange e não retira a legalidade e a legitimidade do asilo concedido por Rafael Correa em nível internacional.

Vê-se, portanto, uma situação de impasse na qual a política internacional falhou porque colocou frente a frente dois países que até então tinham boas relações. O mistério que fica diz respeito à força de Assange (e seus apoiadores) que conseguiram fazer o Equador comprar essa briga com o Reino Unido.

Vale a pena lembrar que o Senador boliviano de oposição, Roger Pinto Molina, temendo por sua vida e represálias do governo do seu país, está há dois meses foragido na embaixada do Brasil em La Paz. O Brasil já concedeu o visto, mas Evo Morales não deu o salvo-conduto para a retirada do Senador do país. Se os britânicos invadirem a embaixada do Equador em Londres, a Bolívia teria um precedente para fazer o mesmo na embaixada do Brasil? E qual seria a resposta da presidente Dilma?

Como se vê, o problema de Assange implica variáveis para as quais nem o direito interno inglês, nem o direito internacional têm respostas definitivas.

Fugir para o Equador não é uma saída honrosa para Assange. De corajoso e destemido divulgador de segredos de Estado e paladino da verdade, Assange acovardou-se na embaixada de um pequeno país distante, cujos dogmas e condutas ele sempre rejeitou. As alternativas políticas de Assange são deixar-se extraditar, defender-se em solo sueco do que não fez (ou fez) e se a Suécia for somente um trampolim para os Estados Unidos, que assim seja. Assange não deve temer a justiça; os tempos mudaram; os países envolvidos nesse imbróglio têm sólidas instituições democráticas, respeitam o devido processo legal, não estão interessados em vendetas políticas e o mundo inteiro vai acompanhar seu julgamento com olhos atentos. O "caso Assange" perdeu importância. Os governos não temem mais a divulgação de segredos de Estado e a imprensa faz o trabalho de Assange com a mesma desenvoltura.

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* Maristela Basso é advogada e professora de Direito Internacional da USP (Largo São Francisco)






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