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Reflexões sobre a redução da maioridade penal

O jovem entre 16 e 18 anos ainda está em formação, devendo assim ser tratado, seja quanto aos seus direitos, seja quanto as suas obrigações.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Atualizado às 09:16

Não é de hoje que o tema redução da maioridade penal está presente em calorosas discussões, tanto na imprensa, quanto no próprio convívio social, razão pela qual alguns pontos sobre este assunto merecem uma reflexão mais profunda, especialmente o problema da criminalidade juvenil.

O art. 228 da CF, bem como o art. 27 do CP e o art. 104 do ECA, estabelecem que os menores de 18 anos são inimputáveis, ou seja, a eles não se aplicam as penas criminais.

O ECA, em seu artigo 2º, define que adolescente é a pessoa entre doze e dezoito anos de idade, e criança é a pessoa de até 12 anos de idade. Aos adolescentes infratores são aplicadas as medidas previstas no art. 112 do ECA, que são as medidas socioeducativas, tais como: advertência, obrigação de reparar o dano, internação em estabelecimento educacional, dentre outras.

Verifica-se, portanto, a inexistência de qualquer conflito de normas, muito pelo contrário, o que existe é uma cristalina posição legislativa no sentido de que a lei penal será aplicada somente aos adultos, pela lei considerados os maiores de dezoito anos.

Porém, diariamente, a sociedade assiste espocar notícias nas quais jovens, principalmente com idade entre 16 e 18 anos, são acusados de cometerem crimes bárbaros, hediondos, inclusive portando armas de fogo, integrando associações criminosas e ceifando a vida de cidadãos.

Se assim o é, e tendo em vista a repetida utilização da legislação penal para tentar solucionar problemas sociais, a própria sociedade pergunta: qual o problema de se reduzir a maioridade penal, ou seja, de se punir um jovem de 16 anos como um adulto? O problema é muito mais complexo do que se imagina.

O jovem dos 16 aos 18 anos ainda é um indivíduo em formação, fato caracterizado claramente pela circunstância de ele ainda estar em idade escolar, ou seja, ainda está (ou pelo menos deveria estar) recebendo o conhecimento e os princípios que o definirão como cidadão adulto no futuro.

Nesse sentido, e reafirmando esse posicionamento, o voto as 16 anos é facultativo, ou seja, se este jovem quiser e se sentir preparado para escolher seus governantes, poderá fazê-lo. Porém para ser votado, a idade mínima ainda é de dezoito anos, isso no caso de vereador, para o qual se admite tenra idade.

Outro exemplo que corrobora esta posição é o próprio CC, que estabelece em seu art. 4º que os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos são relativamente incapazes, devendo, portanto, serem assistidos para a realização dos atos civis, sob pena de anulação, caso o ato seja realizado sem o assistente.

Assim, o que se verifica claramente é que todo o ordenamento jurídico encontra-se em consonância, no sentido de se concluir que o jovem entre 16 e 18 anos ainda está em formação, devendo assim ser tratado, seja quanto aos seus direitos, seja quanto as suas obrigações.

Ora, o jovem que comete um ato infracional (que é um crime praticado pelo menor de idade) poderá sofrer as medidas socioeducativas e, nos casos mais graves, até ser internado (como por exemplo na Fundação CASA em São Paulo), e lá, em tese, deverá receber um processo de educação. O problema é que essas unidades que deveriam auxiliar esse jovem, enfrentam enormes dificuldades, muito similares às enfrentadas pelos presídios de adultos (superlotação, violência, rebeliões, etc.).

Assim, por não se atingir o objetivo para os quais essas unidades foram criadas, busca-se uma solução fácil para um problema complexo, que se daria com a redução da maioridade penal dos dezoito para os dezesseis anos de idade, e o aprisionamento desses jovens com os adultos, nos miseráveis presídios brasileiros.

Na verdade, o que esses jovens necessitam é de educação, pois só assim terão oportunidades na vida. Lamentavelmente, o que se busca é simplesmente segregá-los o quanto antes do convívio social, trazendo assim uma sensação de "segurança" imediata, mas ocasionando um desastre no futuro.

Vale ressaltar, por fim, que o ponto principal de discussão deve ser o tempo de internação desses jovens nos estabelecimentos para adolescentes, pois hoje o prazo máximo de internação é de três anos, porém este período deveria ser maior e proporcional ao delito cometido.

Não existe outra saída. A mera redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos, por si só, não será a solução milagrosa para o problema da criminalidade juvenil. O que se faz necessário e urgente é o investimento na educação, para a formação dos adolescentes longe da criminalidade. Como ensinou Pitágoras: "educai as crianças, para que não seja preciso punir os adultos".

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* Luiz Flávio Filizzola D'Urso
é advogado Criminalista, pós-graduado em Direito Penal Econômico e Europeu pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal) em parceria com o IBCCRIM, membro da Comissão de Direito Penal da OAB/SP, membro da Comunidade de Juristas de Língua Portuguesa (CJLP) e integra o escritório de advocacia D'Urso e Borges Advogados Associados.

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