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O uso e abuso das tornozeleiras

As medidas cautelares, entre as quais o monitoramente eletrônico, substitui a prisão provisória quando esta poderia ser decretada.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Atualizado em 18 de junho de 2015 16:15

Desde meados de 2011 vigora em nosso ordenamento jurídico processual penal a lei 12.403/11, que trata da prisão preventiva e de outras cautelares penais. Com a vigência da referida lei o setuagenário Código de Processo Penal (Decreto-lei 3.689, de 3 de outubro de 1941) passou a admitir o uso de outras medidas - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares, proibição de manter contato com pessoa determinada, prisão domiciliar, suspensão do exercício da função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira, monitoração eletrônica, etc. - bem menos traumáticas e agressivas que a prisão preventiva, mas que de igual modo impõe restrições ao acusado.

A prisão preventiva que pode ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria, continua prevista em lei, mas deixou de ser a única medida da qual dispõe o magistrado para assegurar a ordem do processo. Agora, mais do que antes, entende-se que a prisão preventiva somente poderá ser decretada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, passando a ser a ultima ratio entre as medidas cautelares (cf. Flaviane de Magalhães Barros e Felipe Daniel Amorim Machado). Também não se deve admitir a decretação da prisão preventiva quando se tratar de crime cuja pena privativa de liberdade não seja superior a quatro anos, posto que nestes casos a pena privativa de liberdade poderá ser substituída por pena restritiva de direitos. Não faz nenhum sentido manter preso durante o processo alguém que ainda condenado não o será.

Importante destacar que as novas medidas cautelares que substituem a prisão preventiva somente devem ser decretadas atendendo aos critérios da necessidade e da proporcionalidade. Lembrando que as referidas medidas, tais como as prisões cautelares, têm natureza provisória e excepcional.

Nunca é demais lembrar que a Constituição da República (CR) abriga o princípio da presunção de inocência segundo o qual "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória" (art. 5º, LVII). Está assentado que em nosso sistema processual o status libertaris (estado de liberdade) é a regra e a prisão provisória, assim como as demais medidas cautelares, a exceção.

Como já dito, as medidas cautelares, entre elas o monitoramento eletrônico através das famigeradas tornozeleiras devem, também, obedecer aos critérios da necessidade, da proporcionalidade, da provisoriedade e da excepcionalidade.

As medidas cautelares, em especial o monitoramento eletrônico (uso de tornozeleiras) não podem ser utilizadas quando o acusado deveria permanecer durante todo o curso do processo, até o transito em julgado, em liberdade em razão do princípio da presunção de inocência. As medidas cautelares, ainda que menos gravosas que a prisão provisória, não cabe em substituição à liberdade, como já foi dito e repetido, a liberdade é a regra e como tal não precisa ser justificada. As medidas cautelares, entre as quais o monitoramento eletrônico, substitui a prisão provisória quando esta poderia ser decretada.

Maria Lúcia Karam alerta que "O monitoramento, introduzido com as pulseiras eletrônicas destinadas a controlar condenados cumprindo a pena e réus sob ameaça de sofrê-la, avança para outros campos e se soma especialmente às disseminadas câmeras de vídeo, transformando todo o território em que se movem os indivíduos - processados, condenados, suspeitos ou não - em um espaço observado por invisíveis agentes do Estado, particulares a seu serviço, ou quaisquer outros detentores de poder. O panóptico já não precisa se instalar em um lugar fechado, no interior dos muros da prisão, no interior da instituição total. O controle já pode estar por toda parte. A sociedade como um todo já pode ser a própria instituição total". (KARAM, Maria Lúcia. Monitoramento eletrônico: a sociedade do controle. Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 14, n. 170, p.4-5, jan. 2007).

Por fim, cumpre advertir que o uso excessivo de tornozeleiras é prejudicial à saúde.

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*Leonardo Isaac Yarochewsky é advogado criminalista do escritório Leonardo Isaac Yarochewsky Advogados Associados e professor de Direito Penal da PUC-Minas.

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