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Juízo de admissibilidade do impeachment, por Eudes Quintino e Antonelli Secanho

Juízo de admissibilidade do impeachment

O ato inicial deste procedimento é a formalização de uma denúncia, que pode ser ajuizada por qualquer cidadão, que esteja em dia com suas obrigações eleitorais, e que será analisada pelo presidente da Câmara dos Deputados.

domingo, 17 de abril de 2016

Atualizado em 15 de abril de 2016 11:32

A cada edição dos noticiários espalhados na imprensa brasileira, tem-se uma série de reportagens e análises sobre a grave crise, também política, que assola o país. E, como não poderia deixar de ser, o tema sobre o impeachment da Presidente da República ganha extrema relevância, tendo em vista que nossos representantes irão decidir, no dia 17de abril, sobre a prosseguibilidade do procedimento.

Dentre as inúmeras e valiosas abordagens que podem ser feitas sobre o tema, destaca-se uma peculiar similitude entre os procedimentos do impeachment e o do Júri, que possuem uma estrutura procedimental e de "julgamento" muito semelhantes.

Inicialmente, porém, reputa-se imperioso traçar-se algumas considerações, não sendo, porém, o espaço - tampouco a intenção - de esgotar-se o tema sobre o procedimento de impeachment.

Sendo assim, regulado pela lei 1.709/50, o impeachment refere-se à prática de crime de responsabilidade1, previsto nos artigos 85, da Constituição Federal, e 4º, da referida lei.

O ato inicial deste procedimento é a formalização de uma denúncia, que pode ser ajuizada por qualquer cidadão, que esteja em dia com suas obrigações eleitorais, e que será analisada pelo Presidente da Câmara dos Deputados. Uma vez aceita, é criada uma comissão especial, que decidirá se o relatório final, elaborado pelo parlamentar relator do procedimento, seguirá para votação no plenário da Câmara, ocasião em que os deputados deverão votar pelo seguimento ou arquivamento da denúncia.

Uma vez obtido o quórum de 2/3 (maioria qualificada) dos 513 deputados, o procedimento segue para o Senado Federal, oportunidade em que, somente nesse momento, será analisado o mérito da questão, isto é, o impeachment da Presidente.

Destaca-se que, no dia aprazado para o julgamento, presentes o acusado, seus advogados, ou o defensor nomeado a sua revelia, e a comissão acusadora, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, abrindo a sessão, mandará ler o processo preparatório, o libelo e os artigos de defesa; em seguida inquirirá as testemunhas, que deverão depor publicamente e fora da presença umas das outras (art. 27 da lei 1.079/50).

Vale observar, ainda, que:

Art. 33. No caso de condenação, o Senado por iniciativa do presidente fixará o prazo de inabilitação do condenado para o exercício de qualquer função pública; e no caso de haver crime comum deliberará ainda sobre se o Presidente o deverá submeter à justiça ordinária, independentemente da ação de qualquer interessado.

Art. 34. Proferida a sentença condenatória, o acusado estará, ipso facto destituído do cargo.

Art. 35. A resolução do Senado constará de sentença que será lavrada, nos autos do processo, pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, assinada pelos senadores que funcionarem como juízes, transcrita na ata da sessão e, dentro desta, publicada no Diário Oficial e no Diário do Congresso Nacional (artigos todos da Lei 1.079/50).

Em apertada síntese, é o que cabe destacar.

Desta forma, percebe-se que tanto o procedimento do Júri, quanto o do impeachment da Presidente da República, trazem pontos convergentes e provocam algumas reflexões.

Com efeito, ambos os procedimentos são escalonados, isto é, possuem duas fases distintas. No júri, a primeira fase (Judicium Accusationis), inicia-se com a denúncia e tem por termo final a sentença de pronúncia; enquanto a segunda (Judicium Causae), opera-se desta sentença de pronúncia até a decisão final, exarada pelo Conselho de Sentença (corpo de jurados).

Nesse passo, os jurados analisam as provas debatidas em plenário e decidem, de maneira imotivada, mas de acordo com suas consciências e os ditames gerais de justiça, (basta votar "sim" ou "não" quanto aos quesitos apresentados), pela absolvição ou pela condenação do réu que praticou crime doloso contra a vida (e os a ele conexos), igualmente o fazem os Deputados, ao formalizar a acusação, e os Senadores, na sessão de julgamento.

E, como já frisado, o procedimento do impeachment possui também duas fases distintas: a da formação da acusação (finalizada pela aprovação de mais de 2/3 dos deputados) e a conseguinte análise de mérito, cabível ao Senado Federal.

Além do mais, cidadãos que não possuem, necessariamente, a formação jurídica irão analisar questões cruciais: seja o mérito em si (senadores, para impeachment e jurados, no Júri), seja na formalização da acusação: deputados que fazem uma análise de admissão, mediante indícios de "autoria e materialidade", sem contanto adentrar no mérito da causa, tal qual o faz o Magistrado que pronuncia o réu, para que seja julgado pelo Tribunal do Júri.

Não se olvida, ainda, a fim de reforçar o caráter político da decisão de impeachment, do exemplo do ex-presidente Fernando Collor de Melo, que, após ter sido impedido de exercer suas funções, foi absolvido dos crimes (sob a seara penal) a ele imputados.

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1 A doutrina moderna entende que não se trata propriamente de crime, tal qual conceituado pelo Direito Penal, mas sim de uma modalidade híbrida de infração, pois tem natureza eminentemente política, com consequências jurídicas.
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*Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde. Advogado e reitor da Unorp.





*Antonelli Antonio Moreira Secanho
é assistente jurídico no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, bacharel em Direito pela PUC/Campinas e pós-graduação "lato sensu" em Direito Penal e Processual Penal pela PUC/SP.



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