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Recursos repetitivos no STJ e no STF : influência (mais do que jurídica) nas nossas vidas

Henri Matarasso Filho e Theotônio Negrão Neto

Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção.

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Atualizado em 16 de novembro de 2016 07:40

Desde 2008, há um importante instrumento criado e que está à disposição do nosso Poder Judiciário: o julgamento pela sistemática do artigo 543-C do CPC/73 dos carinhosamente denominados recursos repetitivos.

Até poderíamos dizer que este instituto começou a ser encabeçado em 2006, quando a lei 11.418 criou a possibilidade de análise pelo STF de um leading case para determinar se há ou não repercussão geral e se a conclusão alcançada se aplicará a todos os casos semelhantes.

A situação é na verdade um pouco diferente, mas o objetivo aqui não é abordar este ponto, já que o novo CPC (lei 13.105/15), em eu artigo 1.036, tratou de unificar a abordagem legislativa (Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do STF e no do STJ).

Bem, passemos ao objetivo desta publicação: qual é a importância desses julgamentos para vocês, jurisdicionado, advogados, juízes etc.?

Aliás, cabe aqui uma observação para que fique clara a questão: a justiça não existe para os advogados, juízes, promotores, procuradores etc. Estes apenas contribuem para que a justiça exista (e cumpra seus fins). A justiça, que nos perdoem os descrentes, é um dos principais pilares do Estado Deocrático de Direito e é o local onde todo cidadão que se sentir lesado poderá buscar abrigo e proteção.

Certamente você ou algum conhecido seu já precisou e a justiça (mesmo tardando) não fugiu de seu papel. Talvez a decisão final não tenha sido a melhor sob a sua concepção; ou pode ser que a interpretação dada pelo Poder Judiciário esteja efetivamente equivocada. Mas, sejamos justos, vivemos numa democracia e temos a convicção de que todas as armas estavam à disposição das partes e, no final, uma pretensão - seja a sua ou não - deverá prevalecer.

Passando, então, à resposta: esses julgamentos significarão (ou ao menos deverão representar) qual é a interpretação consolidada do Poder Judiciário sobre determinado tema da nossa legislação, constitucional ou infraconstitucional.

O STJ, entre outras competências, é a cúpula do nosso Poder Judiciário para as discussões que tratem de violação à lei infraconstitucional e para a pacificação de divergência de entendimentos sobre matéria infraconstitucional entre os tribunais (federais e estaduais). A palavra do STJ sobre isso deverá, em tese, ser a final e observada pelos demais julgadores (artigo 927 do CPC/15). Um recente exemplo é o REsp 1.551.951/SP (afetado pela sistemática do artigo 543-C do CPC/73), que trata de questões relacionadas à comissão de corretagem cobrada dos adquirentes de imóveis (na planta), à denominada taxa de serviços de assessoria técnico-imobiliária (SATI), bem como ao prazo de prescrição aplicável em casos com pedidos referentes ao tema.

Diante da pacificação de entendimentos sobre variados assuntos pelo STJ, restam dúvidas quanto à influência disso em toda a sociedade (e não apenas na comunidade jurídica)?

Outro tema de extrema repercussão e relevância é o do REsp 1.483.930/DF, em que o STJ definirá se o prazo de prescrição para cobrança das taxas condominiais é de 5 ou 10 anos. Só na cidade de São Paulo, quantos condomínios edilícios existem? Aliás, salvo melhor juízo, definida esta questão, a aplicação será para todos os tipos de condomínio. Quantos condomínios existem no Brasil?

O STF, por sua vez, é o órgão máximo do nosso Poder Judiciário, cabendo-lhe a palavra final em questões constitucionais . O STF, por exemplo, julgará matérias atreladas ao direito à vida, a direitos da personalidade etc.

Vale o adendo de que os temas mencionados compuseram matéria recursal. Ou seja, coube e caberá ao STJ (recurso especial: art. 105, III, da CF) e ao STF (recurso extraordinário: art. 102, III, da CF) a análise da matéria, através do julgamento de recursos interpostos de decisões dos tribunais locais.

Pacificado o entendimento pela sistemática de recursos repetitivos, a tendência é que a conclusão seja aplicada a todos os processos em curso que tratem do mesmo tema ou, ao menos, aplicada no momento em que tais processos aportarem no STJ ou no STF. Em outras palavras: solucionada a crise jurídica, a tendência é a estabilidade da jurisprudência (para além de sua uniformização) e a aplicação isonômica da solução encontrada em todos os casos análogos.

Com os entendimentos firmados pelo STJ e pelo STF, é possível a sua aplicação já em âmbito administrativo ou, até mesmo, em contratos. A observação espontânea, atenta e eficiente a esses entendimentos há de evitar inclusive novas demandas a serem propostas por aqueles que, vendo-se lesados, podem invocar judicialmente os entendimentos a seu favor. Este pode ser o caminho para a tão sonhada segurança jurídica.

Evidentemente, por outro lado, ser pacificada a discussão não significa que ela nunca mais poderá ser revista. Não podemos ser escravos das decisões, pois, é claro, a sociedade evolui e a tendência é que as leis e a sua interpretação também. A própria jurisprudência tem papel fundamental neste movimento. Assim, há instrumentos para a revisão dos entendimentos firmados, tais como a distinção (distinguishing) e a superação (overruling). Eventualmente, determinado entendimento poderá ser afastado por argumentos que ainda não foram analisados.

Enfim, não sustentamos que apenas os casos repetitivos devem ter a atenção da sociedade. A verdadeira intenção é chamar a atenção para este instrumento que já se aplica há quase uma década e cuja importância o novo CPC ressaltou ainda mais.
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*Henri Matarasso Filho e Theotônio Negrão Neto são advogados em SP.

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