MIGALHAS DE PESO

  1. Home >
  2. De Peso >
  3. Conselho Monetário Nacional regulamenta as fintechs especializadas em operações de crédito

Conselho Monetário Nacional regulamenta as fintechs especializadas em operações de crédito

Alessandra Carolina Rossi Martins, Ana Lidia Salvatore Frehse, Bruno Balduccini, Carolina Rocha Lima e Raphael Palmieri Salomão

O propósito da norma recém-criada é disciplinar as atividades das fintechs de crédito, empresas que utilizam de forma intensiva tecnologia no mercado de crédito, conferindo maior segurança jurídica as suas operações.

sexta-feira, 4 de maio de 2018

Atualizado em 3 de maio de 2018 10:02

O Conselho Monetário Nacional (CMN) editou na última quinta-feira (26/4) a resolução 4.656 (resolução 4.656/18), dispondo sobre a constituição e o funcionamento de duas novas modalidades de instituições financeiras especializadas em operações de crédito por meio de plataforma eletrônica: a Sociedade de Crédito Direto (SCD) e a Sociedade de Empréstimo Entre Pessoas (SEP).

O propósito da norma recém-criada é disciplinar as atividades das fintechs de crédito, empresas que utilizam de forma intensiva tecnologia no mercado de crédito, conferindo maior segurança jurídica as suas operações. Com o novo arcabouço regulatório, as fintechs de crédito poderão atuar na concessão de empréstimos e financiamentos diretamente, sem depender de parcerias com instituições financeiras tradicionais, como é feito nos moldes atuais.

Segundo o Banco Central do Brasil (Banco Central), busca-se com a nova medida fomentar a inovação no Sistema Financeiro Nacional (SFN), bem como elevar a concorrência e a competição entre as instituições financeiras provedoras de crédito, criando condições para a redução dos juros. A medida está inserida no conjunto de ações divulgadas pelo Banco Central no final de 2016, no âmbito do pilar "Crédito Mais Barato" da Agenda BC+, e foi objeto de ampla discussão com o mercado por meio do Edital de Consulta Pública 55/17, realizado no final do ano passado.

A seguir, destacamos os principais aspectos da nova regulamentação.

Sociedade de Crédito Direto (SCD)

O modelo de negócio da SCD caracteriza-se pela realização de operações de crédito e de aquisição de direitos creditórios, por meio de plataforma eletrônica, com recursos que tenham como única origem capital próprio, sendo-lhes expressamente vedada a captação de recursos junto ao público.

O arcabouço regulatório previsto para as SCDs é reconhecidamente mais simples, tendo em vista que tais instituições possuem escopo de atividades limitado e pouco complexo, atuando exclusivamente na concessão de empréstimos e de financiamentos, bem como na aquisição de direitos creditórios, sem alavancagem.

No entanto, vale destacar que a resolução 4.656/18 permite expressamente que as SCDs realizem a venda dos créditos relativos às suas operações para outras instituições financeiras, para fundos de investimentos em direitos creditórios (FIDCs)1 e para companhias securitizadoras2, possibilitando, dessa forma, a utilização de estruturas de securitização de créditos como alternativa de funding.

Sociedade de Empréstimo Entre Pessoas (SEP)

A SEP, por sua vez, atuará no modelo peer-to-peer, aproximando pessoas que querem emprestar daquelas que querem tomar crédito, exclusivamente por meio de negociação em plataforma eletrônica. A SEP, portanto, interpõe-se na relação entre credor e devedor, realizando, nas palavras do Banco Central, "uma clássica operação de intermediação financeira".

Com relação às especificidades das SEPs, a resolução 4.656/18 estabelece um arcabouço mais robusto, disciplinando a forma de intermediação da instituição junto a credores e devedores, bem como os mecanismos para a vinculação do risco de crédito das operações entre tais partes, entre outros temas.

O normativo deixa expresso que as SEPs, diferentemente das SCDs, não podem utilizar recursos próprios para a realização das operações de crédito, caracterizando a operação peer-to-peer.

No mesmo sentido, as SEPs, suas controladas e suas coligadas não podem, via de regra, reter direta ou indiretamente o risco de crédito das operações realizadas. Neste ponto, vale mencionar que o regulador, atendendo a solicitações do mercado, criou uma exceção e aceitou a possibilidade da SEP eventualmente reter uma pequena parcela do risco de suas operações, desde que atendidas certas condições previstas no normativo.

Vale também destacar que poderão participar como devedores nas operações intermediadas pelas SEPs apenas pessoas naturais ou jurídicas residentes e domiciliadas no Brasil. Os credores, por sua vez, poderão ser pessoas naturais, instituições financeiras, FIDCs3, companhias securitizadoras4 e pessoas jurídicas não financeiras. No entanto, vale destacar que os credores que não sejam investidores qualificados5 não poderão contratar com um mesmo devedor, na mesma SEP, operações que ultrapassem o limite de R$ 15.000,00.

Disposições Comum às SCDs e SEPs

As SCDs e as SEPs deverão ser constituídas sob a forma de sociedades anônimas, observando o limite mínimo de R$1.000.000,00 de capital social integralizado e patrimônio líquido.

Com relação à realização de serviços acessórios à concessão de crédito, tanto as SCDs quanto as SEPs estarão limitadas a um rol taxativo, o qual inclui: (i) análise de crédito para clientes e terceiros; (ii) cobrança de crédito de clientes e terceiros; (iii) atuação como representante de seguros na distribuição de seguro relacionado com as operações de crédito e (iv) emissão de moeda eletrônica.

Ambas sociedades terão seu funcionamento sujeito à autorização prévia pelo Banco Central, conforme processo descrito no novo normativo. Embora um pouco mais simples (não há necessidade, por exemplo, de um plano de negócios, mas apenas uma justificativa fundamentada) os requisitos em geral se assemelham àqueles já estabelecidos para instituições financeiras e instituições de pagamento, tais como identificação do grupo de controle, comprovação de capacidade econômico financeira e conhecimento técnico, bem como aprovação dos membros da administração.

No que tange à constituição do grupo de controle das SCDs e SEPs, cabe destacar que o normativo traz inovação importante para o SFN ao expressamente permitir que o controle societário de tais sociedades tenha participação de fundos de investimentos nacionais ou estrangeiros. A nova Resolução tem aplicação imediata, possibilitando aos interessados já darem início ao processo de autorização.

Por fim, as SCDs e as SEPs deverão atender a requisitos operacionais e prudenciais proporcionais e compatíveis com o seu porte e perfil, em linha com a segmentação do SFN definida pelo Banco Central. Caso tenham perfil de risco simples, elas poderão optar pela classificação no segmento S5 para fins de aplicação proporcional das regras prudenciais, cujos critérios foram adaptados pela resolução do CMN 4.657, também editada nesta quinta-feira última.

Comentário Final

A nova resolução traz maior segurança jurídica ao mercado de fintechs de crédito, com a regulamentação de sistemática própria para as operações realizadas neste novo mercado, de forma independente do mercado bancário tradicional. Esperamos que os processos de constituição e autorização ocorram em um tempo razoável, permitindo que as fintechs de crédito possam em breve iniciar as suas atividades no novo formato proposto pelas autoridades monetárias.

__________

1 Cujas cotas sejam destinadas exclusivamente a investidores qualificados, conforme definição da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) (vide nota de rodapé 5 abaixo).

2 Cujos ativos securitizados sejam destinados exclusivamente a investidores qualificados, conforme definição da CVM (vide nota de rodapé 5 abaixo).

3 Cujas cotas sejam destinadas exclusivamente a investidores qualificados, conforme definição da CVM (vide nota de rodapé 5 abaixo).

4 Cujos ativos securitizados sejam destinados exclusivamente a investidores qualificados, conforme definição da CVM (vide nota de rodapé 5 abaixo).

5 Nos termos da regulamentação da CVM, são considerados investidores qualificados, dentre outros, pessoas naturais ou jurídicas que possuam investimentos financeiros em valor superior a R$ 1.000.000,00.

__________

*Bruno Balduccini é sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.

*Raphael Palmieri Salomão é associado do escritório Pinheiro Neto Advogados.

*Alessandra Carolina Rossi Martins é associada do escritório Pinheiro Neto Advogados.

*Ana Lidia Salvatore Frehse é associada do escritório Pinheiro Neto Advogados.

*Carolina Rocha Lima é associada do escritório Pinheiro Neto Advogados.








*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2018. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS.

AUTORES MIGALHAS

Busque pelo nome ou parte do nome do autor para encontrar publicações no Portal Migalhas.

Busca