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Das arguições de litispendência e coisa julgada na fase de cumprimento de sentença

Quando uma das ações é julgada não há mais debate possível para a litispendência, devendo-se analisar, somente, a existência de coisa julgada.

segunda-feira, 21 de maio de 2018

Atualizado em 18 de maio de 2018 08:45

Para início do presente estudo é essencial destacar as definições das preliminares de litispendência e coisa julgada. Ambas decorrem do princípio constitucional da segurança jurídica, previsto no art. 5º, caput, da CF e auxiliam o Poder Judiciário a evitar decisões conflitantes, além de assegurar que os indivíduos não sejam demandados mais de uma vez por uma mesma questão. Em síntese, são elementos da paz social.

A definição está no art. 337, §§1º a 4º, do CPC, que prevê a ocorrência de litispendência quando se propõe ação processual ao mesmo tempo em que outra ação, idêntica, está em curso, enquanto que a coisa julgada ocorre quando se propõe ação que já foi julgada anteriormente. Nesse ponto já se pode destacar fato relevante: quando uma das ações é julgada não há mais debate possível para a litispendência, devendo-se analisar, somente, a existência de coisa julgada; e quando as duas ações são julgadas também não há debate de coisa julgada, levando a discussão para a seara da ação rescisória.

Para a identidade de ações referida é necessário que haja, de forma simultânea, identidade nos elementos da ação: personnae (partes), petitum (pedido) e causa petendi (causa de pedir). Se um dos elementos não é igual ao processo comparado, a litispendência e a coisa julgada devem ser afastadas.

Outro aspecto relevante é o enquadramento da litispendência e da coisa julgada como preliminares de mérito em contestação. Com isso, tornam-se defesas indiretas da questão final e questões de ordem pública, insuscetíveis de preclusão e podendo ser apreciadas, de ofício, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição1.

Ocorre que a arguição a qualquer tempo encontra limite na sentença. Quando confirmada a litispendência ou a coisa julgada o juízo deve extinguir o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC. Essa é uma das razões pela qual não é viável arguir litispendência ou coisa julgada na fase de cumprimento de sentença. Tais preliminares servem para evitar análise de mérito, e na fase de cumprimento de sentença já não há mais mérito a ser analisado. O tempo de insurgência, por essa via, passou.

O trânsito em julgado da sentença de mérito afasta quaisquer alegações e defesas possíveis em razão da eficácia preclusiva da coisa julgada, conforme art. 508 do CPC. Nisso se inclui a litispendência e a coisa julgada, pois perderam o sentido de ser quando prolatada a sentença de mérito. E ressalte-se, muito embora as alegações não apresentadas não estejam abrangidas pelos limites objetivos da coisa julgada, as arguições de litispendência e coisa julgada violam a coisa julgada pela intenção de desfazê-la e, portanto, não podem ser consideradas2.

Por fim, há de se observar que a litispendência e a coisa julgada não estão no rol de matérias passíveis de arguição na impugnação ao cumprimento de sentença, conforme art. 525, §1º, e art. 535 do CPC. Essas matérias apenas aparecem na contestação (art. 337, VI e VII, do CPC).

O meio de defesa para a situação apresentada (duas coisas julgadas) é a ação rescisória, somente. Muito embora a segunda coisa julgada não devesse existir, não poderá ser afastada pelo juízo através de base legal aplicável à fase de conhecimento (CPC 485 V), sob pena de banalização da ação rescisória, insegurança jurídica e violações a demais princípios constitucionais3.

Assim, conclui-se que é inviável a arguição de litispendência ou de coisa julgada na fase de cumprimento de sentença. Para alcance dessa conclusão foram estabelecidas as seguintes premissas: a) para discussão de litispendência é necessário que existam duas ações em fase de conhecimento; b) para a discussão de coisa julgada é preciso que haja uma ação em fase de conhecimento e outra em fase de cumprimento de sentença (ou com quitação); c) a eficácia preclusiva da coisa julgada impede análise de litispendência e coisa julgada extemporânea; d) litispendência e coisa julgada não estão no rol dos arts. 525, §1º, e 535 do CPC. A alternativa identificada para o enfrentamento da questão é a ação rescisória, com fundamento no art. 966, IV, do CPC.

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1 NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16.ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2016. p.1006.

2 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p.606.

3 NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16.ed. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2016. p.2054-2055.

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*Felipe Navarro Sessim do Amaral é advogado no escritório Barbieri Advogados.

 

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