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Inconstitucional - bloqueio sobre receita e penhora "on-line" na justiça do trabalho

A execução no processo do trabalho encontra respaldo legal na Constituição Federal, e em seus artigos 5º, XXXV, LV e 93º, IX; CLT, artigos 876 a 892.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Atualizado em 23 de fevereiro de 2010 10:30


Inconstitucional - bloqueio sobre receita e penhora "on-line" na justiça do trabalho

Débora Lins Cattoni*

A execução no processo do trabalho encontra respaldo legal na Constituição Federal (clique aqui), e em seus artigos 5º, XXXV, LV e 93º, IX; CLT (clique aqui), artigos 876 a 892.

Para o questionamento da execução, necessário se faz a garantia do juízo, seja pelo pagamento, seja pelas modalidades de bloqueio, penhora on-line ou a nova prática: penhora sobre receita.

As modalidades de garantias, aliadas à ausência de critério quanto a sua aplicabilidade por alguns juízes, têm como característica a celeridade sem, contudo, respeitar o princípio norteador do direito, afastando o direito de defesa do executado.

Portanto, é esperado que uma empresa com capital, muitas vezes bloqueado com valor superior à execução, se veja compelida ao imediato pagamento, não cabendo à mesma a opção de defesa quanto ao valor em discussão, deparando-se com seu direito tolhido.

É importante frisar, a diferença existente entre as modalidades em discussão, qual seja: penhora on-line, bloqueio e penhora sobre receita.

O Bloqueio e a penhora on-line se confundem quanto a sua aplicabilidade por alguns magistrados, ferindo o limite de competência formulado junto ao BACEN JUD, quando transferem a ordem de bloqueio para conta judicial, gerando, pois, a penhora on-line, extrapolando o limite dado ao aludido Convênio, visto que esse não contempla a penhora on-line, mas tão somente bloqueio, que se consuma com o bloqueio do valor, porém, mantendo esse na conta do executado.

Em artigo publicado na LTR 9, de setembro de 2004, sob o título "Penhora ou bloqueio on-line - questões de ordem prática- necessidade de aprimoramento", existe uma diferença conceitual entre bloqueio e penhora, no bloqueio, o valor permanece na mesma conta do executado, porém sem utilização, enquanto que na penhora on-line há a retirada do bem da esfera patrimonial do devedor, transferindo-o para conta judicial.

A penhora on-line, incontestavelmente ocupa o primeiro lugar na relação de preferência elencado no art. 655 do CPC (clique aqui) e no art. 11 da lei 6.830/80 (clique aqui). Sua preferência na Justiça de Trabalho toma espaço de forma agressiva, visando os magistrados com ela, o favorecimento da execução mais rápida e eficaz em prol do hipossuficiente.

Essa modalidade de garantia da execução foi sendo ajustada e melhorada até atingir seu ápice, quando o Banco Central firmou convênios em 05 de março de 2002 com o TST, o chamado Bacen/Jud. Nele o magistrado se comunica por via eletrônica, diretamente com o Banco Central e procede com o pedido de bloqueio em qualquer conta corrente ou investimento do executado, facilitando a celeridade na execução.

Vale observar que, se o executado nomeia um bem à penhora que não seja dinheiro, sem que haja recusa justificada por parte do credor, não há porque de pronto determinar o juiz que se proceda à penhora de conta corrente de forma "on-line". Essa visão restrita do juiz, no que se refere à celeridade na execução acaba também por violar as garantias constitucionais como: a preservação dos direitos patrimoniais; da livre-iniciativa e da função social da empresa, como geradora de emprego; e da própria economia nacional.

Acontece que a visão de celeridade na execução em prol do empregado, adotada em via de regra por alguns juristas, se sobrepõe ao princípio da execução menos onerosa para o devedor. Nesse mesmo diapasão, já decidiu o Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, in verbis:

"Na efetivação da penhora incumbe ao magistrado aferir as circunstâncias de cada caso concreto, e decidir com cautela e reflexão, mormente porque as normas instrumentais não possuem caráter absoluto, a ponto de afetarem a sobrevivência de uma firma ou o normal desenvolvimento produtivo do patrimônio do devedor". Agravo de Instrumento 438.283, 1ª Câmara, Rel. Juiz Renato Sartorelli, jul. 18/9/95, in JUIS- Saraiva, nº 7).

Contudo, a prática desmedida por parte de alguns juristas viola as garantias de ampla defesa e do sigilo bancário, contrariando, ainda, os princípios do contraditório e da execução menos onerosa, conforme prevê o artigo 620 do CPC. Isso sem falar que é uma postura em favor de um empregado em detrimento da sobrevivências de várias famílias.

Certo que, ao invocar o princípio da execução menos onerosa, registra-se pensamentos doutrinários como:

Humberto Theodoro Júnior: "Toda execução deve ser econômica, isto é, deve realizar-se da forma que, satisfazendo o direito do credor, seja o menos prejudicial possível ao devedor. Assim, "quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor."

Alcides De Mendonça Lima: "ainda que a execução seja realizada como resultado do exercício de um direito do credor, para satisfazer à obrigação assumida pelo devedor, nem por isso o sujeito passivo deve ser inutilmente sacrificado, quando, por outro modo que não o usado pelo sujeito ativo, seja atingido o mesmo objetivo quanto à solvência da prestação. O interesse social e a finalidade ética do processo exigem, sem dúvida, que a dívida (em acepção ampla) seja totalmente adimplida. Mas, nem assim o credor tem o direito de agravar a situação do devedor, no curso da execução, escolhendo meio mais oneroso do que outro que possa alcançar o mesmo alvo quer por ignorância como, geralmente, por má-fé, com a intenção preconcebida de lesar o devedor."

É fato incontroverso que, nada obstante, a penhora on-line acarreta vários inconvenientes, sobretudo, o constrangimento excessivo. É certo que a penhora indiscriminada do montante do débito, em várias contas do executado, compromete sua imagem e sua atividade econômica.

Contudo, conforme se vê no artigo 883, da CLT: "a penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora", ao contrário do que reza o dispositivo legal, muitas vezes é efetivado o bloqueio de uma ou de várias contas bancárias, cujo saldo supera em muito o valor do crédito trabalhista, o que acarreta o excesso de execução, restando impedido o executado de movimentações, causando com isso prejuízos irreparáveis que vão desde multas, capital de giro, a demissão em massa de funcionários, isso a depender do montante e porte da empresa executada. Portanto, caracterizado está o abusivo desse ato, haja vista que não atende o princípio da economicidade da execução, previsto no artigo 620, do CPC.

Contudo, a preservação da empresa deve sempre prevalecer, levando-se em consideração sua função social, sua contribuição para sociedade. É oportuno comentar que a função social da empresa motivou a recente alteração na lei que tratava da falência e concordata, oferecendo meios para se tentar a recuperação financeira da empresa.

Nesse particular, reina o entendimento jurisprudencial na Justiça do Trabalho, no sentido de admitir-se a penhora somente sobre parte da renda mensal ou faturamento da empresa, para que não haja comprometimento do desenvolvimento regular de suas atividades, além de garantir seu direito de ampla defesa.

Em se tratando de exceção, o TST tem em sede de Mandado de Segurança, no que tange à execução definitiva, exigido prova formal de que a penhora em conta comprometerá o funcionamento da empresa. Por outro lado, na execução provisória, a determinação de penhora em dinheiro, quando nomeados outros bens à penhora, fere direito líquido e certo da parte devedora.

Para surpresa, surge a mais nova modalidade de penhora, a penhora sobre a receita da executada, de forma desmedida adotada por alguns magistrados, não só levando a empresa ao constrangimento, como também à paralização de suas atividades, haja vista que não existe funcionamento sem, contudo, existir movimentação de recursos.

Isso sem falar que a empresa não só tem receita penhorada, como também tem que contar com o risco de rescisão de contrato com o cliente, visto que certo é sua exposição negativa perante o cliente.

Na atualidade, o mercado é muito criterioso, e tamanho constrangimento será suficiente para comprometer uma relação de negócios, onde a reputação da pessoa jurídica será levada em consideração.

É importante registrar que essa modalidade de penhora fere sua ampla defesa, inviabiliza sua responsabilidade social, assim como compromete os recursos e interesse de uma coletividade, uma vez que a penhora de rendimentos é a penhora da própria empresa, configurando, pois, o fumus bonis iuris e periculum in mora.

Como é sabido, a penhora deve ser efetuada em casos excepcionais e desde que haja condições que assegurem a continuidade da atividade operacional e social da empresa, o que leva a crer que essa modalidade, mesmo em seu caráter excepcional, deve afastar a empresa-executada de risco no se refere ao seu funcionamento e exposição perante a seus clientes.

Ademais, destacamos que a justiça deve primar pelo princípio da razoabilidade, equilíbrio das relações e situação entre as partes. O STJ dita que o bloqueio não poderá causar danos aos empregados da empresa, sendo, pois, violado preceito constitucional. Não se deve dirimir a controvérsia de um demandante em detrimento de tantos outros empregados, ou seja, para qualquer ato que envolva uma coletividade, deve ser analisada sua aplicação de forma comedida e razoável.

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*Sócia do escritório Lins Cattoni Advogados

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