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Retenção de depósitos judiciais pela Fazenda Pública: a estratégia utilizada é uma forma de coação por parte do Poder Público e vedação de acesso à Justiça

Marcela Nacur Vianna e Renata Toscano

Uma sorrateira estratégia conhecida como "retenção de depósitos judiciais" ameaça a segurança jurídica dos contribuintes que litigam contra o Fisco. A Fazenda Pública tem monitorado o andamento das ações em que há depósitos judiciais, objetivando a quitação de outros débitos tributários devidos pelos contribuintes por meio de bloqueio dos valores depositados.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Atualizado em 1 de fevereiro de 2011 10:54

Retenção de depósitos judiciais pela Fazenda Pública: a estratégia utilizada é uma forma de coação por parte do Poder Público e vedação de acesso à Justiça

Marcela Nacur Vianna*

Renata S. Toscano de Almeida*

Alguns tipos de ações judiciais exigem o depósito dos valores em discussão pelo autor. Nas demandas de natureza tributária, os depósitos judiciais têm ainda uma função de extrema relevância: a suspensão da exigibilidade do tributo em discussão.

Nessa sistemática, o contribuinte deposita judicialmente os valores questionados, em parcela única ou periodicamente, caso a prestação seja de cunho sucessivo. Sendo julgada improcedente a demanda, os valores são convertidos em renda em favor da Fazenda Pública, eximindo o devedor dos encargos advindos do atraso do pagamento. E, caso julgada procedente, os valores depositados podem ser levantados pelo depositante, corrigidos monetariamente pelo banco depositário.

Entretanto, uma sorrateira estratégia adotada pelas Fazendas Públicas, conhecida como "retenção de depósitos judiciais", ameaça a segurança jurídica dos contribuintes que litigam contra o Fisco.

A Fazenda Pública tem monitorado o andamento das ações em que há depósitos judiciais, objetivando a quitação de outros débitos tributários devidos pelos contribuintes por meio de bloqueio dos valores depositados.

Sendo a ação julgada favoravelmente ao contribuinte - hipótese em que lhe é permitido levantar o valor do depósito judicial no todo ou em parte, de acordo com o caso concreto - e havendo qualquer dívida deste para com um ente da Federação, a Fazenda Pública formula pedido ao juiz da causa para que, em vez de proceder à liberação do depósito, converta-o em seu favor, para fins de quitação de débitos tributários.

A Fazenda Pública sustenta o procedimento com base no artigo 655, inciso I, do Código de Processo Civil, e no artigo 9º, inciso I, da Lei de Execuções Fiscais (lei 6.830/80 - clique aqui), os quais expressamente prevêem o dinheiro como primeiro bem na gradação dos bens penhoráveis.

Infelizmente, algumas decisões judiciais têm dado abrigo à esdrúxula tese, fazendo dessa estratégia o "melhor dos mundos" para o Fisco. Com isso, a Fazenda Pública promove uma espécie de compensação não autorizada em lei, em flagrante ofensa aos princípios norteadores do ordenamento pátrio.

A difusão desta prática pode, inclusive, criar obstáculos ao acesso à Justiça, garantido constitucionalmente. Isso porque, não raramente as pessoas jurídicas promovem retiradas em seu capital de giro e/ou recorrem a empréstimos bancários para realizarem os depósitos judiciais.

O fato dos contribuintes, mesmo vencedores na ação judicial, virem-se cerceados do direito de reaver esses valores pode resultar, inclusive, na paralisação de suas atividades, trazendo-lhes irreparáveis prejuízos financeiros.

Importante registrar que a conduta do Fisco pode tomar uma dimensão ainda maior se considerarmos a adesão ao "Refis da Crise" em 2009, por meio da qual os contribuintes viram-se obrigados a desistir de eventuais ações judiciais nas quais discutiam o débito fiscal a fim de se beneficiarem dos descontos concedidos pelo governo Federal, para pagamento à vista ou parcelado, sendo-lhes permitido o levantamento dos depósitos judiciais realizados.

Frise-se que não há lei que autorize o procedimento adotado pela Fazenda Pública, que nada mais é do que uma forma de coação, visando única e exclusivamente à arrecadação, razão pela qual os contribuintes que forem prejudicados deverão buscar seus direitos, havendo várias decisões judiciais favoráveis, que reconhecem a ilegalidade e ilegitimidade desse bloqueio.

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*Advogadas do escritório Mauro Marcos de Castro Advogados Associados





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