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As decisões da AGC na Recuperação Judicial: há ou não soberania?

Ruy Coppola Jr

Advogado discute os limites da intervenção judicial em casos de recuperação e falência.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Atualizado às 09:11

Duas recentes decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo, mais especificamente de sua Câmara especializada em Recuperação Judicial e Falências, têm causado enorme controvérsia no cenário jurídico empresarial. Isso porque, ao contrário de tudo que já havia sido decidido a respeito do tema, e da posição doutrinária, a Câmara acabou por anular dois planos de recuperação judicial que haviam sido aprovados pelos credores nas respectivas Assembleias. As decisões são polêmicas vez que as anulações não ocorreram em nenhuma das hipóteses expressamente previstas na lei 11.101/05, como, por exemplo, a que estabelece limite tempo-ral para pagamento dos credores trabalhistas.

A questão, pois, está em se saber quais os limites de intervenção judicial nos planos de recuperação apresentados pelo devedor, ainda que aprovados pelos credores? É ou não a Assembleia soberana?

Sempre se disse que, respeitados os limites da legalidade, a decisão da Assembleia é soberana, estando o juiz, então, restrito ao exame dos referidos limites.

No entanto, é preciso se analisar o tema sob aspecto mais amplo, e não o da legalidade enquanto "texto de lei". A legalidade, in casu, deve abranger não apenas os limites legalmente estabelecidos para a confecção do plano, mas também todos os princípios regentes do sistema. E o que é sistema? Parafraseando Canotilho, podemos entender o direito como sistema quando o mesmo se remete, formal e materialmente, a uma norma fundamental, no caso a Constituição Federal.

Em outros países, o judiciário analisa o plano em confronto com princípios regentes, como, por exemplo, o best interest of the creditors, segundo o qual a proposta contida no plano deve ser mais benéfica aos credores do que a falência, ou seja, que eles receberiam mais aprovando a proposta do que em uma eventual decretação.

Voltando à polêmica, as decisões da câmara especializada do Tribunal de Justiça de São Paulo anularam os planos de recuperação por violação a diversos princípios e cláusulas gerais que integram o sistema jurídico pátrio. Poderia tê-lo feito? Sabemos que estamos metendo a "mão em vespeiro" mas, aos que entendem que não, que por mais esdrúxulo que seja o plano, a decisão da assembleia é soberana, meus sinceros sentimentos, pois enxergam no juiz, então, apenas um funcionário público "homologador", o que coloca em xeque a própria função judiciária, ao menos nesses processos, em um Estado Democrático de Direito. Para nós, a função do juiz nos processos de Recuperação Judicial está longe disso. A "soberania" das decisões assembleares não pode servir de argumento para violação de um sem número de direitos, a partir da não observância, para não dizer desrespeito, a princípios jurídicos norteadores de todo o sistema, tais como a boa-fé, a isonomia, e a proporcionalidade. Convém lembrar que os credores estão em situação delicada quando votam um plano em Assembleia: ou aprovam ou rejeitam, mas se rejeitarem, pelo texto da lei, estarão "decretando" a falência do empresário, e, como é sabido, a probabilidade de recuperação de seu crédito será bem menor. Disso, muitas vezes, se aproveitam os empresários na elaboração dos planos de recuperação, vez que, convenhamos, é um senhor argumento persuasivo: "melhor esse plano, assim, do que a falência". Não é esse o propósito da recuperação, bastando para tanto a leitura do art. 47 da lei 11.101/05, verdadeira declaração de princípios do sistema concursal. Não se pode pretender aprovar uma recuperação a qualquer custo, vez que os que aprovam hoje, ainda que movidos pelo receio, serão aquelas de quem esse custo será cobrado amanhã.

Nesse sentido, pois, palmas aos corajosos julgadores.

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* Ruy Coppola Jr é professor universitário e advogado da banca Coppola, Dutra Rodrigues e Gago Barbosa Advogados

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