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Interpretação das normas e o Zeitgeist

Um método interessante de interpretação da norma é o método histórico, no qual é preciso ter consigo aquilo que os germânicos chamam de Zeitgeist, ou o "espírito do tempo".

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Atualizado em 6 de fevereiro de 2013 14:51

Ocorre muitas vezes que, quando interpretamos uma norma jurídica, o fazemos de forma primaria, de acordo com nossos conceitos íntimos da realidade. Ou seja, interpretamos a norma (e tudo que nos rodeia) a partir de nossas próprias concepções, princípios, conceitos e valores. Eis a gênese da dificuldade em se interpretar as normas jurídicas.

Não há uma interpretação pura das normas, pois cada um traz em si conceitos e valores, e os projeta nesta exegese.

Contudo, pensarmos em uma interpretação livre de qualquer preconceito é muito perigoso, pois o direito nasce a partir dos valores, transcendentais e transitórios, que cada homem carrega em si.

Cientes que estamos de que não se faz possível uma interpretação pura de qualquer norma, pois, como dissemos, é dado ao homem projetar seus conceitos e valores a todo o seu exterior, nos é lícito, ainda, nos atermos a uma interpretação das normas que possa ultrapassar aquilo que trazemos em nosso intimo, para que alcancemos um conceito verdadeiro (ou próximo da realidade, dada nossa limitada percepção).

Um método muito interessante de interpretação da norma é o método histórico.

Mas para que se lance mão de uma interpretação histórica das normas, é preciso ter consigo aquilo que os germânicos chamam de Zeitgeist, ou o "espírito do tempo".

A intepretação histórica das normas se ocupa de analisar o contexto histórico, político, social, econômico, jurídico da sociedade, quando da edição da norma, para que se tenha consciência de qual era a finalidade, a mens legis, daquela época, para que se possa, após, entender a realidade atual, e aplicar a norma dentro desta realidade. Não podemos esquecer que as normas são criadas num contexto e são aplicadas em outro. A sociedade muda constantemente, embora ignoremos tais transformações quando da exegese e aplicação das normas jurídicas. Tais métodos devem ser aplicados tanto às normas positivas quanto aos princípios jurídicos que, mister frisar, representam o lado transcendental do direito.

E o Zeitgeist representa tudo isto. Zeitgeist (pronúncia: tzait.gaisst) é um termo alemão cuja tradução significa espírito da época, espírito do tempo ou sinal dos tempos. O Zeitgeist significa, em suma, o conjunto do clima intelectual e cultural do mundo, numa certa época, ou as características genéricas de um determinado período de tempo1.

Zeitgeist representa o espírito do tempo. Do tempo no qual as normas foram editadas. Representa todo o contexto histórico, político, econômico e social ao tempo da edição da norma. Não podemos entender as normas, e mesmo o Direito, dentro de um único contexto.

Um exemplo bem interessante é o da atual preocupação com a efetividade dos princípios da celeridade do processo e economia processual. Quando da edição Código de Processo Civil, publicado no ano de 1973, não havia uma preocupação com a celeridade do processo e economia processual como temos nos dias atuais, principalmente após a edição da Emenda Constitucional 45, do ano de 2004. Logo, devemos entender toda a lei processual dentro destes contextos (e não somente aquelas normas que foram introduzidas na lei processual após a EC 45), do contexto atual e do contexto histórico, para que possamos aplicar à norma antiga uma necessidade atual.

A interpretação das normas, desta forma, não é somente uma intepretação jurídica. É uma intepretação histórica, política, social, econômica, do tempo em que foi lançada ao mundo jurídico e do tempo de sua aplicação. A intepretação histórica, e o Zeitgeist (que poderá lhe ser instrumento) são uma valiosa fonte de exegese e aplicação das normas jurídicas, pois vemos todos os dias que normas aplicadas somente em seu sentido jurídico não fazem aplicação justa e acertada com a realidade social.

E que deixemos de interpretar a norma jurídica como interpretamos a vida, onde cada um interpreta a partir de seus próprios conceitos e valores, que, aplicados ao outro, não trazem resultado algum.

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1Fonte: Wikipédia

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* Mário Henrique da Luz do Prado é advogado do escritório JBM Advogados

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