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Que faz o Papa no mundo?

Papas itinerantes como João Paulo II, Bento XVI e agora Francisco deixaram o "prisioneiro sagrado do Vaticano", para viajar sem parar pelo mundo.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Atualizado em 30 de julho de 2013 12:04

Boa pergunta. A partir de João Paulo II, o papa começou a estar mais fisicamente presente no mundo. Deixou de ser o prisioneiro sagrado do Vaticano, para viajar sem parar por todos os países. Não mais lhe basta estar presente no mundo somente pela palavra, pelas orações e as encíclicas. João Paulo II, Bento XVI e agora Francisco são papas itinerantes que fazem questão de afirmar fisicamente sua universalidade, multiplicando seu contato físico com a multidão de fieis em todas as nações.

O papa é o chefe supremo da Igreja católica. E católico, como sabemos, significa "universal" (do grego katholikós). Ou melhor, e com mais rigor, "que tem vocação de universalidade". Tal vocação nem sempre se cumpre, mas faz parte da condição de papa, de forma real ou virtual.

O papa mostra com toda força sua universalidade ao abrir os braços com largueza, anunciando a benção urbi et orbe (à cidade de Roma e ao mundo). Na beleza desse simples gesto, a intenção de universalidade se anuncia com mais plenitude simbólica do que com palavras ou até com ações (que são sempre pontuais e limitadas).

Por força de sua universalidade, o papa é o máximo representante do poder espiritual no Ocidente. O Ocidente conta com dois órgãos ou instituições representativas do poder espiritual: a Igreja Católica e a Universidade (que foi gerada nas entranhas da Igreja). A Universidade já não responde à sua titularidade original, pois está cada vez mais dividida e fragmentada pela ideologia. Resta apenas a Igreja católica, também ameaçada de divisão, mas ainda capaz do esforço para salvar sua integridade, como agora presenciamos.

A diferença entre o poder espiritual e os poderes temporais, a economia, a política, a ciência, o direito, etc., é que estes são excludentes. Economia de mercado ou de Estado, política de esquerda ou de direita, ciência ou fé, direito pró-indivíduo ou pró-sociedade, liberdade ou igualdade? Sempre uma coisa ou outra. Ou isto ou aquilo. Ao passo que o poder espiritual, por força de sua universalidade, é um poder essencialmente inclusivo, no qual as exclusões e as contradições da ordem temporal se incluem umas às outras. Na cúpula do poder espiritual se une e se concilia tudo o que está separado e em conflito na base temporal. O poder espiritual representa a convergência entre os opostos.

No seio do poder espiritual, dão-se as mãos o mercado e o Estado, a direita e a esquerda, o indivíduo e a sociedade, a liberdade e a igualdade, a ciência e a fé. Não mais se excluem um ao outro, sim que se integram e se completam, vencendo a barreira das ideologias de modo a possibilitar a convivência pacífica e fecunda entre os contrários.

Se as coisas andam tão mal, se o mundo está fora de prumo é devido a essa polarização obstinada e falsamente excludente, de fundo cegamente ideológico, que trava a marcha e a fluência do vir a ser. Pois o chefe supremo da Igreja, o Papa, é o regente das vozes isoladas que soam, cada uma a seu modo, no campo temporal.

Razão tem aquele pensador ao sentenciar que "os extremismos são o freio da história" (Julián Marías).

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* Gilberto de Mello Kujawski é procurador de Justiça aposentado, escritor e jornalista.


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