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A Organização Internacional do Trabalho e a ausência de aplicabilidade de seus valores em âmbito nacional

Juliana Pelluchi Pinheiro

No Brasil, a justiça do trabalho foi instalada em 1941, e a partir de 1950 a OIT passou a ter representação.

sábado, 25 de janeiro de 2014

Atualizado em 24 de janeiro de 2014 14:00

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) é uma agência das Nações Unidas que tem como intuito a promoção de oportunidades de trabalho decente e digno a homens e mulheres em todo o mundo. Criada em 1919 e incorporada à ONU após sua criação em 1946, tem como base a justiça social (construção política baseada na solidariedade e igualdade).

É responsável pela aplicação e formulação de normas internacionais do trabalho e, para tanto, possui estrutura tripartite composta por representantes de governos, empregadores e trabalhadores. As convenções elaboradas passam a fazer parte do ordenamento jurídico do Estado membro após a devida ratificação por este, que deve zelar por seus valores (trabalho é fonte de dignidade; trabalho não é mercadoria; pobreza é ameaça à prosperidade; todos os seres humanos têm direito a bem estar material com liberdade, dignidade, segurança e igualdade de oportunidades) e efetividade.

A ratificação de uma convenção da OIT acarreta a obrigação de submeter-se aos procedimentos destinados a controlar a sua obrigação, sendo cada país obrigado a apresentar relatório sobre as medidas adotadas, no plano jurídico e na prática, com vistas a aplicar as convenções ratificadas.

No Brasil, a justiça do trabalho foi instalada em 1941, e a partir de 1950 a OIT passou a ter representação, sendo que suas precípuas finalidades são o combate ao tráfico de pessoas para fins de exploração sexual, combate ao trabalho forçado e infantil, além do intuito de promoção de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres e labor decente aos jovens.

Para este órgão, trabalho decente seria trabalho produtivo adequadamente remunerado e exercido em condições de liberdade, equidade, segurança e sem qualquer tipo de discriminação. Percebe-se, desta forma, os belos intuitos advindos deste órgão, cujas intenções são as melhores. Contudo, como a maioria dos acontecimentos na área jurídica, infelizmente ainda inexiste efetividade aos valores propagados.

Qualquer causídico militante na área trabalhista estaria contente e realizado se seu trabalho fosse o de, realmente, ajuizar reclamações trabalhistas em face de empregadores que humilham seus funcionários, os colocam em condições análogas às de escravo ou não cumprem com as já ultrapassadas regras estabelecidas na CLT. No entanto, o que se vê é um "salve-se quem puder", tornando o labor em favor de reclamadas extremamente desprestigiado, mal remunerado e longe da satisfação que os advogados, também como trabalhadores, deveriam obter.

O dia-a-dia nesta especializada é completamente desmotivador, porquanto, infelizmente, dado o desvirtuamento de valores e a ausência de qualquer penalidade a Reclamantes que propõem verdadeiras aventuras jurídicas, a Justiça do Trabalho se tornou efetiva fonte de renda. Decerto que sua criação foi visando a proteção do trabalhador, elo supostamente mais fraco desta cadeia, contudo, verifica-se o efetivo abuso deste direito na atualidade, com a propositura de demandas flagrantemente infundadas sem que haja qualquer custo ou penalidade ao reclamante.

Não se afaste, certamente, a postura de advogados que muitas vezes influenciam seus clientes e requerem, em peça exordial, muito além do que é devido, extrapolando os limites da ética processual. Estes, em total afronta ao Código de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil, não hesitam em colocar anúncios em jornais com aberta e clara apologia ao instituto da Rescisão Indireta, o qual deveria ser reservado a situações extremas e completamente insustentáveis, mas é solicitado sem qualquer escrúpulo ou fundamento.

E não é só! Em seara nacional, verifica-se ademais, a total banalização do instituto do dano moral, o que gera o ajuizamento de incontáveis e infundadas demandas, sempre em valores estratosféricos, o que apenas demonstra o intuito de obtenção de renda fácil.

Hoje, vivemos tempos do "politicamente correto" em que tudo afeta, tudo constrange, tudo molesta, tudo traumatiza e tudo causa dano moral. Será que causa mesmo? Ou será que é apenas uma ótima oportunidade para se conseguir algo mais? Por essas e outras, os militantes da justiça do trabalho que se veem obrigados a ler as mais incoerentes iniciais de reclamantes melindrosos e extremamente sensíveis laboram cada vez mais desmotivados.

Não há como se comparar o labor em efetivas condições análogas às de escravo, jornadas de 16 horas diárias e outros problemas para os quais a especializada foi criada para combater com os pretensos problemas alegados diariamente pelos reclamantes em suas ações, os quais redundam em pedidos de indenizações por inexistentes danos morais justificados pelas mais absurdas e ridículas alegações.

Enquanto não se alterar a mentalidade dos trabalhadores para as diferenças existentes entre o elastecimento de uma jornada em 15 minutos ou oito horas; enquanto qualquer educada chamada de atenção for considerada suficiente para o abalo moral indenizável em quantias lotéricas e enquanto qualquer deslize do empregador motivar a aplicação de penalidades sem que o inverso ocorra, estaremos extremamente distantes de alcançar as finalidades buscadas pela OIT, já que, ao que parece, o trabalho decente, para muitos trabalhadores, é apenas o recebimento de salário sem qualquer tipo de contraprestação ou comprometimento.

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* Juliana Pelluchi Pinheiro é advogada em SP.

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