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E o que fazer com a corrupção?

Juliana Picinin

Em torno dos recentes escândalos brasileiros, muitos esperam punições exemplares e que representem o grito de "basta!". A questão é discutir até que ponto uma condenação simbólica se mostra juridicamente adequada.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Atualizado em 3 de dezembro de 2014 16:56

Esse é o assunto de maior projeção no Brasil e o que mais tem repercutido no estrangeiro sobre nossa pátria amada.

Não somente pela afetação às nossas relações internacionais, mas porque além de nossas fronteiras as consequências concretas poderão existir.

Desde a década de 70 que nos EUA a legislação estabeleceu parâmetros para o julgamento de atos de corrupção, decorrentes do famoso Watergate. Decorrente disso, a legislação conhecida pela sigla em inglês FCPA estabeleceu consequências a atos praticados no estrangeiro. Por força disso, as ações tomadas aqui e que guardem ligação com a confiabilidade de empresas americanas, associadas ou afiliadas às brasileiras, levam a consequências além de nossas fronteiras. Não é por menos que os EUA assistem com preocupação os destinos da Operação Lava Jato.

Que podem ser autoridades e entidades brasileiras lá processadas, o futuro o dirá, mas não temos dúvida de que é possível.

A questão é saber das consequências - se haverá cumprimento das decisões americanas no Brasil ou se essas pessoas responderão às sanções diretamente na terra do Tio Sam.

Para a homologação de sentenças estrangeiras será necessário seguir resolução do STJ (onde o processo tramitará), desde que presentes os requisitos mínimos: haver sido proferida por autoridade competente, ter sido dada a oportunidade de os processados responderem pessoalmente, ser uma decisão definitiva, ter sido trasladada ao português por tradutor oficial ou juramentado, além de autenticada por cônsul brasileiro. Depois disso é que se começa a fase de execução.

Quanto ao cumprimento da pena em terras americanas (assim como em qualquer país do mundo), não poderá haver extradição do brasileiro nato (o que não impede cumpra a pena se adentrar, por livre espontânea vontade, em solo estrangeiro). A CF é clara, ainda, quanto aos casos de extradição possível ou vedada: "nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei" e "não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião". Além dessas condições e em nome da soberania nacional, o Brasil não estará vinculado à discussão de eventual extradição se com o país solicitante não houver tratado firmado com esse caráter específico.

Portanto, responder fora ou dentro do Brasil depende - como se espera sempre - de lei clara que determine hipóteses e consequências.

O fato é que em torno dos recentes escândalos brasileiros muitos esperam punições exemplares e que representem o grito de "basta!". Pretendem as vozes populares que anos de revolta à opressão, vinda de todos os lugares, sejam extravasados nessas decisões.

A questão é perguntar - e o debate não termina aqui - até onde essa condenação simbólica se mostra juridicamente adequada. Não se pretende com isso afirmar que não devam existir condenações se provadas as responsabilidades. Ao contrário. A toda culpabilidade, uma sentença.

A grande indagação - antipática aos ouvidos populares, sabemos - é se há justiça se feita pelo justiceiro e até onde não lançamos às chamas, como no tempo das ordálias, os processados e salve-se quem puder. Não por menos se mostra adequada a expressão caça às bruxas.

Queremos um Brasil melhor, mas com sensatez, por quem comete ou julga.
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*Juliana Picinin é coordenadora do departamento de licitações e compliance do escritório Décio Freire e Associados. Professora de Direito Administrativo do IBMEC e mestre e doutoranda em Direito Constitucional.

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