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Projeto sobre prisões em flagrante em SP: eficiência sob medida de Justiça

Projeto sobre prisões em flagrante em SP: Eficiência sob medida de Justiça

Revela-se salutar o referido projeto, vez que tende a dar "o pontapé inicial" para uma abordagem mais efetiva, a fim de trazer mais Justiça às prisões em flagrante.

domingo, 25 de janeiro de 2015

Atualizado em 23 de janeiro de 2015 11:42

O ano de 2015, apesar dos indesejáveis pacotes econômicos, dos sequenciais apagões e da queda constante dos reservatórios do Cantareira, parece começar de uma maneira remansosa e bastante interessante, ao menos no campo do Direito Processual Penal, na cidade de São Paulo. Em um projeto de iniciativa do novo Secretário de Segurança Pública de São Paulo, Alexandre de Moraes1, com a participação do TJ/SP e do CNJ, vislumbra-se maior celeridade em um ponto crucial do ordenamento jurídico: as prisões em flagrante delito.

Sendo assim, o projeto em análise consiste na criação da denominada "Audiência de Custódia"2, que servirá para o juiz de direito analisar, em até 24 horas após a efetivação da prisão em flagrante, os fatos e fundamentos da detenção, previstos nos artigos 302 e seguintes do CPP.

Inicialmente, cumpre destacar uma preocupante realidade brasileira: em inúmeros casos, o indivíduo preso em flagrante permanece por um longo período sem contato com o magistrado e às vezes tem sua prisão convertida em preventiva. Logo, tamanho lapso temporal, sem a análise imperiosa de um juiz, fere não somente o ordenamento pátrio (artigo 306, do CPP), bem como normas internacionais - Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de San José, da Costa Rica), ao qual o Brasil subscreveu e exige a realização de uma audiência logo após a efetivação da prisão em flagrante, justamente para que um magistrado possa analisar seu cabimento e, em caso negativo, tomar as medidas cabíveis.

Desta forma, revela-se salutar o referido projeto, vez que tende a dar "o pontapé inicial" para uma abordagem mais efetiva (celeridade e legalidade), a fim de trazer mais justiça às prisões em flagrante. Ali permanecerá ou terá sua prisão convertida em preventiva somente quem de fato se amolde às exigências legais para tanto.

Igualmente, não se pode esquecer que outros órgãos precisam acompanhar a Audiência de Custódia, também a fim de conferir maior legitimidade, além de fiscalizar a lei ou os interesses do acusado. Com efeito, a presença de um membro do Ministério Público, bem como do advogado (na falta dele, um Defensor Público), se faz mister para acompanhar o feito e requerer o que de direito, sob pena de nulidade do ato: a falta de qualquer deles fere claramente o princípio do contraditório e da paridade de armas, além da ampla defesa.

Além do mais, a Audiência de Custódia converge de forma louvável e vai ao encontro das inovações implantadas pela lei 12.403/11: as medidas cautelares diversas da prisão, conforme artigo 319, CPP:

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável e houver risco de reiteração;

VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX - monitoração eletrônica.

Quer-se com isto dizer que, na referida audiência, após ouvir o promotor e defensor, poderá o magistrado optar desde logo pelas modalidades de medidas cautelares, recomendada para cada caso. Logo, confere-se extrema eficácia à audiência, trazendo mais justiça a quem não se encontre nas exigências para ter contra si decretada uma prisão cautelar.

Por outro lado, caso seja comprovado que se trata de um caso amoldado aos artigos 312 e 313, ambos do CPP, o juiz já poderá decretar a prisão preventiva, fundamentando sua decisão (artigo 315, CPP), como forma de plena legalidade do ato.

Conclui-se, assim, que o passo inicial para maior eficácia da prestação jurisdicional foi dado. Ainda que se trate de um projeto piloto, que certamente será melhorado após sua implantação na cidade de São Paulo, há que se louvar a iniciativa, que busca verdadeiros "upgrades" em nosso processo penal.

Por fim, não há que se falar em ilegalidade da medida, tendo em vista que nossa Constituição Federal confere competência concorrente3 (permissão aos Estados, portanto) para legislar sobre procedimentos em matéria processual. Não se trata de instaurar novo rito processual, ou alteração de um já existente. A Audiência de Custódia se dará na fase inquisitorial, tão logo instaurado o inquérito policial pela prisão em flagrante delito. Secundum legem, portanto.

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1 (Clique aqui)

2 (Clique aqui)

3 Art. 24, XI, CF/88

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*Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde, advogado e reitor da Unorp - Centro Universitário do Norte Paulista.


 

 

 

 

 




*Antonelli Antonio Moreira Secanho é advogado, bacharel em Direito pela PUC/Campinas e pós-graduação "lato sensu" em Direito Penal e Processual Penal pela PUC/SP.

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