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Terceirizar?

Quem terceiriza busca economizar, busca reduzir gastos. Quem for submetido a esse tipo de contratação com certeza terá reduzidos os seus direitos.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Atualizado em 14 de maio de 2015 14:32

Não é de hoje que ouvimos no mundo do trabalho a palavra terceirização. Normalmente ela está ligada a situações precarizadas nas relações trabalhistas, onde o resultado mostra direitos sendo sonegados, trabalhadores vivendo situações de humilhação, com constante redução de garantias para a manutenção de sua condição de emprego.

Quem terceiriza pode buscar sim uma atividade técnica muito específica, mas na maior parte das vezes quem terceiriza busca a chamada redução de custos.

Reduzir custos significa ter um prestador de serviços que estará oferecendo como seu produto a mão de obra, com valores menores do que determinada empresa pagaria se efetivamente contratasse seus empregados.

O resultado disso é um só: empresas que na maior parte das vezes não respeitam direitos consagrados dos trabalhadores, que pagam salários menores, que impõem jornada de trabalho superior ao normal, onde horas extras normalmente têm seu pagamento ignorado, e, em muitas das vezes, empregados que em determinado momento se deparam com a falta de pagamento de salários, e na sequência o desaparecimento da empresa.

O TST, por analisar reiteradamente situações assim, editou a sumula 331, na qual reconhece como possível essa intermediação de trabalho para as atividades meio e não aquelas que observam a finalidade da empresa.

Por sua vez, o Congresso Nacional desde 2004 se depara com a discussão do PL que leva o número 4.330. Coincidências da vida, esse era o número da lei de greve dos tempos da ditadura, sempre utilizada para reprimir as iniciativas dos trabalhadores.

Um PL que dorme por mais de 10 anos nos escaninhos da Câmara dos Deputados, cujo autor sequer hoje ocupa mandato eletivo. Nesta nova legislatura, sob o comando do deputado Eduardo Cunha, os escaninhos e sonhos conservadores ressurgem à pauta de discussões, e, não poderia faltar a retomada da pauta relativa à terceirização.

Se olharmos as opiniões de quem trata do tema, isto é, MPT, Fiscais do Trabalho, Juízes do Trabalho, estudiosos do tema, vamos sempre nos deparar com a contenção dessa discussão, com a inapropriedade de ampliar as possibilidades de terceirizar. Da situação de risco de impor ao Direito do Trabalho uma condição de desequilíbrio, onde as relações impositivas de norma flexibilizadora tornariam o mesmo até inócuo.

Sempre é bom lembrar que na CLT temos as condições legais para o mundo do trabalho, que hoje já se aplicam a terceirizados ou não, mas na CLT vamos ter as condições que regulam a estrutura sindical do país. Onde as categorias econômicas ou profissionais são organizadas de acordo com a atividade da empresa, isto é, se a empresa atua na atividade industrial da metalurgia e você trabalha numa empresa que produz peças você faz parte da indústria metalúrgica. Você trabalhando numa empresa de prestação de serviços, não importa que você esteja trabalhando na metalúrgica ou no banco, você não será nem metalúrgico, nem bancário, será um prestador de serviços.

E é exatamente esse o tópico de diferenciação e maior exploração na terceirização. Alterando o enquadramento sindical, as condições de trabalho não são reguladas pelas normas atinentes a categoria da empresa que contrata serviços na terceirização. Isso sem dúvida facilita o que chamamos de precarizar as relações de trabalho.

Feitas essas ponderações, voltamos à toada de nova caminhada do projeto 4.330. Desde 7 de abril último, os deputados retomaram a discussão do projeto. No dia 8 aprovam o texto defendido pelo relator, autorizando a terceirização, no dia 22 de abril, completam a votação, conseguindo a proeza de piorar o que já era ruim.

A terceirização poderá ocorrer na atividade meio e fim da empresa. Se um banco resolve terceirizar seus gerentes e seus caixas, basta contratar uma empresa terceira para isso. Podemos ter uma situação onde alguns sejam contratados diretamente pelo banco e outros por uma empresa terceira. O que significa isso? O funcionário do banco poderá, conforme a convenção coletiva, receber o salário normativo da categoria para exercer a atividade de escriturário, o qual hoje é equivalente a R$ 1.638,62, por sua vez o banco poderá contratar um funcionário através de uma empresa terceira e nesse caso o salário do mesmo terá que respeitar tão somente o salário mínimo de R$ 788,00.

Mas os deputados e os meios de comunicação anunciam que existe a garantia de respeito aos direitos das categorias? Sim, existe essa previsão, mas o projeto aprovado prevê esse similar desde que a categoria econômica seja a mesma entre terceirizada e contratante, ou seja, se o banco contratar outro banco para prestar serviços às normas legais que são pertinentes a essa categoria devem ser observadas. Como é pouco provável, para não falarmos impossível isso ocorrer, é notório que as condições de contratação serão diferenciadas, mas não só, no caso do exemplo, o bancário terá jornada máxima de 6 horas (30 horas semanais), enquanto que o terceirizado de 44 horas semanais.

Mas na aprovação final da Câmara, os senhores deputados foram um pouquinho além dessas condições ao retirarem que iguais direitos também corresponderiam àqueles previstos nos acordos e convenções coletivas, pois somente existiria os mesmos direitos dentro de um mesmo setor econômico, com a respectiva exclusão das normas negociadas.

Por sua vez, a empresa, ao terceirizar, poderá se valer de contratar uma empresa constituída para tal, mas também poderá se valer de uma associação, organização, pessoa jurídica individual.

Pessoa jurídica individual? Aquelas empresas em que a pessoa individual constitui como prestadora de serviços? Isso mesmo! As chamadas PJs estão autorizadas a firmarem contratos de terceirização. Imaginemos que um banco resolva contratar seus gerentes via PJ. Isso será possível, desde que após 12 meses de término da relação empregatícia isso venha a ocorrer (em 8 de abril o prazo para que isso ocorresse era de 24 meses, em menos de 20 dias um ano foi reduzido), sendo que para os aposentados esse prazo não é observado.

Mas qual diferença de ser terceirizado via contrato com uma empresa prestadora de serviços e ser PJ? PJ é uma empresa, ou seja, quando da contratação teremos um contrato entre duas empresas, e, nessas condições as cláusulas contratuais é que vão reger a situação das partes, o que significa que uma PJ poderá firmar um contrato só com pagamento de comissões por vendas, com fixação de valor inferior ao salário mínimo, até porque não cabe se falar em salário nesse tipo de relação. Já o empregado terceirizado via empresa tem contrato de trabalho. Esqueça nessa opção de contrato vale transporte, férias, 13º salário, FGTS, auxílio refeição, plano de saúde, enfim qualquer outro benefício, afinal de contas agora você é seu patrão.

Mas e se a contratada for uma associação, uma cooperativa? Também não podemos falar nesse caso em existência de salário, o cooperado terá o rateio do contratado ou possíveis sobras, não terá garantias de salário. Nas chamadas cooperativas de trabalho tivemos nos últimos anos as maiores aberrações e autuações do MT, quer no campo ou nas cidades, somente deixando de ser mais atentadoras que as condições análogas de trabalho escravo que também é uma prática de certos setores.

E a chamada solidariedade do empregador que contrata um terceiro? Ora ser solidário por condições inadequadas é simplesmente ser solidário sem qualquer responsabilidade. Eu não terei o empregado vítima de uma terceirizada reconhecido como empregado da empresa contratante, a qual na solidariedade prevista terá meramente a responsabilidade de repassar ao empregado lesado aquilo que estará retendo previamente conforme a legislação que está sendo aprovada, mas a responsabilidade efetiva de ter o reconhecimento das mesmas condições decorrentes da relação fraudulenta caso venha a existir a solidariedade prevista na lei é egoísta, em nada vai socorrer ao trabalhador.

O que fez a Câmara ao aprovar as emendas aglutinadoras ou afogadoras, foi transformar em menos de 20 dias, condições péssimas para outras terríveis, o que permite o vislumbrar de tempos complicados nas relações de trabalho.

É fundamental sempre termos claro que quem terceiriza busca economizar, busca reduzir gastos. Quem for submetido a esse tipo de contratação com certeza terá reduzidos os seus direitos.

Portanto, num mundo e num país que a ordem do dia é resgatar valores de proteção, onde muitos acham que reduzir maioridade penal será ter mais segurança para que meus direitos, meus bens sejam protegidos, imagino que pode ser mais seguro a preservação do emprego, nos moldes que consagramos com garantias e direitos ao longo de décadas, que não brotaram de 10, 15 minutos de inspiração de nobres deputados, que foram resultados de lutas, vidas e sofrimento de muita gente que entendeu que lutar por direitos de dignificar o trabalho são fundamentais.

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*Eduardo Surian Matias é sócio do escritório Loguercio, Beiro e Surian Sociedade de Advogados.

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