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A rotulação dos alimentos transgênicos, por Eudes Quintino

A rotulação dos alimentos transgênicos

O cultivo de alimentos transgênicos no Brasil ocupa lugar de destaque no ranking mundial e, ao que tudo indica, continuará registrando crescimento em razão da dimensão territorial e a fertilidade das áreas de plantio.

domingo, 17 de julho de 2016

Atualizado em 15 de julho de 2016 12:56

A tecnologia causa fascínio ao homem, a tal ponto que, entendendo todo o arsenal de informações oferecidas a um simples toque, passa a ficar verdadeiramente dependente do seu conteúdo para tomar as decisões a respeito de seus compromissos e atividades. É o caso do mais sofisticado celular, do smartphone de última geração, consultor e acólito inseparável, com múltiplas e diversificadas funções à disposição do mais exigente usuário. A biotecnologia, de igual forma, no silêncio dos laboratórios e com a manipulação coordenada pela engenharia genética, constrói desde castelo de sonhos para aqueles que se valem da reprodução humana assistida, como também patrocina a produção de novos alimentos com a introdução dos organismos geneticamente modificados (OGMs) e isto em razão da transferência de gens de uma espécie para outra, alterando seu DNA, com a possibilidade de criar organismos diferenciados com características ainda não descobertas na natureza.

A lei 11.105/2005, conhecida também por Lei da Biossegurança, estabelece as normas sobre a pesquisa, distribuição e a comercialização de OGM, além de prever a possibilidade de danos e riscos não só à saúde humana, como, também, ao próprio meio ambiente. O artigo 40 da referida lei é taxativo em afirmar que "os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter informação nesse sentido em seus rótulos, conforme regulamento".

Pois bem. No ano de 2015, foi votado e aprovado na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei de autoria do deputado Luiz Heinze (PP/RS), que aboliu os rótulos indicadores de produtos transgênicos colocados à venda nos estabelecimentos comerciais. Referida proposta legislativa altera a Lei de Biossegurança para liberar os produtores de alimentos modificados de informar ao consumidor sobre a presença de componentes transgênicos, quando esta se der em porcentagem inferior a 1% da composição total do produto alimentício. Conforme determinação legal, que o projeto visa revogar, o consumidor deve ser alertado e informado a respeito da composição e riscos dos diferentes produtos, principalmente daqueles modificados geneticamente e, para tanto, a embalagem do produto traz um triângulo amarelo, preenchido pela letra "T".

Na sequência de sua tramitação, a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado Federal, por seu turno, rejeitou o projeto que visa a retirada do símbolo que identifica os alimentos transgênicos. No dia 14 de julho de 2016, foi feito o encaminhamento para a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (Secretaria de Apoio à Comissão de Agricultura e Reforma Agrária).

A legislação mundial caminha no sentido de preservar as informações no rótulo dos alimentos transgênicos. O Senado americano aprovou recentemente projeto de lei que proíbe os Estados aprovar leis sobre a rotulagem de alimentos que contenham modificação genética. Por outro lado, determina que as informações estejam disponíveis, não necessariamente nos rótulos, podendo ser obtidas on line, telefone, ou qualquer outro meio para que o consumidor conheça as características do alimento1.

O cultivo de alimentos transgênicos no Brasil ocupa lugar de destaque no ranking mundial e, ao que tudo indica, continuará registrando crescimento em razão da dimensão territorial e a fertilidade das áreas de plantio. O que se discute no projeto de lei brasileiro não é o risco da utilização dos transgênicos à saúde humana ou meio ambiente ou até mesmo a viabilidade de uma produção maior com a redução de custos para aliviar a fome mundial, mas sim o direito do consumidor em ser informado a respeito da sua opção consistente em não escolher um alimento que seja geneticamente modificado.

O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, consagra explicitamente o direito do cidadão de ser cientificado da composição do alimento que pretende adquirir para que possa avaliar a respeito de prováveis riscos em sua ingestão. Mesmo havendo uma evidência científica favorável, cabe ao cidadão, na abrangência do princípio da precaução, decidir a respeito da conveniência da compra e, para tanto, deve sim ser cientificado a respeito de qualquer alteração genética na composição do alimento.

In dubio contra projectum, parece a decisão mais sensata.

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*Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde. Advogado e reitor da Unorp.




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