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Capital estrangeiro e propriedade rural - PARTE II

A aquisição de imóvel rural por estrangeiro é limitada pela lei 5.709/71, que, por uma questão de soberania, procura restringir a aquisição por estrangeiros de imóveis rurais em território nacional.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Atualizado em 23 de setembro de 2016 15:46

A aquisição de imóvel rural por estrangeiro, pessoal física ou jurídica, é limitada pela lei 5.709/71, uma lei promulgada na época da ditadura militar, que por uma questão de soberania, como ocorre em muitos outros países, procura restringir a aquisição por estrangeiros de imóveis rurais em território nacional. Isso porque a detenção de uma parcela muito grande de imóveis rurais por estrangeiro pode significar, em tese, comprometimento da segurança nacional, ou perda de oportunidade em detrimento aos brasileiros de exploração de riquezas do solo, cultivo de grãos, produção científica etc.

A lei é anterior à CF de 88 e impõe limites mais rígidos que esta, que acabou silenciando quanto à aquisição de imóvel rural por empresa brasileira controlada por capital estrangeiro.

Há 17 anos atrás, em 1999, quando trabalhava em uma determinada Banca de renome, escrevi um artigo sobre o tema (artigo publicado no boletim informativo LEXpress, pág. 2
) - daí o parte II do título, porque na ocasião, com o parecer GQ - 181 da Procuradora Geral da União, publicado no D.O. de 22/01/99, dotado de força normativa para a Administração Federal, esclareceu definitivamente que as empresas brasileiras de capital estrangeiro estariam exoneradas de obter autorização do ministério antes de adquirir imóvel rural.

Na ocasião, a empresa interessada na aquisição, ainda poderia sofrer alguma exigência, pois embora houvesse esse parecer, a lei 5.709/71 não havia sido revogada e, caso isso ocorresse, poderia se socorrer a um Mandado de Segurança, com base nesse Parecer da CGU.

Agora o tema voltou à tona, já que o STF, na Ação Cível Originária (ACO) 2.463, suspendeu os efeitos do supra referido parecer da Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo mediante o qual se reconhecia a não recepção do artigo 1º., parágrafo 1º., da lei 5.709/71 pela CF.

O ministro Marco Aurélio sustentou que a lei 5.709/71 não foi declarada inconstitucional pelo STF em processo objetivo e que, portanto, militaria em favor do dispositivo a presunção de constitucionalidade das leis regularmente aprovadas pelo Poder Legislativo.

Acrescenta, ainda, que (...) "o Texto Maior, conquanto agasalhe os princípios da isonomia e da livre iniciativa, reservou ao legislador ferramentas aptas a assegurar a soberania, pressuposto da própria preservação da ordem constitucional", afirmou.

Segundo o ministro Marco Aurélio, a soberania, além de fundamento da República Federativa do Brasil, também constitui princípio da ordem econômica, evidenciando o papel no arranjo institucional instaurado em 1988, quando se expressou preocupação com a influência do capital estrangeiro em assuntos sensíveis e intrinsecamente vinculados ao interesse nacional.1

Vê-se, novamente aqui, a preocupação demonstrada, que vem desde a promulgação da lei, com a soberania nacional. E é uma pena que não se tenha uma segurança jurídica em um tema de tamanha relevância constitucional.

Segundo o IRIB (Instituto de Registro Imobiliário do Brasil)2, embora haja uma grande preocupação do governo com o tema, os dados oficiais demonstram que apenas 0,51% do território nacional está nas mãos de estrangeiro, o que por certo demonstra, o quanto é falho o banco de dados disponível no órgão responsável pela regularização fundiária do País, justificado pelo INCRA pela ausência de informações referentes às transações realizadas. Certo é que tais números não parecem ser fidedignos.

Com a retomada do crescimento, sabemos que os investimentos estrangeiros voltam a ocorrer e isso é saudável à nossa economia, o que também não significa que a solução é como dizia o Raul, "alugar o Brasil" e deixa-lo à mercê de interesses não nacionais, ameaçando a sua soberania.

O que queremos é que as empresas, sejam elas nacionais, de capital nacional ou de capital estrangeiro, interessadas em produzir no país, fomentar a economia local, se estabelecer, fazer bons negócios, crescer aqui e nos ajudar a crescer, encontrem um ambiente propício a isso, ou seja, claro, transparente, sem burocracias desnecessárias. Sem terem que conviver com a insegurança jurídica para registrar o seu título aquisitivo. Isso é essencial.

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1 https://genjuridico.com.br/2016/09/13/informativo-de-legislacao-federal-13-09-2016/

2
https://www.irib.org.br/html/encontros-irib/programacao.php?evento=14

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*Analucia Zuliani Réa é advogada e integrante do Jurídico de Saias.


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