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Liberação do FGTS e reforma trabalhista: presente ou perda de direitos?

Achávamos que o ano já tinha acabado, mas 2016 não estava ainda cansado de nos surpreender. E nos últimos dias, tivemos duas notícias: uma boa e uma ruim (por assim dizer).

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Atualizado em 13 de janeiro de 2017 08:36

Achávamos que o ano já tinha acabado, mas 2016 não estava ainda cansado de nos surpreender. E nos últimos dias, tivemos duas notícias: uma boa e uma ruim (por assim dizer): o anúncio da liberação do FGTS de contas inativas e a proposta de reforma trabalhista.

A primeira notícia, que pode ser considerada como a boa, veio no dia 22 de dezembro, anunciada pelo presidente em exercício, Michel Temer, que pretendeu, com tal medida reaquecer a economia. De acordo com o anunciado, os saques podem chegar a R$ 30 bilhões, e este dinheiro seria, em tese, injetado no mercado.

Conta inativa do FGTS é aquela em que não ocorrem mais depósitos por extinção ou rescisão do contrato de trabalho. Pelas regras originais, o valor depositado em tais contas só poderia ser sacado quando o trabalhador ficasse três anos desempregado, mas a partir de agora o saque podo ocorrer a qualquer tempo, desde que a inatividade tenha ocorrido até 31/12/2015. O cronograma está previsto para ser liberado até fevereiro deste ano, levando em consideração a data de nascimento do beneficiário.

A princípio, cogitou-se limitar o valor do saque em no máximo R$ 1.000,00, e ainda vinculá-lo ao pagamento de dívidas. Mas estas ideias foram descartadas: não há limite de valor para saque, e nenhuma vinculação de uso do montante sacado.

É importante, contudo, consignar que não há, ainda, nada além do anúncio do presidente acerca desta autorização. Ou seja, quem pretende fazer o saque deve apenas aguardar a divulgação das regras.

A outra notícia, a ruim, realmente causou calafrios, e veio no mesmo dia 22.

Trata-se da proposta de reforma trabalhista que será encaminhada ao Congresso em fevereiro (no retorno do recesso parlamentar), mas que deverá tramitar em regime de urgência.

Os pontos de alteração são variados e impactam quase que a totalidade dos trabalhadores em regime formal.

Os contratos de trabalho temporário, que atualmente não podem ultrapassar os 90 dias, passam a ter prazo máximo de 120 dias, prorrogáveis por mais 120 dias, mas os trabalhadores passam a ter os mesmos direitos previstos na CLT. Poderão ser celebrados diretamente pela empresa, ou (como ocorre atualmente) por empresas terceiras.

A grande alteração está no aumento da autonomia e dos objetos dos acordos sindicais, o que gerou inúmeras críticas tendo em vista a possibilidade de redução de direitos assegurados nas leis trabalhistas. Benefícios previdenciários, férias, hora extra com pagamento de 50% acima da hora normal e aviso prévio, felizmente, ficaram fora daquilo que pode ser negociado sindicalmente.

Empresas e trabalhadores poderão negociar os seguintes pontos, dentre outros:

- férias podem ser divididas em até três períodos, sendo um deles de, no mínimo, 15 dias seguidos;

- jornada de trabalho máxima de 220h mensais e 12 horas diárias (estranhamente, quando a este ponto, o Ministro do Trabalho afirmou que "A jornada de trabalho permanece a padrão de oito diárias e 44 horas semanais. Nunca esteve, não está e não estará na agenda do governo proposta de aumento de jornada de trabalho. Não conseguimos entender a evidente contradição entre a proposta e a fala do Ministro);

- intervalo intrajornada de no mínimo 30 minutos;

- remuneração das horas de deslocamento até o trabalho;

- contrato de trabalho com jornada parcial de 30 horas semanas, sem horas extras, ou para 26 horas semanais com até 6 horas extras.

Importante consignar que todas essas alterações ainda serão discutidas no Congresso. E mais: os pontos de flexibilização são passíveis de negociação sindical. Isso significa que não haverá, necessariamente, uma alteração, por exemplo, na jornada de trabalho. O que se permite é que sindicatos negociem essa alteração que seria válida caso formalizada. E para ter validade, o acordo tem de ser feito entre sindicato da categoria e empresa, aprovado pela assembleia de trabalhadores.

A justificativa para tal reforma é que a CLT, de 1940, precisa ser atualizada para atender às mudanças na sociedade e nos setores da economia. Mas as críticas superam essa justificativa. No fundo, a proposta atende quase que somente aos reclames dos sindicatos patronais. Ainda que se afirme que as alterações serão negociadas entre empregadores e trabalhadores, sabemos qual é o lado mais fraco neste embate.

O novo presidente do TRT da 2.ª Região de São Paulo, a maior do país, Wilson Fernandes, condenou a proposta. Ele não vê nenhuma ligação entre a flexibilização e a geração de empregos, o que só confirma que a tal proposta atende somente a um dos lados das relações trabalhistas.

O procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury, também se posicionou contrário às alterações: "O que se está buscando é para piorar a condição do trabalhador, se busca que os sindicatos possam abrir mão de direitos trabalhistas".

A nós, reles trabalhadores, resta aguardar como o Congresso levará adiante a tal proposta. No Natal, pode-se dizer que recebemos o FGTS de presente, mas que, no fundo, era apenas uma lembrancinha para que não nos atentemos às inúmeras perdas que podemos ter. O governo agiu como quem dá um pirulito a uma criança para que ela não perceba que em seguida terá que tomar uma injeção dolorida.

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*Luciana Pimenta é coordenadora pedagógica no IOB Concursos, advogada e revisora textual.

IBTP - INSTITUTO BRASILEIRO DE TREINAMENTO PROGRAMADO S.A.

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