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A ilegalidade da suspensão e rescisão unilateral do contrato de plano de saúde por não-pagamento da mensalidade. Art. 13 da lei 9.656/98

A lei 9.656/98 exige para que ocorra a suspensão regular do contrato por não pagamento da mensalidade, a notificação do consumidor até o quinquagésimo dia de inadimplência.

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Atualizado às 09:06

Os contratos de plano de saúde estão sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, razão pela qual os limites e condições de cobertura devem ser vistos com maior amplitude, mormente em se tratando de contrato de adesão, em que o consumidor normalmente não tem como discutir as cláusulas ali existentes.

Prevista pela Súmula 469 do STJ, a aplicação do Código Consumerista aos contratos de plano de saúde faz sobressair que, na abordagem da matéria, impende serem observados os princípios reguladores das relações de consumo, e, tanto mais, nos casos de suspensão e rescisão unilateral do contrato por não pagamento da mensalidade.

Nesta direção, a lei 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, exige, para que ocorra a suspensão regular do contrato por não pagamento da mensalidade, a notificação do consumidor até o quinquagésimo dia de inadimplência, o que se lê do seu art. 13, ex vi, com grifo nosso:

"Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação.

Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas:

I - a recontagem de carências;

II - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado  até o quinquagésimo dia de inadimplência; e

III - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, em qualquer hipótese, durante a ocorrência de internação do titular".

Sobre o tema, em acordo com o referido texto legal, a jurisprudência pátria é igualmente firme no sentido que, da suspensão unilateral do contrato o consumidor deve ser previamente notificado na forma da lei que rege a matéria, sob pena de tal ato contaminar de ilegalidade posterior rescisão unilateral do contrato, ensejando o devido restabelecimento do plano, consoante se lê do excerto grifado. Ex vi:

"PLANO DE SÁUDE - ILEGITIMIDADE PASSIVA - INEXISTÊNCIA - INADIMPLEMENTO - CANCELAMENTO - NECESSIDADE DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO - BOA-FÉ OBJETIVA E FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO - RESTABELECIMENTO DO CONTRATO - CABIMENTO - SENTENÇA MANTIDA. (...).. 4) - Aplica-se a Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre planos privados de assistência a saúde, em caso de contratos coletivos por adesão, conforme artigo 16, inciso VII, alínea "c" da própria norma. 5) - A boa-fé objetiva do consumidor e a função social do contrato devem ser observados frente ao inadimplemento sem culpa daquele, conforme os princípios que norteiam as normas contratuais. 6) - A Lei nº 9.656/98 determina que em caso de suspensão unilateral do contrato o consumidor deverá ser previamente notificado, assim não fazendo o cancelamento se dá de forma irregular, devendo o plano de saúde ser restabelecido. 7) - Recursos conhecidos e não providos. Preliminar rejeitada." (TJDF, Acórdão n.628402,20080111218197APC, Relator: LUCIANO MOREIRA VASCONCELLOS, Revisor: ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 17/10/2012, Publicado no DJE: 23/10/2012. Pág.: 160)

APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. PLANO DE SAÚDE. GEAP. CONSUMIDOR. REINCLUSÃO NO PLANO E DANOS MORAIS. INCIDÊNCIA DOS DITAMES DA LEI Nº 9.656/98. RESOLUÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO, COM A CONSEQUENTE CESSAÇÃO DA COBERTURA, POR INADIMPLEMENTO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO NOTIFICAÇÃO DE QUE TRATA O INCISO II DO ART. 13 DA LEI Nº 9.656/98. CONDUTA ABUSIVA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL QUE TRANSBORDA OS LIMITES DA AVENÇA. VIOLAÇÃO DE DIREITO DA PERSONALIDADE. DANO IN RE IPSA. COMPENSAÇÃO MORAL DEVIDA. QUANTUM. REDUÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. FUNÇÃO PREVENTIVO-PEDAGÓGICA-REPARADORA-PUNITIVA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.

1. Incidem às administradoras dos planos de saúde, inclusive na modalidade autogestão as normas da Lei nº 9.656/98. 2. O art. 13, II, da Lei nº 9.656/98, exige que, para a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato de seguro saúde é necessário que o consumidor seja notificado de sua inadimplência, até o quinquagésimo dia.

3. A ausência de notificação do consumidor até o quinquagésimo dia do inadimplemento torna ilícito o ato de cancelamento do plano de saúde, sendo irrelevante a alegação de estar a operadora tão somente cumprindo determinação da entidade patrocinadora, devendo ser considerada abusiva a conduta perpetrada pela ré apelante em função de ter ocorrido em desacordo com a aludida norma de regência.

(...) 6. Averba compensatória dos danos morais deve ser arbitrada em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade e, também, para a função preventivo-pedagógica-reparadora-punitiva, além da efetiva extensão do dano (art. 944 do CC/2002). (...). Recurso conhecido e parcialmente provido, tão somente para reduzir o montante dos danos morais para R$ 3.000,00 (três mil reais). (Acórdão n.971297, 20150110705059APC, Relator: ALFEU MACHADO 1ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 05/10/2016, Publicado no DJE: 18/10/2016. Pág.: 257-295)

Tal inteligência, promotora da boa-fé contratual, alberga-se no entendimento de que a suspensão e rescisão unilateral do contrato, sem cumprimento da notificação prévia do consumidor naquele prazo estabelecido, privam, este, da ciência do ultimato e de, querendo, empreender medidas a evitar a exclusão, o que, à toda evidência, fere diametralmente os princípios da boa-fé objetiva (art. 4º, inciso III do CDC) e da transparência (art. 6º, inciso III do CDC) que devem permear as relações consumeristas. E não só.

Na hipótese de o plano contratado, diante do não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, deixar de notificar previamente o consumidor titular do plano da suspensão ou cancelamento do contrato, estará, ainda, desatendendo o princípio da função social do contrato.

Isto porque os contratos de plano de saúde, diversamente, não podem ser vistos tão-somente como instrumentos de circulação de riquezas. Devem ser, não menos, vislumbrados como instrumentos de desenvolvimento social, porquanto o interesse das partes contratantes devem dirigir-se ao encontro de valores constitucionais, como por exemplo, a defesa do consumidor (artigos 5.º, "caput", XXXII, e 170, "caput", V, da Constituição).

Por tais razões, numa hipótese em que a suspensão ou cancelamento do plano de saúde descumpram aquele preceito legal, bem assim, os princípios supra expostos, sobressai imperativo provimento jurisdicional que determine o restabelecimento de contrato de plano de saúde, pois que, nestas circunstâncias, não tem, o consumidor, a oportunidade de conhecer a advertência e de tomar medidas para evitar a lesão.

Por força dos artigos 5º, "caput", XXXII, e 170, "caput", V, da CCF/88; ainda, artigos 4º, inciso III e 6º, inciso III, ambos do CDC; e por inobservância do artigo 13, parágrafo único, II da lei 9.656/98, cabível, pois, justa postulação judicial para que o Plano de saúde contratado seja obrigado a fazer a re-inclusão do consumidor titular do plano, sem recontagem de carência, nos moldes do contrato de adesão ao qual aderiu, tendo em vista a abusividade e ilicitude verificadas na suspensão ou rescisão unilateral do contrato por não pagamento de mensalidade quando ausente a notificação do consumidor até o quinquagésimo dia de inadimplência.

Com esta inteligência foi como decidiu o juiz da 22° Vara Cível de Brasília - DF, ao deferir, na competente ação cominatória em que também se pugnou por condenação em danos morais, tutela antecipada para determinar que a GEAP Saúde, plano de saúde requerido, no prazo de quarenta oito horas, procedesse à reinserção do autor no quadro de beneficiários, nas condições antes contratadas, sem a exigência de nova carência.

Na decisão, ainda, o competente julgador fez constar determinação para que o referido plano passasse a expedir o documento de cobrança mensal (boletos) até o julgamento final da demanda ou revisão da decisão, no valor contratado, assegurando a continuidade na prestação dos serviços ao beneficiário, sob pena de aplicação de multa diária, sem prejuízo da adoção de outras medidas que se fizessem necessárias e tendentes a coibir a desobediência, na hipótese de descumprimento.

Processo relacionado: 715061-89.2017.8.07.0001.

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*Cynara Almeida é especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil.








*Marcela Batista é especialista em Contratos e Responsabilidade Civil.







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