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Perspectiva da reforma previdenciária em tempos de crise

De tempos em tempos, a reforma é necessária, foi assim nas últimas décadas e continuará sendo. Mas por que a reforma atual gerou tanta oposição? O que mudou desta vez? Confira.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Atualizado em 16 de fevereiro de 2018 14:37

Em dezembro de 2016 foi anunciado pelo atual governo o interesse em reformar o Sistema Previdenciário Brasileiro, por meio da PEC 287/16, que após algumas modificações realizadas pela Comissão Especial, foi renomeada de PEC 287-A. Os trâmites para aprovação do projeto estavam caminhando a passos largos até serem reduzidos pelas denúncias de participação do Presidente da República em crime de corrupção. A partir desse momento, a impopularidade do projeto começou a ganhar forças e muitos daqueles que estavam conformados com a necessidade de mudanças no conjunto de normas da previdência, começaram a questionar se essa seria a melhor saída para recuperar o país em tempos de crise econômica.

Contudo, apesar do ocorrido, o governo vem colocando panos quentes nos escândalos e está fazendo de tudo para votar a reforma ainda neste semestre.

As principais discussões envolvendo o tema estão relacionadas a dicotomia entre a existência de déficit ou superávit, o aumento da expectativa de vida, a concessão precoce de aposentadorias, entre outros fatores. Para que possamos compreender o atual cenário, faz-se necessário esclarecer alguns pontos pertinentes à proteção social na história, ao longo dos anos.

Pode-se dizer que a primeira legislação com este viés no Brasil surgiu em 1888, com a criação de um caixa de assistência para socorrer os trabalhadores das estradas de ferro. Posteriormente, ainda de maneira discreta, em 1923 sobreveio a Lei Eloy Chaves, que foi celebrada como a primeira legislação previdenciária nacional. Já em 1960, foi sancionada a Lei Orgânica da Previdência Social, que ficou conhecida como a mais importante legislação que tratou sobre o tema no país.

Contudo, foi apenas com a Constituição Federal de 1988 que se instituiu um arcabouço legislativo complexo de proteção social, ao implementar o Sistema de Seguridade Social, formado pela Saúde, Previdência e Assistência Social.

Todavia, esse modelo ideal extremamente protetivo, trazido com a carta magna de 1988 tornou-se insustentável e em pouquíssimo tempo profundas alterações legislativas como as Emendas Constitucionais 20/98, 41/03, 47/05 e 70/12 foram modificando profundamente o Sistema Previdenciário brasileiro.

Ocorre que, infelizmente, a história está se repetindo, sob o fundamento de que ainda há déficit e, para garantir a sustentabilidade do sistema, bem como a concessão de benefícios futuros, precisamos passar por mais uma reforma previdenciária.

Entre as alterações apresentadas pelo governo a fim de garantir o equilíbrio e a sustentabilidade do sistema, destacam-se:

- Nivelação da regra entre trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos, bem como entre urbanos e rurais (Exceção: Forças Armadas, Policiais e Bombeiros);

- Implementação de idade mínima para aposentadorias; - Extinção de alguns benefícios e garantias atuais;

- Redução do valor médio dos benefícios; e

- Fortalecimento da Previdência Complementar.

De outro lado, existem diversos estudos contrariando os argumentos da presidência, como o realizado pela Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil - ANFIP (Análise da Seguridade Social), os quais demonstram que o orçamento da Seguridade Social, apesar da crise, é superavitário, o que deixa a população ainda mais confusa e desconfiada com as reais intenções dos protagonistas da nova reforma.

Feitas tais considerações, é importante destacar que o Sistema Previdenciário tem extrema importância no Estado Democrático de Direito, já que é através de políticas sociais que alcança-se o bem comum, com o objetivo de promover a redução das desigualdades.

Entretanto, de tempos em tempos, como em qualquer outro setor, seja por mudanças econômicas ou no perfil dos participantes (fatores demográficos, por exemplo), as mudanças são bem-vindas e necessárias.

O biomédico inglês, especialista em longevidade, Aubrey de Grey, disse que já nasceu a pessoa que vai chegar aos 150 anos. Aliás, não é preciso ir muito longe para constatar que a longevidade é uma característica presente na população do próprio Estado de Santa Catarina, onde as mulheres vivem em média 82,1 anos (dados do IBGE de 2016), ou seja, é a maior expectativa de vida do país.

Assim, ao fazer um comparativo com a idade média que os segurados se aposentam no Brasil - 57 anos, podemos supor que o sistema fatalmente se tornará insustentável em um curto período de tempo, uma vez que as pessoas passarão mais tempo em inatividade do que contribuindo para a Previdência Social.

Portanto, por todo o exposto, não há dúvida de que as reformas previdenciárias com o passar dos anos são inevitáveis, porém, é preciso que as modificações sejam discutidas sempre com muita cautela, com respeito ao direito adquirido e especial atenção às regras de transição. Buscando não frustrar uma expectativa de direito que por anos fez parte dos planos de vida daqueles que serão afetados pela eventual mudança na lei.

Embora, lamentavelmente, não é isto que está acontecendo, percebe-se que os idealizadores da reforma se demonstram desinteressados em ouvir a população, valendo-se da mídia nacional para criar um ambiente de terrorismo e empurrar a aceitação da metamorfose legislativa pronunciada, o que prejudica extremamente o polo mais vulnerável da relação, que é a população brasileira.

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*Thiago Pawlick Martins é advogado previdenciário, sócio do escritório Coelho Martins e Pawlick.

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