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Tributação das agências de publicidade - idas e vindas do município de São Paulo

A reformulação deste posicionamento pelo Município de São Paulo impacta negativamente o mercado publicitário paulistano, ao parecer pretender modificar o tratamento tributário já consolidado não só na esfera municipal como também federal.

terça-feira, 24 de abril de 2018

Atualizado em 19 de abril de 2018 11:09

Até recentemente pouco se discutia quanto à incidência de ISS sobre a veiculação de propaganda e publicidade (pretensão esta que foi objeto de veto na Lei Complementar 116/03), e tampouco se cogitava da inclusão do valor da veiculação na base de cálculo do ISS devido pelas agências de publicidade, tendo em vista seu papel como meras intermediárias entre os anunciantes e os veículos de comunicação.

No início de 2016, no entanto, a Prefeitura do Município de São Paulo proferiu o Parecer Normativo SF 01/16, por meio do qual modificou seu entendimento, considerando tributável pelo ISS a veiculação de propaganda e publicidade, não com base no dispositivo vetado (17.07), mas no item da lista relativo a propaganda e publicidade (17.06).

O Parecer gerou insegurança no mercado publicitário paulistano, mas como a redação da Lei Complementar permanecia a mesma, não havia razões sólidas para a mudança de entendimento.

O cenário mudou quando, em dezembro de 2016, foi publicada a Lei Complementar 157, que alterando a Lei Complementar 116/03, inseriu na lista de serviços tributáveis pelo ISS, dentre outras, a atividade de inserção de material publicitário (item 17.25). Agora a tributação de veiculação passou a contar com fundamento legal. A regulamentação pelo Município de São Paulo, acolhendo a nova incidência, veio somente em novembro de 2017, por meio da Lei Municipal 16.757.

No que respeita às agências, nem a Lei anterior nem a atual disciplinam em detalhe a base de cálculo na atividade publicitária, tarefa que ficou a cargo do Decreto 53.151/12 - RISS/SP, o qual previu expressamente que os valores externos de produção repassados aos anunciantes não se incluiriam no cálculo do ISS devido pelas agências.

Tendo em vista este dispositivo, os valores relativos à produção executada por terceiros vêm sendo tratados como repasses pelas agências publicidade, recebendo tratamento de redutores de base de cálculo do ISS e sendo informados no campo de "deduções" das notas fiscais. Embora atécnico, referido ato conferia segurança às práticas adotadas pelo segmento. Tratar os repasses como dedução é medida, de certa forma, incoerente, pois isto sugere que tais valores estavam "incluídos" na base tributável do imposto municipal.

Em dezembro de 2017, porém, foi publicado o Decreto 58.045, que dentre outras alterações revogou o artigo que disciplinava a dedução dos repasses, fazendo o mesmo com as atividades de armazéns gerais e transporte de carga. Esta medida poderia representar uma correção da técnica legislativa, mas, se assim o fosse, tal correção deveria ser acompanhada de outras modificações legislativas.

De fato, a base de cálculo do ISS é definida por lei como o preço do serviço prestado, que constitui a contraprestação que o tomador do serviço paga ao prestador em razão das atividades por este realizadas. Portanto, somente compõem a base de cálculo do ISS os valores recebidos como contraprestação dos serviços prestados, excluindo-se desta os demais valores relativos a repasses incorridos em nome de terceiro (reembolso) que tenham caráter meramente indenizatório.

Este é, inclusive, o posicionamento oficial da Prefeitura paulistana, que por ocasião da resposta proferida na Solução de Consulta 07/14, ao analisar o caso de um contribuinte1 que atuava como agência de publicidade, posicionou-se pela não incidência do ISS sobre o valor correspondente aos repasses (inclusive de veiculação), justamente porque estes não representavam o valor do serviço prestado. Vale, inclusive, transcrever os seguintes trechos do parecer proferido pelo órgão técnico da Prefeitura naquela oportunidade, que bem retrata o conteúdo da regra então prevista no artigo revogado:

"a consulente recebe, em sua atividade, valores que abrangem tanto a remuneração pertencente aos veículos de divulgação, a estes posteriormente repassados, quanto à remuneração própria, retida pela consulente. Conclui-se, deste mecanismo, que a receita bruta efetivamente auferida pela consulente corresponde aos valores por ela retidos a título de remuneração própria.

9.1. Esta conclusão está também de acordo com a definição da receita bruta de uma das atividades potencialmente realizáveis por agências de publicidade, conforme elencada no inciso I do artigo 47 do Decreto 53.151/12, afirmando que constitui receita bruta das agências de publicidade o valor das comissões, inclusive das bonificações a qualquer título, auferidas em razão da divulgação de propaganda.

9.2. Portanto a receita bruta a ser considerada pela consulente como base de cálculo para o recolhimento do ISS é constituída dos valores efetivamente recebidos a título de remuneração de sua atividade, excluindo-se os valores repassados aos veículos como contraprestação pelos espaços disponibilizados."

A reformulação deste posicionamento pelo Município de São Paulo impacta negativamente o mercado publicitário paulistano, ao parecer pretender modificar o tratamento tributário já consolidado não só na esfera municipal como também federal.

De fato, considerando que o dispositivo revogado regulava a constituição da receita bruta das agências de publicidade e, logo, os parâmetros da incidência do ISS sobre as suas atividades, no pior cenário, i.e., aplicando-se uma interpretação restritiva da alteração promovida, temos que as agências de publicidade não mais poderiam descontar o valor de repasse a fornecedores das suas notas fiscais a partir de abril, sendo ilegitimamente obrigadas a pagar o ISS sobre o valor total do documento, e não apenas sobre o valor dos seus serviços.

Em 03 de abril de 2018, todavia, foi editado o Decreto 58.175/18, o qual acrescentou o artigo 47-A no RISS/SP. Este novo artigo introduzido fez às vezes do então revogado artigo 47, regulando a composição da base de cálculo das agências de publicidade.

Muito embora a Prefeitura de São Paulo não tenha se manifestado oficialmente sobre o assunto, no sentido de esclarecer os efetivos motivos da renovação do artigo 47 e da introdução do artigo 47-A, após abril de 2018 alguns contribuintes têm notado uma alteração no sistema de emissão de notas fiscais da Prefeitura paulistana, que não mais admite a dedução dos repasses para fins de composição do cálculo do ISS.

Com efeito, no campo "Valor Total das Deduções", nota-se agora a mensagem "Código do Serviço não permite dedução". A explicação dada para tal medida é que "Este campo só pode ser preenchido quando a dedução for permitida pela legislação municipal. Os valores deduzidos estão sujeitos à verificação. Consulte a Legislação Tributária do Município para obter mais informações."

A limitação introduzida no sistema de emissão de notas fiscais poderia confirmar a postura restritiva da Prefeitura de São Paulo, que negando vigência à legislação complementar e aos termos da Solução de Consulta 07/14, parece pretender cobrar o ISS sobre valores que não representam receitas de serviços das agências.

Estabelecendo procedimentos para emissão de NFS-e pelas agências, em 6 de abril de 2018, a PMSP editou a Instrução Normativa 6, por meio do qual regulamentou as disposições previstas no artigo 47-A do RISS/SP.

Como se verifica da aludida IN, com relação aos valores pertinentes à "produção em geral", a PMSP esclareceu o conteúdo do artigo 47-A, permitindo a exclusão da base de cálculo do ISS pago pelas agências dos montantes relativos aos serviços prestados por terceiros, quando contratados pelos clientes/anunciantes.

De outro modo, relativamente à veiculação, nota-se da IN que a possibilidade de exclusão dos valores correspondentes não ficou tão clara! De fato, ainda que redação utilizada no novo artigo 47-A seja muito semelhante àquela do artigo revogado (47), verifica-se que novamente a atividade de veiculação está entre os itens que compõem a base de cálculo do ISS devido pelas agências.

De fato, na forma do artigo 1º da IN, o preço do serviço, para fins de composição do ISS pago pelas agências, "será a receita bruta auferida pelo prestador do serviço, constituída pelo valor das comissões, inclusive das bonificações a qualquer título, honorários, "fees", criação, redação e veiculação". Ainda na forma do artigo, "o prestador deverá preencher o campo 'Discriminação dos Serviços' com a completa discriminação dos serviços agenciados e os respectivos valores repassados a terceiros".

A nosso ver uma interpretação mais restritiva dos dispositivos não autoriza a exclusão da veiculação da base de cálculo do ISS devido pelas agências. É necessário o emprego de entendimento mais abrangente, no sentido de que a veiculação, por não representar receita própria das agências, não pode servir de base de cálculo do imposto por elas recolhido.

Com efeito, a análise do dispositivo antigo e do novo demonstra que a PMSP perdeu a oportunidade de resolver a atecnia contida na legislação que regula a tributação das atividades das agências, fazendo uso de técnica redacional que pode gerar interpretações totalmente divergentes.

Tal situação fica ainda mais confusa quando se analisa o conteúdo do artigo 4º da IN, que prevendo norma excepcional, permite que, pelo prazo de 45 dias, as agências excluam o valor das veiculações da tributação do ISS devido, mediante a inclusão destes montantes no campo reservado ao "valor total das deduções" (cujo uso foi limitado, após abril de 2018).

Novamente fazendo-se uma interpretação mais restritiva deste artigo pode-se concluir que a exclusão da veiculação da base de cálculo do ISS devido pelas agências apenas perdurará pelo prazo de 45 dias, sendo que, após o transcurso, tais montantes passariam ser tributados.

A se confirmar eventual pretensão da Prefeitura de São Paulo de tributar o valor dos repasses de veiculação, a nosso ver as agências teriam, ao menos, dois argumentos para afastá-la. Primeiro, o valor da veiculação não representa preço do serviço e, segundo, a cobrança de ISS sobre valores de veiculação repassados pelas agências constituiria dupla exigência sobre o mesmo fato, tendo em vista a recente inclusão da inserção de publicidade no rol de serviços tributáveis.

Considerando este cenário, as agências de publicidade poderão enfrentar dificuldades práticas, de modo que se torna premente adotar medidas imediatas para impedir a indevida incidência do ISS sobre valores que não representem receitas da prestação de serviços.

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1 "A consulente opera exatamente na intermediação entre conteúdos publicitários já produzidos e acabados e espaços de divulgação pertencentes a terceiros. Ao promover a aproximação entre veículos e empresas interessadas em fazer propaganda de seus produtos, a consulente atua na intermediação de negócios, mais especificamente, na captação ou agenciamento de publicidade e propaganda, serviços estes enquadráveis expressamente no (...) subitem 10.08 (...) definidos como agenciamento de publicidade e propaganda, inclusive o agenciamento de veiculação por quaisquer meios."

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*Álvaro Lucasechi e Victor Polizelli são sócios tributários do escritório KLA Advogados.

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