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Eleições 2018 com financiamento público das campanhas políticas, compliance nos partidos políticos

O modelo político atual desestimula o ingresso do cidadão na vida pública. Mas é preciso que novas pessoas, novas ideias, ingressem na vida política, gerindo a coisa pública com probidade, zelo e competência.

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

Atualizado em 25 de setembro de 2019 17:56

Uma das propostas mais debatidas para o enfrentamento da crise ética no cenário político é a reforma política.

Com a "reforma política", deu-se a extirpação de doação das empresas para os partidos políticos, fixando, com maior parte, o financiamento público das campanhas eleitorais.

A reflexão sobre os eventuais erros e acertos dessa "reforma" não será aqui tratada, sendo prudente acompanhar os resultados, na prática, para só após tecer considerações com a necessária propriedade que o tema merece.

Em 6 de outubro de 2017 o Congresso Nacional aprovou o Fundo de Financiamento da Democracia, passando este a ser a fonte exclusiva de recursos públicos para as campanhas eleitorais a partir do ano de 20181.

Fato é que, com o financiamento das campanhas políticas, recursos públicos na ordem de R$ 1.700.000,00 (Um bilhão e setecentos milhões de reais) serão destinados aos partidos políticos e, com isso, como o governo não tem receita própria, ou seja, com a sua atividade de gestor não gera renda, terá ele que deslocar esses valores de outras rubricas, o que tem aberto o caminho para algumas críticas nesse sentido.

Mas por outro lado, o famoso "caixa 2" das campanhas políticas, possivelmente, desaparecerá. Pelo menos foi essa uma das intenções do legislador com a reforma política, anseio de grande parte da sociedade.

Precisávamos, porém, de um remédio a curto e médio prazo. A reforma política veio como remédio a curto prazo, mas a efetividade das reais intenções do legislador terá que ser acompanhada, fiscalizada, como garantia do sucesso da referida reforma.

O modelo político atual desestimula o ingresso do cidadão na vida pública. Mas é preciso que novas pessoas, novas ideias, ingressem na vida política, gerindo a coisa pública com probidade, zelo e competência.

Precisamos de políticos com conduta ética, ou seja, agindo em conformidade com o disposto no art. 37 da CF/88, sob pena dos efeitos do §4º do mesmo Diploma legal2.

Estão em tramitação (consulta pública) no Senado dois projetos de lei.

O primeiro de 60 de 2017, do senador Ricardo Ferraço (PSDB/ES), tem como premissa a responsabilidade objetiva dos partidos políticos, bem como a responsabilidade de seus dirigentes. Traz como atenuante, em caso de eventuais sanções, a existência de um programa de Compliance efetivo, ou seja, a "futura lei" estimula as boas práticas de governança dos partidos políticos. Aqui, como se percebe, não está previsto a obrigatoriedade dos partidos políticos possuírem um programa de Compliance, mas se o possuírem, servirá como atenuante.

Já o segundo projeto é o de 429 de 2017, do senador Antônio Anastasia (PSDB-MG), que traz uma regra cogente, ou seja, a obrigatoriedade de um programa de Compliance. E a falta ou burla ao programa efetivo implicará na suspensão de recebimento do fundo partidário pelo período de 12 (doze) meses.

Esses dois projetos de lei que tramitam no Senado (Compliance para partidos Políticos), traduzem-se no anseio de transparência que a sociedade deseja no Sistema de Financiamento dos partidos políticos. É correto afirmar que a Sociedade almejava o financiamento público das campanhas políticas (como forma de afastar o financiamento de empresas que viravam, na grande maioria, verdadeiras credoras inescrupulosas do governo, em qualquer das esferas), mas essa mesma sociedade também almeja que haja uma redução significativa nos custos dessas campanhas eleitorais, com a existência de um efetivo mecanismos de controle.

Assim, apesar da natureza privada dos partidos políticos, uma vez que esses entes venham a fazer uso de recurso público3, nada mais esperado e correto que ajam com probidade, estando sujeitos aos mesmos controles e sanções severas para àqueles gestores ímprobos (§ 2º, do art. 44, da lei 9.096/95: "A Justiça Eleitoral pode, a qualquer tempo, investigar sobre a aplicação de recursos oriundos do Fundo Partidário").

Os gestores dos partidos políticos precisam agir com retidão e transparência, transmitindo à sociedade a necessária confiança de quem administra recursos públicos, além do mais, tais entes hoje estão afetos à lei de Improbidade, sem dúvida e sem lacuna legal.

Nesse navegar, o remédio que irá garantir os acertos pensados pelo legislador, com a introdução de reais mudanças no cenário político, é a existência de um programa de Compliance efetivo para partidos políticos.
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1 Alteração da lei 9.096/95, nos artigos 38; 41-A e 44.

2 § 4º, do art. 37, da CF/88: "Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível".

3 Lei 8.429, DE 2 DE JUNHO DE 1992. "art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei."
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*Carlos Queiroz é advogado, especialista em Compliance pela PUC-SP, Insper (SP) e LEC-Legal Ethics Compliance. Pós-graduando em Compliance, do Instituto de Direito Penal Econômico e Europeu (IDPEE), da faculdade de Direito Penal da Universidade de Coimbra.

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