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O marco legal da simplificação dos atos e procedimentos administrativos

Consta que serão premiados, anualmente, dois órgãos ou entidades, em cada unidade federativa, selecionados com base nos critérios acima elencados, que receberão o Selo de Desburocratização e Simplificação e serão inscritos em Cadastro Nacional de Desburocratização.

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Atualizado em 25 de setembro de 2019 15:29

No dia 8/10/18 o presidente da República, Michel Temer, sancionou a lei 13.726/181, que trata da racionalização dos atos e procedimentos administrativos de todos os poderes em todas as esferas governamentais2 e institui o Selo de Desburocratização e Simplificação, como parte do programa Brasil Eficiente criado pelo Governo Federal para desburocratizar e modernizar a gestão pública.

Inicialmente, apropriando-nos do conceito apresentado no dicionário de língua portuguesa, "desburocratizar" significa eliminar ou diminuir a excessiva formalidade e rígida rotina exigidas nos trâmites de (sistema, processo etc.), simplificando e agilizando os serviços, ao passo que o verbo "racionalizar" quer dizer organizar (algo) de maneira lógica, tornando-o mais funcional, prático, eficaz, simplificar; organizar (atividade econômica) de forma racional a fim de obter o máximo de rendimento com um mínimo de custo.

A citada norma vem para racionalizar atos e procedimentos administrativos mediante a supressão ou a simplificação de formalidades ou exigências desnecessárias (!) ou superpostas, cujo custo econômico ou social, tanto para o erário como para o cidadão, seja superior ao eventual risco de fraude. Ou seja, a lei determinou que tudo aquilo que já era dispensável, está autorizado a ser eliminado, com o intuito de descomplicar os procedimentos administrativos, desde que a realização da formalidade isso não implique em um risco de fraude mais oneroso.

Ademais, na relação entre administração pública e cidadão, foi dispensada a exigência de reconhecimento de firma3; autenticação de cópia de documento4; juntada de documento pessoal do usuário5; apresentação de certidão de nascimento6; apresentação de título de eleitor (exceto para votar ou para registrar candidatura) e apresentação de autorização com firma reconhecida para viagem de menor se os pais estiverem presentes no embarque. Nestes casos, quando necessário, o agente público tem o poder de validar a assinatura ou a cópia do documento apresentado.

Da mesma forma, foi vedado ao agente público a exigência de prova relativa a fato que já houver sido comprovado pela apresentação de outro documento válido. O mesmo acontece quando, por motivo não imputável ao solicitante, não for possível obter diretamente do órgão ou entidade responsável documento comprobatório de regularidade, sendo que então os fatos poderão ser comprovados mediante declaração escrita e assinada pelo cidadão, que, em caso de declaração falsa, ficará sujeito às sanções administrativas, civis e penais aplicáveis.

Neste caso, o legislador permitiu que o solicitante comprove os fatos por meio da subscrição de uma declaração de próprio punho. É importante destacar que, apesar da flexibilização com relação a exigência de apresentação de determinados documentos, a norma adverte que em caso de declaração falsa o solicitante estará sujeito às sanções administrativas, civis e penais aplicáveis, de modo a imprimir a devida legitimidade e cautela na utilização da benesse.

A lei veda que os órgãos e entidades da administração pública exijam do cidadão a apresentação de certidão ou documento expedido por outro órgão ou entidade do mesmo Poder, com exceção da certidão de antecedentes criminais; informações sobre pessoa jurídica e outras expressamente previstas em lei. Trata-se da proibição da exigência de certidões e documentos expedidos por uma unidade de um dos Poderes de quaisquer das três esferas de Governo por outra unidade que se encontra sob a mesma ascendência hierárquica.

A norma ainda determina a criação de grupos setoriais de trabalho com o objetivo de identificar, nas suas respectivas áreas, dispositivos legais ou regulamentares que prevejam exigências descabidas ou exageradas ou procedimentos desnecessários ou redundantes e de sugerir medidas legais ou regulamentares que visem a eliminar o excesso de burocracia.

O marco regulatório dispôs que, com exceção dos casos que impliquem imposição de deveres, ônus, sanções ou restrições ao exercício de direitos e atividades, a comunicação entre o Poder Público e o cidadão poderá ser feita por qualquer meio, inclusive comunicação verbal, direta ou telefônica, e correio eletrônico, devendo a circunstância ser registrada quando necessário. A lei pretende informalizar a relação entre a administração pública e o cidadão, tornando-a mais célere e eficiente, ao passo que orienta administrador público, que não deixe de registrar as situações que exigirem tratamento um pouco mais formal e diferenciado, para se salvaguardar de qualquer eventualidade.

Também foi prevista uma forma de reconhecimento à participação do servidor no desenvolvimento e na execução de projetos e programas que resultem na desburocratização do serviço público, que será registrada em seus assentamentos funcionais. A previsão de reconhecimento da participação do servidor que desenvolve e executa projetos e programas desta natureza, com o registro nos assentamentos funcionais, precisa ser regulamentada para evitar que sejam adotadas medidas não isonômicas pelos entes federativos em relação aos servidores.

A lei 13.726/18 instituiu o chamado Selo de Desburocratização e Simplificação, destinado a reconhecer e a estimular projetos, programas e práticas que simplifiquem o funcionamento da administração pública e melhorem o atendimento aos usuários dos serviços públicos, que será concedido por uma comissão formada por representantes da administração pública e da sociedade civil, observando-se a racionalização de processos e procedimentos administrativos; a eliminação de formalidades desnecessárias ou desproporcionais para as finalidades almejadas; os ganhos sociais oriundos da medida de desburocratização; a redução do tempo de espera no atendimento dos serviços públicos e a adoção de soluções tecnológicas ou organizacionais que possam ser replicadas em outras esferas da administração pública.

Ademais, consta que serão premiados, anualmente, dois órgãos ou entidades, em cada unidade federativa, selecionados com base nos critérios acima elencados, que receberão o Selo de Desburocratização e Simplificação e serão inscritos em Cadastro Nacional de Desburocratização. Entretanto, a lei foi omissa quanto aos detalhes relacionados à referida premiação, pois não especificou qual a natureza do prêmio, além da inscrição no citado Cadastro, carecendo, por certo, de regulamentação.

Enfim, inobstante ter sido oferecido um estímulo, isto é, um incentivo para que os entes federados, por seus agentes públicos, fossem inspirados a desenvolver programas e projetos para desburocratizar e racionalizar atos, processos e procedimentos administrativos, a fim de, em última análise, vê-los reconhecidos nacionalmente, muito ainda falta a ser "racionalizado", na própria lei, para que suas diretrizes possam ser colocadas em prática.

Afinal, ao que tudo indica, não era de mais uma norma legal que a administração pública precisava para tornar seus atos e procedimentos mais eficientes, mas sim, que lhe fosse garantida segurança jurídica, para que os agentes públicos não precisassem fazer exigências (além das burocráticas, ilegais e desarrazoadas), apenas pelo receio de que podem vir a ser responsabilizados e ter o seu patrimônio dilapidado para reparar danos ao erário.

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1 Publicada no DOU em 09/10/2018.726

2 Da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

3 Devendo o agente administrativo, confrontando a assinatura com aquela constante do documento de identidade do signatário, ou estando este presente e assinando o documento diante do agente, lavrar sua autenticidade no próprio documento.

4 Cabendo ao agente administrativo, mediante a comparação entre o original e a cópia, atestar a autenticidade.

5 Que poderá ser substituído por cópia autenticada pelo próprio agente administrativo.

6 Que poderá ser substituída por cédula de identidade, título de eleitor, identidade expedida por conselho regional de fiscalização profissional, carteira de trabalho, certificado de prestação ou de isenção do serviço militar, passaporte ou identidade funcional expedida por órgão público.

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*Ketlin Giesel é advogada, especialista em Direito Ambiental e gestora de conformidade em Empresa Pública.

 

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