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Decretaram a falência do futebol sul-americano

André Sica e Américo Espallargas

A decisão de levar a final da Libertadores para Madri representa a falência da América do Sul para o mundo do futebol.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Atualizado em 3 de outubro de 2019 17:35

A Conmebol confirmou a realização da segunda partida da Libertadores 2018 em Madri, Espanha, logo após o Tribunal Disciplinar da entidade anunciar uma sanção ao River Plate de 400 mil dólares de multa e a obrigação de jogar duas partidas como mandante de portões fechados - mas só a partir de 2019.

A decisão de jogar na Europa é uma pá de cal nas pretensões da América do Sul como protagonista no futebol mundial, sem falar no desrespeito à identidade da competição. Além disso, demonstra que os órgãos internos da Conmebol seguem subordinados à diretoria executiva da entidade.

Há anos os clubes e federações sul-americanos brigam por protagonismo no âmbito internacional e na FIFA, que é majoritariamente dominada por europeus em seus processos decisórios. Na prática, dentre os chamados "stakeholders" do futebol mundial, UEFA, ECA (Associação Europeia de Clubes) e FIFPro (o sindicato mundial de atletas, sediado na Holanda) são aqueles que dão as cartas - mas a América do Sul vem pedindo um lugar à mesa nos últimos tempos.

O Brasil, por exemplo, é o país com maior número de transferências de atletas no mundo, o país com maior número de atletas de destaque nas principais ligas, pentacampeão mundial, e líder em discussões jurisprudenciais de peso na FIFA.

Porém, nosso país, além de não figurar na mesa dos stakeholders do futebol mundial, sequer tem preponderância nas decisões do futebol da América Latina.

O envio da finalíssima da Libertadores para Madri transmite apenas uma mensagem ao mundo após o fiasco do último dia 24 com o lamentável ataque ao ônibus do Boca Juniors: "a Europa sabe fazer futebol, nós da América do Sul não sabemos". Brasil, Chile e até Miami ou Doha eram opções melhores. Os "Libertadores da América" se renderam aos conquistadores espanhóis: a Conmebol sumariamente ignorou a simbologia da tomada da decisão, que também influencia bastante uma candidatura sul-americana para sediar a Copa do Mundo de 2030.

Por fim, o vazamento da notícia da mudança de sede, posteriormente confirmado pelo presidente da Conmebol, Alejandro Dominguez, mostra que o Tribunal Disciplinar, ao invés de autônomo, é subordinado à diretoria executiva da confederação. Evidentemente, a decisão disciplinar contra o River Plate valer apenas no ano que vem só refletiu os desejos manifestados por Dominguez, quando na verdade deveria ter sido exclusivamente fundamentada na lei com o objetivo de chegar-se a uma decisão justa. A determinação técnica da mudança da final deveria ter como fundamento a decisão jurídico-disciplinar, e não o contrário. O Tribunal da Conmebol sai muito enfraquecido do caso e mostra que o jogo político segue sendo mais forte que a Justiça na entidade reguladora do futebol em território sul-americano.

Se antes dizia-se que o futebol na América do Sul respirava por aparelhos, a Conmebol acabou de puxar o plug da tomada.

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*André Sica é sócio de Direito Desportivo do CSMV Advogados.

*Américo Espallargas é advogado associado do CSMV Advogados.

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