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Ação pelo IR Ecológico: a natureza merece este estímulo

Marta Mitico Valente e Felipe Barboza Rocha

Desde meados de 2005, Pinheiro Neto - Advogados participa, com um grupo de Organizações Não Governamentais ("ONGs") ambientais, na estruturação de um modelo de incentivo fiscal ambiental via imposto de renda, no que se convencionou chamar Grupo de Trabalho Imposto de Renda Ecológico, ou simplesmente, "GT IR Ecológico". O trabalho desse grupo envolve a discussão de projetos legislativos, articulação com os Poderes Executivo e Legislativo e, também, diálogo com os diversos setores interessados da sociedade. Este artigo apresenta um esboço a respeito do tema "incentivos fiscais ambientais" e as perspectivas com relação à evolução da legislação brasileira nesse tema.

segunda-feira, 28 de agosto de 2006

Atualizado em 25 de agosto de 2006 12:03


Ação pelo IR Ecológico: a natureza merece este estímulo

 

Marta Mitico Valente*

 

Felipe Barboza Rocha*

 

Desde meados de 2005, Pinheiro Neto - Advogados participa, com um grupo de Organizações Não Governamentais ("ONGs") ambientais, na estruturação de um modelo de incentivo fiscal ambiental via imposto de renda, no que se convencionou chamar Grupo de Trabalho Imposto de Renda Ecológico, ou simplesmente, "GT IR Ecológico".

 

O trabalho desse grupo envolve a discussão de projetos legislativos, articulação com os Poderes Executivo e Legislativo e, também, diálogo com os diversos setores interessados da sociedade.

 

Este artigo apresenta um esboço a respeito do tema "incentivos fiscais ambientais" e as perspectivas com relação à evolução da legislação brasileira nesse tema.

 

I. - Introdução

 

(a) Incentivos fiscais no Brasil

 

Ao se discutir a criação de um incentivo fiscal, é preciso ter claro que a política tributária, de uma maneira geral, possui finalidade eminentemente arrecadatória. Tanto é assim que cresceu no Brasil, nos últimos anos, a adesão à idéia de neutralidade fiscal, ou seja, uma desvinculação entre tributos e política econômica.

 

Mas os incentivos fiscais permanecem na pauta do Ministério da Fazenda (ou de outros Ministérios). E permanecem porque é sabido que, quando bem regulamentados, reduzem custos do Estado (tanto custos de administração como custos de conformidade)1.

 

Para que sejam bem regulamentados, deve-se ter em conta que o pressuposto do incentivo é a participação do Estado. Incentivo fiscal não pode significar delegação da competência administrativa originalmente atribuída ao Estado. A idéia, como mencionado, é de cooperação.

 

No Brasil, poucas têm sido as experiências de êxito na área de incentivos fiscais. Com efeito, os modelos eficazes de incentivo fiscal no Brasil são aqueles que promovem atividade sucedânea de política pública - o que, curiosamente, foge à concepção clássica de incentivo fiscal. Cita-se como exemplo de incentivo de sucesso aqueles previstos na Lei nº 8.313, de 23/12/1991 ("Lei Rouanet" - clique aqui) e na Lei nº 8.685, de 20/7/1993 ("Lei do Audiovisual" - clique aqui).

 

Escolhido o modelo de incentivo, é preciso considerar as principais barreiras à criação de incentivos fiscais no Brasil: (i) a Lei Complementar nº 101, de 4/5/2000 ("Lei de Responsabilidade Fiscal" - clique aqui); e (ii) o panorama econômico-fiscal.

 

A primeira barreira, como se vê, é legal. O artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal trata das hipóteses de renúncia fiscal. E determina que toda vez que se propuser renúncia de arrecadação é preciso, alternativamente: (a) criar ou majorar tributo em contrapartida; ou (b) demonstrar que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária. Importante instrumento de gestão orçamentária, a Lei de Responsabilidade Fiscal ocasionou a rejeição de inúmeros projetos de incentivo fiscal ambiental.

 

Além disso, há que se avaliar o panorama econômico-fiscal do País para a criação de um incentivo. Ventila-se um risco de desequilíbrio orçamentário, que, concordamos, não é exagero. Há um crescimento desregrado das despesas públicas, sem contrapartida na arrecadação fiscal - que, por sua vez, não tem mais como expandir-se.

 

Como se vê, as barreiras tornam a criação de um incentivo fiscal à atividade ambientalmente sustentável um desafio. Por outro lado, há políticas de incentivos fiscais de sucesso, aliadas a uma crescente mobilização e organização do terceiro setor no Brasil. A nosso ver, esses são importantes fatores para acreditarmos que esse sucesso se repetiria também na área ambiental.

 

(b) A evolução do direito ambiental: os instrumentos econômicos

 

O tema dos instrumentos econômicos como forma de gestão ambiental ganha espaço e importância, no Brasil e no mundo. Tanto é assim que entre os mecanismos de implementação da Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela Lei nº 6.938, de 31/8/1981 ("Lei 6.938/81" - clique aqui), foram incluídos os instrumentos econômicos (artigo 9º, XIII, da Lei 6.938/81, incluído pela Lei nº 11.284, de 28/3/2006 - clique aqui).

 

Os instrumentos econômicos decorrem do Princípio do Poluidor Pagador, discutido pela primeira vez na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano de Estocolmo, em 1972. A idéia principal é que o agente causador da poluição deve, de alguma forma, internalizar as externalidades ambientais negativas das suas atividades econômicas ou compensar as pessoas afetadas e o meio ambiente. Trata-se de alternativa para substituir ou complementar os conhecidos instrumentos de comando e controle.

 

No Brasil, a discussão não é recente, mas ainda precisa de fôlego. O País ainda não consolidou um conceito de co-participação entre Estado e cidadãos na gestão de recursos ambientais. A adoção dos instrumentos econômicos pode significar um passo largo nessa direção.

 

A importância de tais mecanismos no cenário ambiental brasileiro é indiscutível. Primeiro, a participação da área ambiental no orçamento da União é bastante reduzida, o que torna a ação do Estado bastante limitada nessa área. Além disso, os instrumentos econômicos têm uma tendência a premiar performance, tanto da Administração Pública como do indivíduo ao buscarem a sustentabilidade ambiental como estratégia de desenvolvimento. Em resumo, temos aí a difundida idéia de que é melhor incentivar do que penalizar.

 

II. - Incentivos fiscais ambientais

 

Os incentivos fiscais ambientais podem ser implementados com diversas finalidades, como gestão do uso do solo, gestão dos recursos hídricos, reciclagem e controle da poluição do ar, entre outras. Interessa-nos aqui, em especial, o estímulo às atividades de ONGs como entidades co-responsáveis pelo desenvolvimento de projetos ambientais.

 

O incentivo às doações a projetos ambientais encontra paralelo de sucesso na Lei Rouanet, importante precedente de incremento à atividade cultural brasileira. O benefício consistiria, em princípio, em permitir a dedução do imposto devido (e/ou como despesa operacional na apuração da base de cálculo do Imposto de Renda) das doações efetivadas pelas pessoas físicas e jurídicas em favor de ONGs ambientais para o desenvolvimento de projetos aprovados pelo MMA.

 

III. - Perspectivas e conclusão

 

Projetos de lei com o exato mote descrito na seção anterior tramitam na Câmara dos Deputados há alguns anos. A maior dificuldade para aprovação desses projetos sempre foi a adequação orçamentária, hoje ainda mais complicada em virtude da Lei de Responsabilidade Fiscal.

 

No entanto, a discussão aprofundada do tema tende a eliminar esses entraves. Questiona-se o efetivo aproveitamento da renúncia fiscal garantida pela Lei Rouanet e semelhantes, bem como se discutem espaços renunciais alternativos.

 

Nos dias 6 e 7 de junho, a Comissão de Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável ("CMADS") da Câmara dos Deputados, com o amplo apoio do GT IR Ecológico, organizou um Seminário a respeito do assunto, com resultados comemoráveis. Recentemente, em 12/7/2006, a CMADS aprovou substitutivo para o Projeto de Lei nº 5.974 (clique aqui), de 2005, incorporando temas debatidos no Seminário.

 

A nosso ver, o pacto firmado entre Deputados, membros do MMA, ONGs ambientais e investidores sociais nos permite uma perspectiva bastante otimista para a evolução da legislação fiscal e ambiental brasileira, em que a adoção de um IR Ecológico será apenas o primeiro passo em direção a uma conscientização de que a responsabilidade ambiental é dever de todos e precisa contar com instrumentos regulatórios que permitam viabilizar um novo modelo de gestão de compromissos.
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1Cf. "Os Santos do Capitalismo", Revista Veja, Ed. 1963, 5.6.2006, pp. 60-69.

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*Advogados do escritório
Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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