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Uso de imagem de pessoa pública em campanha motivacional pode gerar processo

Ao tratar do uso de uma imagem, sem autorização de seu titular para fins comerciais, os Tribunais Pátrios têm entendido de forma pacífica, que o dever de indenizar torna-se evidente.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Atualizado em 7 de outubro de 2019 16:00

O direito à imagem - ou melhor, a extensão, os meios de proteção ou as condições ou limitações ao uso por terceiro desse direito - é um tema que vem merecendo interpretações pelos doutrinadores e tribunais do país das mais variadas. Muitas aplicando a letra fria da lei, algumas díspares e outras até antagônicas às disposições legais.

Portanto, a dúvida se o 'uso da imagem de uma pessoa pública, sem a sua expressa autorização, no âmbito interno de uma empresa, pode gerar o dever de indenizar o seu titular' - que é o objeto desse ensaio - é hoje tido como um tema, no mínimo, 'polêmico', com facetas e variantes que a seguir serão abordadas.

Considera-se o direito à imagem (ou, como desdobramento, o 'uso da imagem de alguém sem autorização expressa deste') corolário dos direitos da personalidade, os quais integram a condição essencial da pessoa humana como pressupostos de sua existência e de dignidade.

Uma vez que há a individualização de uma pessoa dentro da coletividade é possível não apenas a sua identificação (ou individualização do conjunto), mas como também a projeção e exploração de sua imagem no meio social ou com um fito de explorá-la comercialmente.

A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso X, a seguir transcrito, considera invioláveis, em qualquer condição, essas particularidades de cada pessoa, trazendo uma forte proteção a este conjunto de atribuições do indivíduo: nome, honra, imagem, privacidade, intimidade, reputação, etc.

Art. 5º... (...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Torna-se um ponto extremamente sensível quando se considera, de um lado, a exploração ou o possível aproveitamento econômico da imagem por terceiros, e, do outro, os eventuais e potenciais danos ao seu titular, que decorrem desse uso não autorizado de sua imagem - nasce, em ambos os casos, o dever de indenizar (dano material comprovado) ou de recompor (dano moral) o titular que não terá autorizado o uso feito por terceiros.

Ainda, a Constituição Federal, prevê, como decorrência da violação no usa da imagem, o direito para o seu titular de obter uma indenização proporcional, conforme estabelece o art. 5º, inciso V:

Art. 5º...

(...)

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

Assim, a utilização de imagens de pessoas sem que haja sua autorização para tanto, é passível de indenização por danos materiais e morais.

Portanto, a utilização da imagem de qualquer pessoa sem a sua expressa autorização, ainda que por ação ou omissão, traduz-se em ato ilícito, definido como tal pelo artigo 186, gerando o dever de reparar os danos causados, nos termos do artigo 927, e de cessar o uso indevido, nos termos do artigo 12, todos do Código Civil e a seguir transcritos:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

O próprio STJ editou a súmula 403 sobre o dever de indenizar pela publicação de imagem não autorizada quando inegável o viés econômico:

Súmula 403. Independe de prova ou prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

Dessa forma, em linhas gerais, entende-se que o uso da imagem, mesmo daquela que seria reconhecida como uma figura pública, depende da autorização do seu titular ou de quem age em nome dele.

Uma das parcas exceções à essa regra se dá quando as imagens são veiculadas no contexto de uma notícia, sendo esta de alta relevância, sem que haja comercialização da foto ou identificação de seus componentes.

Por outro lado, ao tratar do uso de uma imagem, sem autorização de seu titular para fins comerciais, os Tribunais Pátrios têm entendido de forma pacífica, que o dever de indenizar torna-se evidente:

APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - REPRODUÇÃO FOTOGRÁFICA EM ESTAMPAS DE CAMISETAS - USO DA IMAGEM SEM AUTORIZAÇÃO - EXPLORAÇÃO ECONÔMICA - ABALO MORAL CONFIGURADO - DEVER DE COMPENSAR - CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE NA FIXAÇÃO DO QUANTUM - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - ADEQUAÇÃO EX OFFICIO - RECURSOS DESPROVIDOS. Sendo a imagem um direito e uma garantia fundamental do indivíduo, sua divulgação e publicidade só serão admitidas quando expressamente autorizadas, caso em que, violada esta regra, responde o ofensor pelo abalo moral gerado. Não há norma legal regulamentando qual o valor que seja suficiente para compensar os danos decorrentes do abalo moral; nesses casos, por construção jurisprudencial, impõe-se ao julgador o dever de pautar-se por parâmetros ligados as condições financeiras das partes envolvidas, as circunstâncias que geraram o dano e o abalo experimentado, a fim de encontrar um valor que não acarrete enriquecimento e nem provoque renitência delitiva. Nos casos de responsabilidade extracontratual, a correção monetária tem sua incidência contada da data do arbitramento da indenização enquanto os juros de mora do evento danoso.

Quanto aos riscos de utilização, para fins comerciais, de imagem sem autorização de seu titular, pode-se destacar principalmente o dever de indenizar distinguindo-se dois tipos de danos:

Dano patrimonial: ocorre quando a imagem é explorada com finalidade comercial/econômica, sem a autorização do titular do direito. Costuma ser parametrizado levando-se em conta o que o titular do direito perdeu ou deixou de ganhar, do ponto de vista monetário, com a exposição e exploração não autorizada de sua imagem, e independe de prova de prejuízo, conforme estabelece a aludida súmula.

Dano moral: inicialmente, essa modalidade de dano, era percebida apenas quando o uso da imagem se fazia de forma vexatória ou ofensiva, causando evidentes danos à honra e reputação de seu titular. Contudo, hoje a doutrina, corroborada por julgados mais recentes sobre o tema, defendem que apenas a utilização da imagem não consentida, está sujeita à reparação, independentemente de lesão patrimonial e/ou ofensividade da reprodução.

Dessa forma, conclui-se que a simples exposição - e aqui não se faz a distinção com a exploração comercial - de imagem de terceiro sem a sua autorização expressa, configura, por si só, violação da vontade do titular e do seu direito de impedir que terceiros façam uso, qualquer que seja o fim ou a intenção de expor a sua imagem, de associá-la à marca ou produto de quem fez o uso.

Adentrando-se à questão da utilização, por empresas no âmbito de campanhas internas, de nome, de fotos ou de referências à personalidade, ou mesmo frases ditas por pessoas públicas, mesmo que ao primeiro olhar seja para motivação pessoal de seus funcionários, ou por qualquer outra razão aparentemente mais inocente, temos que considerar que a pretensão final sempre terá um fundo comercial, diante da intenção clara que é o aumento de produtividade, rendimento, venda e, consequentemente, lucro.

O fato de vinculação de marcas e produtos à imagem de uma pessoa pública agrega, inegavelmente, valor comercial ao produto ou à marca, trazendo resultados econômicos incontestes e, por isso, mensuráveis.

Tanto assim é que aquela imagem, que passa confiança, inspira pessoas, foi escolhida para estar (ou estampar de forma visível) determinada campanha.

Sendo assim, a utilização da imagem, sem a autorização expressa do detentor dos direitos de imagem daquela pessoa, pelas razões expostas anteriormente torna-se um ato passível de ser considerado um ilícito civil a gerar o dever de indenizar o seu titular.

Dessa forma, conclui-se que qualquer campanha de motivação interna associada à imagem de personalidades públicas, sem que se obtenha previamente uma licença e/ou sublicença para uso regular (pode ser uma autorização ou permissão simples, por escrito, do detentor daquele direito), na qual estejam claros: o objetivo, a forma e o tempo de uso daquela imagem, nome ou marca que a ela será associado, bem como se será devida algum tipo de contrapartida financeira, poderá ensejar futuros questionamento e/ou pedidos indenizatórios.

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BRASIL. Constituição, 1988. Constituição: República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

________. Lei 10.406, 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002.

________. STJ. Súmula 403. Independe de prova ou prejuízo a indenização pela publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

SANTA CATARINA. TJ/SC - AC: 496205 SC 2008.049620-5, relator: Fernando Carioni, data de julgamento: 21/01/09, Terceira Câmara de Direito Civil, data de publicação: apelação cível, da Capital.

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*Yasmin Peron Pereira é advogada especialista em consultoria empresarial do escritório Chenut Oliveira Santiago Advogados.

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